Processo n.º 82/20.9T8NIS.E1
*
Sumário:
1 – Pedindo o senhorio a
condenação do arrendatário a restituir-lhe o locado com fundamento na resolução
do contrato de arrendamento florestal, está vedado, ao tribunal, julgar esse
pedido procedente com fundamento no decurso do prazo de vigência do mesmo
contrato, ainda que em momento anterior ao da resolução. Se o tribunal o fizer,
a sentença padecerá da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. d), 2.ª
parte, do CPC.
2 – O tribunal ad quem deve abster-se de conhecer da
impugnação da decisão do tribunal a quo
sobre determinado ponto da matéria de facto se a alteração pretendida pelo
recorrente em nada o beneficiar.
3 – O ónus estabelecido no
artigo 640.º, n.º 1, al. b), e n.º 2, al. a), do CPC, não pode ser considerado
cumprido se o recorrente indicar, em bloco, 48 minutos da gravação de
determinado depoimento, sem mais.
4 – Nada obsta à cumulação
das condenações do antigo arrendatário a pagar:
a) As rendas vencidas e não pagas até à
data da resolução do contrato;
b) Juros de mora sobre a quantia
referida em a);
c) Uma indemnização, correspondente ao
dobro da renda estipulada, pelo tempo decorrido desde a data da resolução do
contrato até à da restituição do locado;
d) Uma indemnização pelo corte de
eucaliptos por si levada a cabo, no locado, após a resolução do contrato.
5 – A condenação em multa e
indemnização à parte contrária por litigância de má-fé em determinado processo
pressupõe que a conduta processual merecedora daquela qualificação ocorra nesse
processo.
6 – Não faz sentido falar-se
em litigância de má-fé numa notificação judicial avulsa. Quando muito, uma
notificação judicial avulsa poderá ser utilizada como instrumento de uma
litigância de má-fé em determinado processo.
*
Autor/Reconvindo/Recorrente:
- Mário Branco.
Réus/Reconvintes/Recorridos:
- Carlos Gomes;
- Bruno Gomes;
- Pedro Gomes.
Pedidos do autor:
A) Ser declarada nula ou anulada e sem
nenhum efeito jurídico ou outro, a resolução do contrato de exploração
florestal, efectuada ilícita e ilegalmente, através da notificação judicial
avulsa identificada em C) infra,
pelos aqui 1.º e 2.º RR e que os mesmos identificam in fine do seu escrito como: A.1.;
B) Serem declarados nulos ou anulados e
sem nenhum efeito jurídico ou outro todos “os
pedidos” efectuados pelos aqui 1.º e 2.º RR através da notificação judicial
identificada em C) infra e que os
mesmos identificaram in fine do seu
escrito como: A.2. E A.3.;
Decorrentemente,
C) Ser declarada nula ou anulada e sem
nenhum efeito jurídico ou outro, a notificação judicial avulsa de que o aqui A.
foi objecto concretizada em 03/Setembro/2020 (aqui doc. 4);
D) Ser declarado que, o aqui A. não deve
quaisquer montantes aos aqui 1.º, 2.º e 3.º RR, seja a que título ou natureza
for; nomeadamente não deve quaisquer montantes a título de rendas, relativas
aos acordos escritos/contrato de arrendamento florestal, constantes nos aqui
docs. n.ºs 1 e 2;
E) Ser declarado que, as rendas
relativas e decorrentes dos acordos escritos/contrato de arrendamento florestal,
aqui docs. n.ºs 1 e 2, estão integralmente pagas até à renda que se vencer em
01/Julho/2021 (inclusivé);
F) Ser ainda declarado que, a renda que
se vencer em 01/Julho/2022 está parcialmente paga, no valor de € 4.985,00,
faltando apenas pagar €15,00, que devem ser pagos na data do vencimento da
mesma (1/Julho/2022);
G) Condenação dos réus, por litigância
de má-fé, em multa e indemnização.
Pedidos reconvencionais:
A) Deverão os acordos denominados “Adenda a Contrato de Arrendamento
Florestal”, subscrito pelo autor e pelo primeiro réu e sua mulher em 20 de
Maio de 2015, e “Alteração a Contrato de
Arrendamento Florestal”, subscrito pelo autor e pelo primeiro réu e sua
mulher em 1 de Março de 2016, ser anulados, declarando-se em consequência a
aplicabilidade do contrato de arrendamento florestal de 1 de Dezembro de 2010
na sua versão original;
B) Mais deverá o acordo denominado “Adenda a Contrato de Arrendamento
Florestal”, subscrito pelo autor e pelo primeiro réu e sua mulher em 20 de
Maio de 2015, ser declarado nulo, por simulação;
C) Caso não se entenda como peticionado
em A e B, deverá pelo menos o acordo denominado “Adenda a Contrato de Arrendamento Florestal”, subscrito pelo autor
e pelo primeiro réu e sua mulher em 20 de maio de 2015 ser declarado revogado e
substituído, com efeitos imediatos, pelo acordo denominado “Alteração a Contrato de Arrendamento Florestal”, subscrito pelos
mesmos em 1 de Março de 2016, nomeadamente no que se refere à renda
contratualmente estipulada e ao prazo do arrendamento;
D) Deverá a reconvenção ser declarada
procedente por provada e em consequência:
(i) Ser declarada a resolução válida e
eficaz do contrato de arrendamento florestal celebrado entre o primeiro réu e
sua mulher em 1 de Dezembro de 2010;
(ii) Ser declarado o dever de
restituição do imóvel arrendado ao ora primeiro réu desde o dia 3 de Setembro
de 2020, e ordenado o seu despejo, condenando-se o autor a devolvê-lo ao
primeiro réu, representado pelo seu acompanhante ora segundo réu, totalmente devoluto
e livre de pessoas e bens;
(iii) Ser declarado que o autor não
podia praticar quaisquer actos permitidos pelo contrato de arrendamento
florestal, em particular os previstos nas suas cláusulas 5.ª e 7.ª desde o dia
3 de Setembro de 2020, e ser condenado o autor a abster-se de praticar tais
actos, nomeadamente qualquer corte de árvores;
(iv) Ser condenado o autor a pagar ao
primeiro réu a quantia de € 68.572,00 – ou, caso se considere aplicável o
acordo denominado “Alteração a Contrato de
Arrendamento Florestal” subscrito em 1 de Março de 2016, a quantia de € 68.000,00,
acrescida de juros de mora calculados à taxa de 4% ao ano desde as datas de
vencimento de cada uma das rendas anuais de 2017, 2018, 2019 e 2020, até
integral pagamento;
(v) Ser condenado o autor a pagar ao
primeiro réu o valor anual correspondente ao dobro da renda contratual,
calculado em termos proporcionais ao tempo que decorrer desde 3 de Setembro de
2020 até à restituição efectiva do arrendado, e que actualmente se computa em €
14.090.14 (ou € 13.972,60 caso se considere aplicável o valor de renda anual
de € 17.000,00 referido no acordo de
alteração subscrito em 1 de Março de 2016).
E – Deverá o autor ser condenado como
litigante de má fé, nos termos do art. 542.º, n.º 2, alínea b) do CPC, no
pagamento de multa e no reembolso de todas as despesas dos réus com o presente
processo, inclusivamente os honorários a mandatário, a liquidar em momento
posterior, de acordo com o disposto no art. 543.º, n.º 1, do CPC;
F) Deverá o autor ser condenado, em
acréscimo ao já peticionado pelos réus/reconvintes, a pagar-lhes o valor, com
crescimento completo, de todos eucaliptos por si cortados na propriedade do réu
Carlos Gomes após a resolução do contrato de arrendamento, a liquidar em
momento posterior, nos temos do art. 556.º, n.º 1, alínea b), do CPC, e do art.
