sexta-feira, 28 de junho de 2019

Decisão singular de 11.06.2019

Reclamação contra despacho que não admite recurso.

Apelação autónoma.

Recurso absolutamente inútil.

Despacho que declara a desnecessidade de realização da audiência final.

*

AAA opôs-se à execução contra si instaurada por BBB, através de embargos de executado.

Realizou-se audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador, com a identificação do objecto do litígio e o enunciado dos temas de prova. Foi, então, agendada data para a realização da audiência final.

Posteriormente, foi proferido despacho no qual, por se entender «que os autos contêm elementos suficientes para, sem necessidade de mais provas, conhecer do mérito da petição de embargos de executado», se determinou a não realização da audiência final. No mesmo despacho, foi ordenada a notificação das partes para, em 10 dias, querendo, se pronunciarem.

O embargante pronunciou-se no sentido de que «o processo não contém os elementos probatórios que permitam a apreciação do mérito da causa», razão pela qual deve realizar-se a audiência final.

Em seguida, foi proferido despacho mantendo o anterior.

O embargante interpôs recurso de apelação deste último despacho, invocando, como fundamento da sua admissibilidade, o disposto no artigo 644.º, n.º 2, al. h), do CPC.

O tribunal a quo não admitiu o recurso, com fundamento no entendimento de que o caso sub judice não é enquadrável na previsão desta norma, já que «a impugnação da decisão em questão com a decisão final não implica a absoluta inutilidade do recurso, (…) por não se traduzir em qualquer resultado irreversível, pois em caso de procedência determinará tão-somente a eventual anulação dos actos processuais, incluindo a sentença».

O embargante reclama agora do despacho de não admissão do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 643.º do CPC, continuando a sustentar que é admissível apelação autónoma porquanto a impugnação da decisão recorrida apenas com o recurso que viesse a ser interposto da decisão final seria absolutamente inútil. Sustenta ainda que, cabendo apelação do despacho de rejeição de um articulado ou meio de prova, nos termos do artigo 644.º, n.º 2, al. d), do CPC, por maioria de razão terá de se entender que do despacho que declara a desnecessidade de realização da audiência final, na qual, por excelência, a prova há-de ser produzida, cabe apelação autónoma.

Analisemos esta argumentação.

O artigo 644.º, n.º 2, al. h), do CPC, estabelece que cabe recurso de apelação autónomo das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil. O reclamante considera que o recurso por si interposto se enquadra nesta previsão legal porquanto o diferimento, para o momento do recurso da decisão final, da impugnação da decisão recorrida suscitará, em caso de vencimento, «um incomportável dispêndio de tempo e de meios, que não se vislumbra defensável». Acresce, segundo o reclamante, que o recurso desta decisão intercalar terá efeito suspensivo, ao passo que o recurso da decisão final terá efeito meramente devolutivo.

O reclamante não tem razão.

Desde logo, inexiste fundamento legal, que aliás o reclamante não indica, para atribuir efeito suspensivo ao recurso por ele interposto caso o mesmo fosse admissível. Aquilo que resulta do artigo 647.º do CPC é que tal recurso teria efeito meramente devolutivo.

Por outro lado e ao contrário daquilo que o reclamante pretende, para que se preencha a previsão do artigo 644.º, n.º 2, al. h), do CPC, «não basta que a transferência da impugnação para um momento posterior comporte o risco de inutilização de uma parte do processado, ainda que nesta se inclua a sentença final. Mais do que isso, é necessário que imediatamente se possa antecipar que o eventual provimento do recurso da decisão interlocutória não passará de uma “vitória de Pirro”, sem qualquer reflexo no resultado da acção ou na esfera jurídica do interessado» (ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, p. 203).

No caso sub judice, a eventual procedência da impugnação da decisão em causa que seja feita no recurso que venha a ser interposto da sentença apenas determinará, além da revogação daquela decisão, a anulação do processado posterior, incluindo da sentença. Como vimos, tal inutilização de uma parte do processado constitui uma possibilidade perfeitamente comportável pelo sistema, que deu prevalência ao valor da celeridade processual. Na hipótese acima configurada, a procedência do recurso terá, para o reclamante, exactamente a mesma utilidade que teria a daquele que ele agora interpôs autonomamente. Portanto, o caso sub judice não se enquadra na previsão do artigo 644.º, n.º 2, al. h), do CPC.

Também não colhe o argumento de que, cabendo apelação do despacho de rejeição de um articulado ou meio de prova, nos termos do artigo 644.º, n.º 2, al. d), do CPC, por maioria de razão terá de se entender que cabe apelação autónoma do despacho que declara a desnecessidade de realização da audiência final. Por um lado, trata-se de situações diversas, inexistindo, por isso, qualquer incompatibilidade lógica entre soluções também diversas. Por outro lado, foi intenção evidente do legislador limitar as hipóteses de apelação autónoma, em prol do valor da celeridade processual, pelo que é fora de dúvida que o n.º 2 daquele artigo estabelece uma enumeração taxativa, incompatível com a interpretação proposta pelo reclamante.

Concluindo, o recurso não é admissível.

Pelo exposto, mantenho o despacho reclamado.

Custas a cargo do reclamante.

Notifique.

*

Évora, 11 de Junho de 2019

Vítor Sequinho dos Santos


Despacho de 19.06.2024

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