559.º do Código Civil;
G) Deverão ser declarados inválidos e
anulados quaisquer acordos de pagamento de valores de manutenção e limpeza do
terreno, tais como os referidos nos artigos 14º e 21º da petição inicial, para
o caso de algum vir a considerar-se demonstrado.
Sentença recorrida:
A) Julgou totalmente improcedentes os
pedidos formulados pelo autor e, em consequência, absolveu os réus dos mesmos;
B) Anulou os acordos denominados «Adenda a Contrato de Arrendamento
Florestal», datado de 20 de Maio de 2015, e «Alteração a Contrato de Arrendamento Florestal», datado de 1 de
Março de 2016;
C) Julgou totalmente procedentes os
pedidos reconvencionais e, em consequência:
1) Declarou o dever de restituição do
imóvel arrendado ao 1.º réu, verificado desde o dia 3 de Setembro de 2020, e
condenou o reconvindo a entregar o imóvel arrendado ao 1.º réu, livre e
devoluto de pessoas e bens;
2) Condenou o reconvindo a pagar aos
reconvintes a quantia global de € 68.572,00, relativo ao valor das rendas
respeitantes aos anos de 2017 a 2020, acrescido do valor dos juros de mora,
contados desde a respectiva data de vencimento (1 de Julho de cada ano), à taxa
de 4%;
3) Condenou o reconvindo a pagar aos
reconvintes o valor anual correspondente ao dobro da renda contratual, que
perfaz a quantia de 34.286,00, calculado em tempos proporcionais ao tempo que
decorrer desde 3 de Setembro de 2020 até à restituição efectiva do imóvel
arrendado;
4) Condenou o reconvindo a pagar aos
reconvintes o valor correspondente aos eucaliptos por este cortados no imóvel
em causa, após 3 de Setembro de 2020, a ser posteriormente liquidado em sede de
liquidação de sentença, nos termos do disposto nos arts. 358.º e 609.º, n.º 2,
do CPC;
d) Condenou o autor, como litigante de
má-fé, ao pagamento de uma multa de 50 UC, a que corresponde a quantia de €
5.100,00, bem como ao pagamento aos réus de uma indemnização a fixar
posteriormente, nos termos do disposto no art. 543.º, n.º 3, do CPC.
Conclusões do recurso:
(…)
Conclusões do requerimento
de ampliação do objecto do recurso:
(…)
Questões a decidir:
1 – Nulidade da sentença recorrida;
2 – Impugnação da decisão sobre a
matéria de facto;
3 – Tempestividade e fundamento da
arguição da invalidade da adenda ao contrato de arrendamento celebrada em
20.05.2015;
4 – Valor jurídico da alteração ao
contrato de arrendamento datada de 01.03.2016;
5 – Validade e eficácia da resolução do
contrato de arrendamento;
6 – Condenação do recorrente no
pagamento do valor dos eucaliptos cortados após 03.09.2020;
7 – Condenação do recorrente por
litigância de má-fé;
8 – Condenação dos recorridos por
litigância de má-fé.
Factos julgados provados
pelo tribunal a quo:
1. Por via da AP. 2 de 05.02.1985,
encontra-se registada a aquisição do direito de propriedade, por partilha da
herança, do imóvel misto, denominado «Herdade
da Tapada», descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (…), e
inscrito na matriz sob os artigos (…), (…) e (…), em nome de David Gomes e do
1.º réu.
2. No âmbito da acção de divisão de
coisa comum n.º 93/04.1TBNIS, relativa ao imóvel identificado em 1), que correu
termos no Tribunal Judicial de Nisa – Secção Única, foi homologada por sentença
transitada em julgada a adjudicação da parcela A aos ali requerentes Carmen
Gomes e 1.º réu, correspondente a uma área total de 120,671h e, por outro lado,
a parcela B aos requeridos Maria João Gomes, Etelvina Gomes, Vânia Gomes e Albertina
Gomes.
3. O 1.º réu e Carmen Gomes, falecida em
13 de Setembro de 2019, contraíram casamento católico em 06.02.1972, no regime
de comunhão de adquiridos.
4. O 1.º réu e Carmen Gomes, na
qualidade de senhorios, e o autor, na qualidade de arrendatário, subscreveram o
documento escrito, denominado «Contrato
de Arrendamento Florestal», datado de 01.12.2010.
5. O referido documento escrito
apresenta a seguinte redacção:
«CONTRATO
DE ARRENDAMENTO FLORESTAL CONTRAENTES
1ºs
- CARLOS GOMES e mulher CARMEN GOMES, casados na comunhão de adquiridos,
contribuintes fiscais números (…) e (…), respectivamente, residentes no (…), em
Lisboa, como primeiros Outorgantes, adiante designados Senhorios
-
MÁRIO BRANCO, casado, contribuinte fiscal n° (…), residente em Rua (…), Tolosa,
como Arrendatário
O
1° Outorgante marido é proprietário do prédio rústico, denominado "Tapada",
sito em Tolosa, inscrito na matriz sob o Art°. (…) da Freguesia de Tolosa,
Concelho de Nisa.
O
referido Prédio é composto por eucaliptal, pasto e sobreiros.
Os
Senhorios pretendem ceder a exploração da zona de eucaliptal, de pasto bem como
a exploração cinegética do mesmo, reservando a gestão do resto das valências do
prédio.
As
partes celebram, de forma livre e consciente, o presente CONTRATO DE ARRENDAMENTO
FLORESTAL, que se rege nos termos das cláusulas seguintes:
1ª
1
. Pelo presente contrato os Senhorios dão ao Arrendatário em regime de
arrendamento florestal, livre de quaisquer ónus ou encargos, 98,81 Hectares do
Prédio Rústico identificado no preâmbulo, área identificada na Planta anexa
coma a Letra A
2
. O arrendamento a constituir destina-se á exploração do eucaliptal, exploração
cinegética e da zona de pasto, não abrangendo a exploração ou disposição da
zona de sobreiros.
2ª
1
. O presente contrato tem início em 1 de Dezembro de 2010, com o prazo de sete
anos, não renováveis, salvo acordo expresso das partes nesse sentido.
2
. O Arrendatário tomará posse do arrendado no dia da assinatura do presente
contrato, podendo dar início ás iniciativas necessárias aos fins da exploração
cedida pelo presente contrato.
3
. No final do sexto ano, o Arrendatário poderá fazer cessar o contrato por meio
de carta registada, remetida com uma antecedência não inferior a seis meses
sobra a data em que a cessação tenha efeitos.
3ª
1
. O Arrendatário não pode, sem prévio e expresso consentimento dos Senhorios,
alterar a ocupação de eucaliptal que o prédio regista presentemente;
2
. O Arrendatário não pode alterar, sem prévio e expresso consentimento dos
Senhorios, o tipo de ocupação que o prédio actualmente regista nas suas
diversas zonas;
3
. Ficam expressamente excluídos do presente arrendamento quaisquer actos de
disposição ou exploração relativos aos sobreiros existentes no prédio;
4
. O arrendatário obriga-se a autorizar e não obstruir ou dificultar de qualquer
modo os actos que se revelem necessários á normal exploração, gestão e
manutenção dos sobreiros existentes no prédio;
4ª
1
. A Renda anual é de 17.143,00€ (Dezassete mil cento e quarenta e três euros) e
será paga, a primeira na data de assinatura do presente contrato e as seguintes
no dia 01 de Julho de cada ano.
5ª
1
. O Arrendatário poderá efectuar o corte de eucaliptos durante e vigência do
presente contrato.
6ª
O
Arrendatário obriga-se a fazer um uso prudente do prédio em questão,
comprometendo-se nomeadamente a:
a)
– Conservar as características do terreno existentes à data de início do
presente contrato.
b)
– Proceder a uma utilização cuidada e coerente do solo, fazendo uso de
«práticas adequadas de exploração, de forma a manter o mesmo em bom estado de
conservação.
1
. São da exclusiva responsabilidade do Arrendatário, todas as obras de
beneficiação e manutenção, sendo repartidas entre ambos as despesas inerentes
ás mesmas, na proporção que vier a ser acordada.
2
. As benfeitorias efectuadas durante a vigência do presente contrato, serão
consideradas parte integrante do prédio em questão, não tendo o Arrendatário
qualquer direito a retenção ou indemnização, seja a que título for, incluindo o
de diminuição da renda, pelas mesmas.
3.
O Arrendatário pode apresentar propostas ou pedidos de atribuição de subsídios
ou qualquer vantagem inerente á posse e exploração do prédio arrendado, sem
prévia autorização dos Senhorios, fazendo suas todas as quantias e vantagens
recebidas no âmbito dos mesmos.
8ª
1.
Todas as questões existentes previamente á assinatura do presente contrato são
da exclusiva responsabilidade dos Senhorios.
2
. Quando, no prédio arrendado, por causas imprevisíveis c anormais,
nomeadamente intempéries, incêndios e inundações, resultarem danos. estes são
da exclusiva responsabilidade do Arrendatário.
9ª
O
Arrendatário obriga-se a, no termo do presente contrato, entregar o prédio em
bom estado de conservação e limpeza.
10ª
O
Arrendatário não pode subarrendar, sublocar. emprestar ou ceder por qualquer
forma os direitos de arrendamento, no todo ou em parte, sem o consentimento
expresso e por escrito dos Senhorios.
11ª
1.
As partes convencionam como domicílios relevantes para todos os efeitos legais
e contratuais os constantes no introito do presente contrato.
2
. Qualquer alteração dos domicílios deverá ser objecto de comunicação á outra
parte com antecedência mínima de quinze dias, sob pena de não ser oponível a
não recepção de qualquer comunicação com base na alteração de morada;
3
. Para dirimir qualquer litígio emergente da interpretação, discussão,
aplicação ou incumprimento do presente contrato, será competente o Tribunal
Judicial de Nisa;
4
. Qualquer alteração ao presente contrato deverá revestir a forma escrita e
apenas será válida depois de assinadas pelas partes outorgantes.
12ª
Os
Senhorios podem pedir a resolução do contrato no caso do Arrendatário:
a)
Não pagar a renda no tempo e lugar próprio, nem fizer o pagamento nos termos
previstos;
b)
Faltar ao cumprimento de alguma obrigação legal ou contratual com prejuízo
grave para a produtividade, substancia ou função económica e social do prédio;
c)
Usar o prédio para fins diferentes do estipulado no contrato;
d)
Não velar pela boa conservação dos bens ou causar prejuízos graves nos que, não
sendo objecto do presente contrato, existam no arrendado;
c)
Sublocar ou comodatar, total ou parcialmente, o prédio arrendado, ou ceder a
sua posição contratual.
13ª
Em
tudo o que estiver omisso, regulam as disposições legais aplicáveis,
nomeadamente Decreto Lei nº 294/2009 de 13 de Outubro.
14ª
Este
contrato com a planta do prédio anexa, que dele faz parte integrante, é lavrado
em três cópias, ficando cada uma das partes na posse de um exemplar,
destinando-se o outro a ser entregue pelos Senhorios á Direcção Geral das
Contribuições e Impostos - Serviço de Finanças de Nisa.
15ª
Todas
as questões relacionadas com o presente contrato, posteriores á sua assinatura,
só serão consideradas válidas se reduzidas a escrito e enviadas para as moradas
constantes do contrato mediante carta registada.
16ª
A
existência de quaisquer circunstâncias impeditivas do cumprimento do presente
contrato, prévias á sua assinatura, obrigam a parte que lhe deu origem a
indemnizar a outra parte pelos prejuízos sofridos e devidamente comprovados.
A
Primeira Outorgante mulher dá a seu marido o necessário consentimento à
celebração do presente contrato.
Tolosa,
1 de Dezembro de 2010»
6. O referido acordo foi apresentado
junto da Repartição de Finanças de Nisa em 29.10.2010.
7. O 1.º réu e Carmen Gomes, na
qualidade de senhorios, e o autor, na qualidade de arrendatário subscreveram o
documento escrito, denominado «Adenda a
Contrato de Arrendamento Florestal», datado de 20.05.2015.
8. O documento a que se alude no número
anterior apresenta a seguinte redacção:
«ADENDA
A CONTRATO DE ARRENDAMENTO FLORESTAL CONTRAENTES
1ºs
- CARLOS GOMES e mulher CARMEN GOMES, casados na comunhão de adquiridos,
contribuintes fiscais números (…) e (…), respectivamente, residentes no (…), em
Lisboa, como primeiros Outorgantes, adiante designados Senhorios
-
MÁRIO BRANCO, casado, contribuinte fiscal n° (…), residente em Rua (…), nº (…),
Tolosa, como Arrendatário
Os
Outorgantes acordam na alteração do Contrato de Arrendamento Florestal
celebrado em 01.12.2010. o qual passa a ter a seguinte redacção:
Os
1°s Outorgantes são proprietários do prédio rústico, denominado " Tapada ",
sito em Tolosa, inscrito na matriz sob o Art°. (…) da Freguesia de Tolosa,
Concelho de Nisa.
O
referido Prédio é composto por eucaliptal, pasto e sobreiros.
Os
senhorios pretendem ceder a exploração do referido prédio nomeadamente nas sua
vertentes agrícola e florestal com a exploração de pastagem, eucaliptal,
azinheiras e sobreiros.
1ª
1.
Pelo presente contrato os Senhorios dão ao Arrendatário em regime de
arrendamento rural, livre de quaisquer ónus ou encargos a parte da Herdade da
Tapada que lhes pertence; área identificada na Planta anexa com a Letra A.
2.
O arrendamento a constituir destina-se á exploração do eucaliptal, exploração
cinegética e zona de pasto, bem como da zona de sobreiros e azinheiras.
2ª
1.
O presente contrato tem início em 01 de Julho de 2010 com prazo de 35 anos, não
renováveis, salvo acordo expresso das partes nesse sentido.
2.
O Arrendatário tomará posse do arrendado no dia da assinatura do presente
contrato, podendo dar início ás iniciativas necessárias aos fins da exploração
cedida pelo presente contrato.
3ª
1.
O Arrendatário pode alterar, sem prévio e expresso consentimento dos senhorios,
a ocupação de eucaliptal que o prédio regista presentemente.
2.
O Arrendatário pode alterar, sem prévio e expresso consentimento dos Senhorios
o tipo de ocupação que o prédio actualmente regista nas suas diversas zonas;
3.
O Arrendatário fica desde já autorizado á prática de todos os actos que se
revelem necessários á normal exploração, gestão e manutenção dos sobreiros e
azinheiras existentes no prédio.
4ª
1.
A Renda anual é de 5.000,00€ (Cinco mil euros).
5ª
1.
O Arrendatário poderá efectuar o corte de eucaliptos durante e vigência do
presente Contrato.
6ª
O
Arrendatário obriga-se a fazer um uso prudente do prédio em questão,
comprometendo-se nomeadamente a proceder a uma utilização cuidada e coerente do
solo, fazendo uso de «práticas adequadas de exploração» de forma a manter o
mesmo em bom estado de conservação.
7ª
1
. São da exclusiva responsabilidade do Arrendatário, todas as obras de beneficiação
e manutenção, incluindo as que venham a ser efectuadas nos prédios urbanos
existentes no arrendado, sendo repartidas entre ambas as despesas inerentes ás
mesmas, na proporção que vier a ser acordada.
2
. As benfeitorias efectuadas durante a vigência do presente contrato, serão
consideradas parte integrante do prédio em questão, não tendo o Arrendatário
qualquer direito a retenção ou indemnização, seja a que titulo for, incluindo o
de diminuição da renda, pelas mesma, á excepção das realizadas nos prédios
urbanos bem como nas referentes a cercas e vedações.
3.
O Arrendatário pode apresentar propostas ou pedidos de atribuição de subsídios
ou qualquer vantagem inerente á posse e exploração do prédio arrendado, sem
prévia autorização dos Senhorios, fazendo suas todas as quantias e vantagens
recebidas no âmbito dos mesmos.
8ª
1.
Todas as questões existentes previamente à assinatura do presente contrato são
da exclusiva responsabilidade dos Senhorios.
2
. Quando, no prédio arrendado, por causa imprevisíveis e anormais, nomeadamente
intempéries, incêndios e inundações, resultarem danos, estes são da exclusiva
responsabilidade do Arrendatário.
9ª
O
Arrendatário obriga-se a, no termo do presente contrato, entregar o prédio em
bom estado de conservação e limpeza.
10ª
1
. As partes convencionam como domicílios relevantes para todos os efeitos
legais e contratuais os constantes no introito do presente contrato.
2.
Qualquer alteração dos domicílios deverá ser objecto de comunicação á outra
parte, com antecedência mínima de quinze dias, sob pena de não ser oponível a
não recepção de qualquer comunicação com base na alteração de morada;
3.
Para dirimir qualquer litígio emergente da interpretação discussão, aplicação
ou incumprimento do presente contrato, será competente o Tribunal Judicial da
Comarca de Portalegre;
4.
Qualquer alteração ao presente contrato deverá revestir a forma escrita e
apenas será válida depois de assinadas pelas partes outorgantes.
11ª
Os
Senhorios podem pedir a resolução do contrato no caso de Arrendatário:
a)Não
pagar a renda no tempo e lugar próprio, nem fizer o pagamento nos termos
previstos;
b)
Faltar ao cumprimento de alguma obrigação legal ou contratual com prejuízo
grave para a produtividade, substancia ou função económica e social do prédio.
c)
Usar o prédio para fins diferentes do estipulado no contrato.
d)
Não velar pela boa conservação dos bens ou causa de prejuízos graves nos que
não sendo objecto do presente contrato, existam no arrendado.
12ª
Em
tudo o que estiver omisso, regulam as disposições legais aplicáveis,
nomeadamente Decreto Lei nº 294/2009 de 13 de Outubro.
13ª
Esta
alteração ao contrato de arrendamento florestal celebrado em 01.12.20 com a
planta do prédio anexa, que dele faz parte integrante, é lavrada em três
cópias, ficando cada uma das partes na posse de um exemplar e a outra para
entrega no Serviço de Finanças de Nisa.
14ª
Todas
as questões relacionadas com o presente contrato, posteriores á sua assinatura,
só serão consideradas válidas se reduzidas a escrito e enviadas para as moradas
constantes do contrato mediante carta registada.
15ª
A
existência de quaisquer circunstâncias impeditivas do cumprimento do presente
contrato, prévias á sua assinatura, obrigam a parte que lhe deu origem a
indemnizar a outra parte pelos prejuízos sofridos e devidamente comprovados.
Tolosa,
20 de Maio de 2015»
9. O acordo mencionado em 4) foi
apresentado junto da Repartição de Finanças de Nisa em 26.05.2015.
10. Por via da notificação judicial
avulsa, que correu ternos sob o n.º 55/20.1T8NIS, no Juízo de Competência
Genérica de Nisa – Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, realizada em 03.09.2020,
o 1.º réu, representado pelo 2.º réu, comunicou ao autor o seguinte:
«1º
O
aqui requerente é maior acompanhado, processo que correu termos pelo Tribunal
Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Local Cível – 12, Processo
35814/15.8T8LSB, tendo sido designado acompanhante do mesmo o seu filho Bruno
Gomes, conforme Sentença proferida nos aludidos autos, que se junta como Doc.
1.
2º
Acompanhamento
que se encontra já devidamente transcrito na certidão de nascimento que se
junta como Doc. 2.
3º
Em
01 de Dezembro de 2010 entre o requerente e o notificando foi celebrado o contrato
de arrendamento florestal que aqui se junta como Doc. nº 3, tendo por objecto a
parcela identificada na clausula 1ª do mesmo contrato.
4º
Tendo
a mãe do requerente, entretanto falecido, dado o seu conhecimento.
5º
Entre
outras cláusulas, foi acordada a renda anual de €17.143,00 (dezassete mil cento
e quarenta e três Euros) a pagar no dia 01 de Julho de cada ano.
6º
A
partir de 2012 o estado de saúde do pai do acompanhado deteriorou-se, sobretudo
nos seus aspetos psicológicos, vindo progressivamente a revelar-se incapaz de
reger a sua pessoa e os seus bens, culminando com o decretar da providência de
acompanhamento.
7º
Tudo
do conhecimento do notificando que, inclusivamente, foi indicado como
testemunha no processo em causa.
8º
O
notificando não pagou as rendas contratuais vencidas em 01 de Julho de 2017, 01
de Julho de 2018, 01 de Julho de 2019 e 01 de Julho de 2020.
9º
Nesta
data é o notificando devedor ao requerente de €68.572,00 (sessenta e oito mil
quinhentos e setenta e dois euros) sem prejuízo dos juros entretanto vencidos e
vincendos desde a data do vencimento de cada uma das prestações até seu efetivo
pagamento.
10º
Nos
termos da alínea a) da cláusula 12ª do contrato, o senhorio pode fazer operar a
resolução do contrato se o inquilino não pagar a renda no tempo e lugar
próprio, nem fizer os pagamentos nos termos previstos.
11º
Pelo
que, nos termos da referida cláusula e legislação aplicável o requerente dá por
resolvido o contrato com fundamento no incumprimento do inquilino – não
pagamento da renda no tempo e modo devidos- a partir da data da efectivação da
presente notificação, devendo o notificando entregar, de imediato, livre e
devoluto, o prédio objeto do arrendamento.
12º
Bem
como, deve pagar ao requerente a importância a si devida de €68.572,00.
13º
Devendo,
a partir da data de efetivação da aqui requerida notificação, abster-se da
prática de qualquer ato consentido contratualmente, se o mesmo estivesse em
vigor, e, designadamente, os previstos nos artigos 5º (corte de eucaliptos) e
7º (levantamento de qualquer benfeitoria realizada, que faz parte integrante do
prédio), sob pena de o requerente vir a exigir-lhe a respectiva indemnização.
Nestes
termos e nos mais de direito, que V.Exa doutamente suprirá se requer a V.Exa:
A
– Se digne ordenar, a notificação judicial avulsa de MÁRIO BRANCO, casado,
residente na Rua (…), TOLOSA, levando-se ao seu conhecimento, através da
entrega da cópia do presente requerimento e documentos juntos.
A.
1. Que o senhorio, designadamente acompanhado pelo seu filho Bruno Gomes, dá
por resolvido, com efeitos imediatos o contrato de exploração florestal
celebrado entre as partes em 1 de Dezembro de 2010;
A.
2. Que deve o mesmo entregar o prédio objeto do contrato, livre e devoluto, ao
seu proprietário, na pessoa do acompanhante seu filho, com efeitos imediatos,
após efectuada a presente notificação.
A.
3. Devendo ainda abster-se da prática de qualquer ato consentido
contratualmente, designadamente os previstos nos artigos 5º e 7º do contrato.»
11. Em Maio de 2010, o autor procedeu à
limpeza do imóvel acima referido, uma vez que a vegetação lá existente atingia
uma altura de 3 metros, o que gerava um elevado risco de incêndio e
impossibilitava a circulação pela propriedade em causa.
12. O autor continuou a fazer a limpeza
do prédio em causa até à presente data.
13. Aquando da realização do acordo
mencionado em 5), estava para breve o corte de eucaliptos e consequente venda
dos mesmos por parte do autor.
14. Em 2003, a propriedade em causa foi
afectada por um incêndio.
15. O autor procedeu ao corte e venda de
eucalipto durante os anos de 2013, 2014 e início de 2015.
16. A partir do início do ano de 2015, o
autor apenas usava a propriedade em causa para pasto de animais.
17. De modo a evitar potenciais fogos na
propriedade e manter o crescimento floresta adequado, respeitando as
necessidades ambientais da propriedade e por forma a mesma estar sempre limpa e
adequadamente tratada, a propriedade em causa necessita de trabalho maquinal e
humano (durante um período de tempo não concretamente apurado), com máquinas
apropriadas, designadamente para limpeza de matos, selecção de rebentos, lavrar
aceiros, manter caminhos limpos e sem mato, bem como proceder a adubação.
18. O exposto em 17) acarreta custos com
aquisição de combustível, adubo e pagamento de mão de obra em valor não
concretamente apurado.
19. O eucaliptal existente na
propriedade em causa tem mais de 50 anos de idade e está apto a produzir
rendimento decorrente do corte e venda de madeira sensivelmente 10/12 anos em
10/12 anos.
20. O autor emitiu em nome do 1.º réu e
de Carmen Gomes as facturas n.º 77 (datada de 19-12-2010) e n.º 83 (datada de
18-12-2011).
21. O 1.º réu e Carmen Gomes assinaram
as referidas facturas.
22. O acordado em 5) não abrangia uma
área de 14h, conhecida como a «Horta»,
na qual a família dos réus sempre cultivou produtos para consumo próprio
familiar, composta, além do mais, por pomares de árvores de fruto.
23. Por sentença de 20 de Novembro de
2019, proferida pelo Juízo Local Cível de Lisboa – Juiz 2, no âmbito do
processo n.º 35814/15.8T8LSB, transitada em julgado, o 1.º réu foi declarado
maior acompanhado, em regime de representação geral pelo seu acompanhante, com
início da respectiva incapacidade em data não apurada de 2012/2013, momento do
agravamento do seu estado de saúde.
24. Ainda no âmbito daquele processo, o
2.º réu foi nomeado como acompanhante do 1.º réu, e o 3.º réu foi nomeado como
acompanhante substituto.
25. Através da decisão judicial supra
referida foram atribuídos ao acompanhante os deveres, relativos ao 1.º réu, de «velar pelo seu bem-estar pessoal e
patrimonial e cuidados de saúde, mantendo as consultas regulares e tratamento
medicamentoso e ou psicológico ao mesmo medicamente prescrito e ou que o venha
a ser, no futuro, não podendo o requerido, em sede de direitos pessoais,
decidir sobre quanto a aceitar ou não tratamentos médicos/psicológicos ao mesmo
propostos/prescritos, quanto à fixação da sua residência/domicílio, nem quanto
à decisão de viajar, em Portugal ou no estrangeiro».
26. Até ao Verão de 2017, o 1.º réu
viveu com o seu cônjuge numa moradia sita em Lisboa, no (…).
27. A Sra. Dra. (…) emitiu um relatório
médico, datado de 5 de Janeiro de 2001, relativo ao 1.º réu, com o seguinte
teor:
«(…),
médica psiquiatra e Professora de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de
Lisboa, portadora da CP nº (…), atesta o seguinte sobre a situação clínica do
Sr. Dr. Carlos Gomes, de 61 anos de idade:
1)
Este senhor tem uma história psiquiátrica iniciada em Maio de 1998, sendo por
mim assistido desde 19/09/00 e anteriormente pelo colega Dr. (…).
Em
Maio de 1988 ocorre um episódio clinicamente típico e intenso de mania, tendo então
sido internado no Serviço de Psiquiatria do Hospital de Santa Maria; veio a recuperar
mas em Novembro de 1999, há novo episódio maníaco, seguindo-se uma fase de
instabilidade, com períodos abertamente depressivos (configurando verdadeiros
episódios depressivos major, “com “melancolia) e outros com sintomatologia
residual, tanto depressiva como maniforme; face a esta história psiquiátrica, o
diagnóstico de “perturbação bipolar tipo I” (F31), segundo o ICD-10, afigura-se
inequívoco.
Entretanto
foram clinicamente notados sinais de declínio cognitivo e, em Maio de 2000, uma
RM cerebral evidenciou uma atrofia cortical difusa de grau moderado; além do
tratamento psicofarmacológico para a doença afectiva (cf. Adiante), o doente
viria ser medicado com donezepil (“Aricpet”).
2)
Quando consultei o doente pela primeira vez, em Setembro de 2000, o quadro psicopatológico
era predominantemente depressivo, com sintomas endogenomorfos ou melancólicos,
incluindo tristeza vitalizada, inibição psicomotora, ideias e sentimentos de
autoculpabilidade e anedonia marcada; eram também aparentes sinais clínicos de
organicidade cerebral, sendo problemática a sua exacta valorização dado o
contexto depressivo. Foi dada continuidade ao tratamento com sais de lítio e
“Aricept”, associando-se amitriptilina e olanzapina.
Foi
entretanto requisitado um exame neuropsicológico, que veio a ser realizado pela
Profª (…) em 9.11.2000; esse exame confirmou objectivamente um processo de
declínio mnésico, compatível com o início de uma doença demencial; em concreto,
escreve a Profª (…): “apesar de no momento não existir um quadro de demência
estabelecido, parece-me não ser de colocar de parte a hipótese de ma evolução
no sentido de demência de tipo frontal “; foi sugerido “ follow up
“neuropsicológico”.
3)
O doente tem continuado em tratamento (com ajustamentos pontuais do esquema terapêutico)
sem que seja reconhecível uma melhoria clínica significativa; terá
eventualmente ocorrido algum alívio das queixas da linha depressiva, mas o
estado psicopatológico (tanto afectivo como provavelmente de demencial)
compromete drasticamente a capacidade de desempenho, mesmo no que diz respeito
a actividades instrumentais do dia-a-dia.
4)
Face aos elementos clínicos apurados, entendemos que tanto a doença bipolar,
que se tem revelado pouco acessível aos tratamentos e com evolução no sentido
da cronicidade, como a comorbilidade neurológica por provável processo
demencial, incapacitam o doente, de forma definitiva e completa, para o
exercício de qualquer actividade profissional.»
28. Entre Maio de 2004 e Fevereiro de
2005, o 1.º réu foi submetido, após episódio maníaco, a acompanhamento clínico
no Instituto de Invstigaziones Neuropsiquiatricas Dr. Lopes-Ibor, em Madrid,
sendo referido no relatório de alta, a existência de consumo de álcool,
irritabilidade e agressividade verbal em casa, comportamentos desconexos e
gastos excessivos, tendo-lhe sida prescrita terapêutica com: tiapride,
carbonato de lítio, clometiazol, ziprasidona e bromacepam.
29. No início do ano de 2005, o 1.º réu
sofreu um enfarte de miocárdio, tendo sido tratado, inicialmente, no Hospital
Fernando Fonseca e, após, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
30. Em 10.12.2013, a propósito de uma
viagem realizada ao Brasil pelo 1.º réu e Carmen Gomes, Jair Tadeu enviou uma
mensagem de correio electrónico aos 2.º e 3.º réus, seus primos, no âmbito da
qual lhes comunicava o seguinte:
«Bem,
estamos aqui a cuidar deles, mas percebemos que realmente a coisa é muito
séria, principalmente com sua mãe, pois ela não ouve ninguém, bebe o tempo
todo, na frente dos outros (ou escondido) e se alguém a repreende pelo fato de
ter pedido ou comprado mais alguma bebida ou estar fumando ela já fica brava e
começa a discussão e não conseguimos convencê-la de que está passando dos
limites.»
31. De igual modo, em 10-12-2013, a
propósito da aludida viagem, Jair Tadeu enviou uma mensagem de correio
electrónico aos 2.º e 3.º réus, seus primos, no âmbito da qual lhes comunicava
o seguinte:
«Já
tínhamos visto a tia com problemas outras vezes, mas essa vez tem sido
especialmente chocante…e trabalhoso.
A
tia e o tio simplesmente não tem mais condições de estarem sozinho. Além de
tratamento (internamento ou seja o que for), CLARAMENTE não conseguem mais
gerir as próprias vidas de maneira minimamente satisfatória (…)
Mas..aqui
no Brasil eles se demonstram inaptos a gerir uma simples viagem. (perceba que
eles perderam um voo em Portugal…e no voo seguinte, se perderam aqui 2 vezes).
Não
pensam em mais nada que não seja a bebida.
Eles
chegam a se esconder para beber…a tia se esconde…e o tio serve de escudo.»
32. A Sra. Dra. (…), Professora da
Faculdade de Medicina de Lisboa e Especialista em Psiquiatria, emitiu um
relatório médico, relativo ao 1.º réu, datado de 14.05.2014, com o seguinte
teor:
«Carlos
Gomes está em tratamento psiquiátrico desde há mais de 18 anos com uma doença
Bipolar. Tem evoluído para um quadro de défice cognitivo (nomeadamente na
memória de fixação e de evocação), com períodos (?) confusionais (durante os
quais se desorienta no espaço e no tempo). Somos de parecer que a sua
capacidade de testemunho está muito reduzida.»
33. Em 2015 o Primeiro Réu tomava a
seguinte medicação, prescrita pela psiquiatra Drª (…): Risperidona; Lítio;
Pentoxifilina e Escitalopram.
34. O 1.º réu exerceu as funções de
director comercial e encontrava-se reformado por invalidez.
35. Em 2015, o 1.º réu fumava mais de um
maço de tabaco por dia.
36. Também durante o ano de 2015, o 1.º
réu consumia diariamente e muitas vezes em grande quantidade, bebidas
alcoólicas e, concretamente, whisky, sempre tendo tido hábitos de consumo
excessivo de tal tipo de bebidas, sendo tal consumo concomitante com a toma da
medicação ao mesmo prescrita.
37. A partir de, pelo menos, o ano de
2013, o 1.º réu começou a não cuidar da sua higiene nem imagem, andando sempre
com roupas velhas e não tomando banho com frequência.
38. O 1.º réu adormecia, com frequência
e com o cigarro aceso na mão, no sofá da sala da casa onde habitava com a sua
mulher.
39. Por vezes, o 1.º réu fazia as suas
necessidades fisiológicas no chão da sala.
40. O 1.º réu e sua mulher tinham uma
empregada doméstica na sua habitação em Lisboa, a qual tinha de insistir para
que os mesmos se alimentassem e se lavassem.
41. Enquanto o 1.º réu e a sua esposa Carmen
Gomes habitaram a aludida residência em Lisboa, a mesma era sistematicamente
frequentada por pessoas que o 1.º réu e mulher tinham conhecido ocasionalmente
e, muitas vezes, no café.
42. O 1.º réu e Carmen Gomes não se
preocupavam com o pagamento dos serviços essenciais prestados à sua residência,
sendo parte dos mesmos pagos por débito directo.
43. O pagamento do fornecimento de água
à habitação do 1.º réu e sua mulher Carmen Gomes não era, inicialmente, feito por
débito em conta e, por isso, o mesmo chegou a ser cortado, por falta de
pagamento.
44. O 1.º réu e sua mulher, enquanto
viveram na sua habitação em Lisboa, entregavam, por vezes, o cartão de débito a
empregadas domésticas e ou em cafés, com o referido código pin para efectuar
pagamento e compras.
45. O 1.º réu chegou a entregar à
empregada doméstica, para comprar fruta, € 40,00 e € 60,00 e não se preocupava
com a restituição ou não do troco.
46. O 1.º réu e a sua mulher perderam
por diversas vezes – pelo menos três – e até ao Verão de 2017, os cartões
bancários dos mesmos.
47. Carmen Gomes era médica, e mesmo
depois de ter deixado de exercer e ter adquirido hábitos de consumo excessivo
de álcool, e já tendo perdido as faculdades mentais e a consciência necessária
para qualquer exercício da medicina, automedicava-se, bem como ao seu marido,
recusando muitas vezes, por ter sido médica, que qualquer deles fosse a um
médico, ou protelando as necessárias idas ao médico.
48. Com data de 25.07.2016, a Prof. Dra.
(…), Professora Catedrática de Psiquiatria e Saúde Mental da Faculdade de
Medicina de Lisboa, emitiu relatório médico-psicológico relativo ao ora
Primeiro Réu, do qual fez constar o seguinte:
«Carlos
Gomes, de 77 anos de idade, director comercial aposentado, sofre duma
“Pertubação Afectiva Bipolar” (F 30 – CID10), com o sub-tipo “Bipolar Tipo 1”.
A sua doença caracteriza-se pela alternância de episódios de depressão do humor
com episódios de exaltação e de euforia. Está a ser acompanhado em tratamento
psiquiátrico, desde há mais de vinte anos tendo iniciado tratamento na minha
consulta de ambulatório a 3/11/2005. Anteriormente a esta data tinha tido dois
internamentos psiquiátricos – no Hospital de Santa Maria por episódio
depressivo (tristeza, irritabilidade e perda de gosto pela vida) e na Clínica
Lopes Ibor em Madrid por episódio maníaco (insónia, verborreia, gastos e
compras excessivas). Durante os episódios maníacos tinha um consumo excessivo
de álcool e comportamento de risco.
Tem
uma história familiar de depressão. A evolução foi marcada por grande
instabilidade.
Pelo
facto de ter baixa adesão à medicação (com uma consequente intoxicação pelo
Lítio fármaco que tomava para profilaxia dos episódios maníacos) e por marcada
perturbação nas relações interpessoais, no momento em que veio pela primeira
vez à minha consulta estava internado num Lar – Domus Vida – onde a
regularidade dos hábitos alimentares, de sono e a toma da medicação estavam
asseguradas. Por outro lado o consumo de álcool, a irritabilidade, a
desorganização do comportamento e os gastos excessivos tornavam o ambiente
familiar muito perturbado. No relatório da Clinica Lopez Ibor de 22 de
Fevereiro de 2005, é mencionado que dois anos antes tinha tido um “acidente
cérebro-vascular que como sequelas apresentava disartria, parésia do membro
inferior direito, com perda de força e reflexos patológicos” – situação que
produzia uma marcha instável e dificuldades de equilíbrio. Faz um teste
euro-cognitivo nesta mesma clínica que revela um défice de memória e de função
executiva.
Exames
complementares de diagnóstico:
-
24/05/2004 – RMN (ressonância magnética) que revela uma atrofia
corticosubcortical global de predomínio parietal e menos acentuada nas regiões
prefrontal e temporal anterolateral em ambos os hemisférios; 22/04/2005 – PET
scaning que revela um grave hipometabolismo cortical global com acentuações
parietal bilateral, prefrontal e temporal anterior, de provável origem
multifactorial (vascular, tóxica e neurodegenerativa) mas sem evidência de
evolução progressiva.
Inicia
em 2005 uma terapêutica de estabilização do humor com associação de Lítio a um
antipsicótico e antidepressivo, tendo lentamente melhorado. Em 2007 pode voltar
para a sua residência. Apesar de mais estabilizado por não ter voltado a ter
episódios graves mantinha um estado sub-depressivo com ansiedade, abatimento,
perde de gosto pela vida, hábitos alcoólicos excessivos e dificuldades
cognitivas com défices na memória de trabalho, problemas de orientação,
episódios sub-confusionais e ligeiras dispraxias.
A
situação do ponto de vista clínico configurava um défice cognitivo moderado.
Este estado com algumas flutuações manteve-se resistente à terapêutica até há
cerca de ano e meio. Nessa altura suspende mos hábitos de abuso do álcool e
fica mais estabilizado e com um estado de humor mais eutímico.
Podemos
concluir que a sua doença bipolar, de natureza crónica e que exige um
acompanhamento psiquiátrico regular e mantido, está actualmente num período de
estabilidade, mantendo-se os défices de base descritos.»
49. No dia 07.07.2017, o 3.º réu
efectuou, junto da 3.ª Divisão Policial de Lisboa da Polícia de Segurança
Pública, auto de denúncia contra desconhecidos, em virtude da realização de 8
levantamentos com o cartão de débito emitido em nome do 1.º réu, pelo Novo
Banco, com n.º 4261500058970091, no valor total de € 1.600,00, entre o dia 6 e
14 de Maio de 2017.
50. Em Março/Abril de 2017, o 1.º réu
auferia uma pensão de reforma no valor de € 1.153,17.
51. Em Julho de 2017, Carmen Gomes tinha
em débito para com a Farmácia Pátria, a quantia de € 1.037,63.
52. Em 11.05.2017, o 1.º réu tinha em
débito, a título de dívida de fornecimento de electricidade, a quantia de € 1.824,21,
além do valor da factura corrente mensal, no valor de € 168,70.
53. Em 27.06.2017, o 1.º réu tinha em
débito a renda correspondente ao mês de Junho da habitação onde o mesmo e Carmen
Gomes habitavam, acrescido do valor correspondente a 50% da mesma renda, tudo
no valor de € 567,00.
54. Em Março de 2017, o 1.º réu e Carmen
Gomes deviam uma quantia não concretamente apurada a uma empregada doméstica
dos mesmos.
55. Em 27.02.2017, a conta bancária n.º
0374.0020003612, aberta no Banco Santander Totta, titulada por Carmen Gomes,
apresentava um saldo total de € 22.742,72.
56. Em 31.03.2017, a referida conta
apresentava um saldo total de € 19.611,80.
57. Em 05.04.2016, a conta bancária n.º
230205753206, aberta no Banco Bankinter, titulada por Carmen Gomes, apresentava
um saldo total de € 18.061,84.
58. Na sequência do determinado pelo
Ministério Público em sede do processo n.º 257/17.8PVLSB, que correu termos na
7.ª secção do DIAP, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa elaborou um
relatório, datado de 23 de Junho de 2017, referente à situação do 1.º réu e de Carmen
Gomes, do qual consta o seguinte:
«No
dia 26 de Maio, a EAI regressou ao local, com o apoio da Polícia de
Proximidade, da 21.ª Esquadra, pertencente a Campolide. Foi possível observar a
falta de higiene na casa, bem como o estado físico e psicológico actual da Sra.
Carmen Gomes e do marido, o Sr. Carlos Gomes. Esta visita foi efectuada no
período da manhã, em que já era visível o estado de embriaguez em que se
encontrava o Sr. Carlos, bem como os hábitos de consumo excessivos, sobretudo
tabágicos, por parte da Sra. Carmen. (…)
Foi
a Cuidadora Luísa que descreveu as rotinas deste casal e que têm contribuído
para o agravamento do seu estado de saúde física e mental, colocando não em
risco o seu bem-estar, mas também o bem-estar dos outros.
Das
situações descritas pela Sra. Luísa, salientamos as seguintes: o consumo
excessivo de álcool, por parte dos dois idosos, tendo a EAI observado a
quantidade de álcool existente na casa, em detrimento de outros produtos
essenciais, como os alimentares; os hábitos tabágicos, sobretudo por parte da
Sra. Carmen, que colocam em risco a sua saúde, uma vez que a mesma já apresenta
graves problemas de saúde; a administração de bebidas alcoólicas com
medicamentos; a administração de medicamentos, sem controlo externo, sendo a
Sra. Carmen que prescreve as receitas médicas a si própria e ao marido, derivado
do facto de a mesma ter sido Médica e de manter ainda a respectiva cédula
profissional; a falta de condições de higiene e segurança (odor nauseabundo;
baratas espalhadas pela casa; sofá com nódoas de fezes; quarto com mesa de
cabeceira de madeira repleta de beatas), entre outros aspectos que condicionam
a qualidade de vida e a saúde destes idosos.»
59. No Verão de 2017, o 1.º réu,
juntamente com a sua esposa Carmen Gomes foi internado pelos 2.º e 3.º réus na
Casa da Senhora da Penha, em Portalegre.
60. Aquando do seu internamento na
instituição referida no ponto anterior, o 1.º réu demonstrava não ter horários
para nada e dependência nas actividades da vida diária, além dos hábitos
tabágicos compulsivos e, de noite, saída do seu quarto e ia aos quartos dos
outros utentes.
61. No âmbito do supra aludido processo
de maior acompanhado, foi elaborado relatório do exame médico-legal respeitante
ao 1.º réu, pelo Centro Hospitalar Lisboa Norte. EPE, com base em entrevista
clínica realizada a 11 de Agosto de 2017, do qual consta o seguinte:
«Doente
com contacto fácil, orientado tempero-espacialmente, colaborante na entrevista,
aspecto cuidado, mas envelhecido. Apresenta dificuldade em fornecer elementos
da sua história clínica, sendo evidentes os deficits na memória de evocação.
A
memória recente não se encontra à observação tão alterada, falando sobre
assuntos recentes e política.
O
humor é eutímico.
Capacidade
de cálculo razoavelmente mantida.
Pensamento
abstracto aparentemente mantido.
Algum
deficit de juízo crítico. Ausência de consciência mórbida.
MMS-28/30.
Relativamente
aos seus bens materiais/rendimentos e propriedades do doente: refere serem
proprietários de uma Clínica de Fisioterapia, actualmente gerida pelo filho
mais velho, revelando estar satisfeito com a sua forma de trabalho “está bem
entregue para ele, acho que ele é de confiança”).
Quanto
à Casa/herdade no Alentejo aforma “quero gerir eu, o meu filho pode gerir a
clínica que eu já não preciso”.
Refere
viver com reforma do casal, que paga a casa de repouso onde habitam actualmente
e têm as suas necessidades diárias asseguradas e de parte de rendimentos da
clínica.
Em
síntese, o doente sofre de Perturbação Bipolar tipo I, (F31-ICD-10) patologia
com carácter crónico, encontrando-se medicado, e estabilizado aparentemente
apenas há cerca de um ano, após interrupção dos consumos de álcool. Este quadro
psiquiátrico, os consumos de álcool e as co-morbilidades orgânicas, onde se
destacam os acidentes vasculares cerebrais sofridos, concorreram para a instalação
de um quadro de defeito cognitivo ligeiro a moderado, onde sobressaem defeitos
mnésicos de evocação e algum deficit de juízo crítico e de consciência
mórbida.»
62. Em sede de interrogatório judicial
realizado no âmbito do aludido processo de maior acompanhado foi possível ao
Tribunal apurar que «o mesmo não soube
precisar há quanto tempo se encontrava a viver na casa de repouso em
Portalegre, pensando que assim sucedia talvez há nove ou dez anos, não ver o
cônjuge há cerca de nove ou dez anos e que ali conversa com outros utentes, vê
televisão, lê o jornal e tem amizades, não tendo sabido precisar a data em que
o interrogatório se efectuou e que já não bebe.»
63. O estado físico e psíquico do 1.º
réu, bem como da sua esposa Carmen Gomes, que ditou a medida de acompanhamento
acima referida era notado por quem convivesse com estes, sendo também do
conhecimento do autor, pelo menos, em Maio de 2015.
64. A subscrição do documento mencionado
em 5) foi precedida de uma negociação levada a cabo pelo 2.º réu, directamente
ou por intermédio de advogado.
65. Tal se deveu porque, à data, já
existia a preocupação, por parte do 2.º réu em salvaguardar o 1.º réu e sua
esposa Carmen Gomes contra quaisquer abusos ou enganos.
66. Desde a subscrição do documento
mencionado em 5), o autor visitava o 1.º réu e Carmen Gomes, na sua casa de
Tolosa, quando o casal aí se encontrava a passar temporadas.
67. Em data não concretamente apurada,
mas durante o ano de 2014, Eduardo Gomes, sobrinho do 1.º réu, que reside ao
lado da casa deste em Tolosa, viu o autor e o 1.º réu chegarem a casa de
madrugada, sendo que o 1.º réu vinha embriagado e com dificuldade de andar pelo
seu próprio pé.
68. Em data não concretamente apurada,
mas durante o ano de 2014, depois de ter tomado conhecimento da aproximação do
autor à casa dos seus pais, e das visitas frequentes que este tinha passado a
fazer-lhes, o 2.º réu tomou a iniciativa de combinar um acordo com aquele, o
que efectivamente veio a acontecer junto ao cemitério de Tolosa.
69. Nessa ocasião, o 2.º réu confrontou
o autor com a supra descrita aproximação aos seus pais, advertindo-o que,
devido ao estado de doença psíquica dos pais, todas as questões relacionadas
com quaisquer negócios dos seus pais deveriam ser tratadas consigo e com o 3.º
réu.
70. No âmbito dessa conversa, o autor
confirmou perante o 1.º réu que havia constatado que o 1.º réu e sua esposa Carmen
Gomes não se encontravam bem.
71. Em data não concretamente apurada,
mas durante o mês de Janeiro de 2015, num almoço ocorrido em Gáfete, o assunto
relacionado com o estado psíquico do 1.º réu e de Carmen Gomes, foi falado
entre o autor, o 2.º réu e as Sras. Dras. Natália Silva e Sónia Pereira.
72. Também nessa ocasião, o autor voltou
a manifestar a sua preocupação pelo estado da saúde psíquica do referido casal.
73. Nessa altura, ficou bem entendido
entre os participantes no dito almoço que qualquer assunto relacionado com o
acordado no âmbito do documento mencionado em 5) teria de passar sempre pelos
2.º e 3.º réus.
74. O autor não deu conhecimento aos 2.º
e 3.º réus da negociação e subscrição do acordo mencionado em 8), denominado «Adenda ao Contrato de Arrendamento
Florestal».
75. Depois de ter tomado conhecimento da
subscrição do acordo denominado «Adenda
ao Contrato de Arrendamento Florestal», em Julho de 2015, o 2.º réu
telefonou ao autor, que não atendeu.
76. Logo de seguida, o 2.º réu encetou
nova tentativa de contacto, usando o telefone da sua esposa, havendo o autor,
que não conhecia aquele número, atendido a chamada.
77. Após a sua subscrição, o autor ficou
em seu poder com todos os exemplares do acordo denominado «Adenda ao Contrato de Arrendamento Florestal».
78. O 2.º réu remeteu ao autor uma carta
datada de 21 de Junho de 2016, no âmbito do qual lhe comunicou que «Ora, a sua posterior actuação, sita o
contacto directo com o meu progenitor para que este se deslocasse a Tolosa, com
vista a promoverem uma adenda ao contrato de arrendamento, foi de uma manifesta
má-fé.»
79. O 3.º réu remeteu ao autor uma carta
datada de 21 de Junho de 2016.
80. O 1.º réu e a sua mulher Carmen
Gomes, na qualidade de senhorios, e o autor, na qualidade de arrendatário,
subscreveram o documento escrito denominado «Alteração
ao Contrato de Arrendamento Florestal», datado de 01 de Março de 2016, do
qual consta a seguinte redacção:
«Na
qualidade de outorgantes do Contrato de Arrendamento Florestal celebrado em
01-12-2010 procedem à alteração do n.º 1 da cláusula 2.ª e à cláusula 4.ª as
quais passam a ter a seguinte redacção:
2.ª
1.O
presente contrato tem início em 01 de Julho de 2010 e terminará em 31 de
Dezembro de 2033, não renovável, salvo acordo expresso das partes nesse
sentido.
4.ª
1.
A Renda anual é de 17.000,00€ (dezassete mil euros) e será paga entre 1 de
Julho e 31 de Agosto do ano respectivo.»
81. Através de cheque datado de 15.09.2015,
por ele emitido à ordem do 1.º réu, o autor entregou àquele a quantia de €
8.500,00.
82. Através de cheque datado de 31.08.2015,
por ele emitido à ordem de Carmen Gomes, o autor entregou àquela a quantia de €
8.500,00, creditada na respectiva conta bancária em 11.09.2015.
83. Através de cheque datado de 31.07.2016,
por ele emitido à ordem do 1.º réu, o autor entregou àquele a quantia de € 8.500,00,
creditada respectiva conta bancária em 29.07.2016.
84. Através de cheque datado de 15.07.2016,
por ele emitido à ordem de Carmen Gomes, o autor entregou àquela a quantia de €
8.500,00, creditada na respectiva conta bancária em 22.07.2016.
85. Os artigos 63.º e 64.º da
contestação, apresentada pelo 1.º réu e Carmen Gomes no âmbito do processo de
maior acompanhado acima mencionado, apresenta a seguinte redacção:
«63.º
Os
Requeridos assinaram o documento 9 (documento denominado «Aditamento ao
Contrato de Arrendamento Florestal») com a contestação, a pedido do
arrendatário por razões de natureza fiscal, mas já foi regularizado a situação
conforme documento 1 (documento denominado «Alteração a Contrato de Arrendamento
Florestal», datado de 1 de Março de 2016) que se junta e se dá por reproduzido
para todos os efeitos legais (sublinhado em aditamento nosso).
64.º
Contudo
os Requeridos continuam a receber a quantia constante no contrato de
arrendamento florestal.»
86. Em 31 de Janeiro de 2018, Carmen
Gomes tinha 333,034 unidades de participação, no valor unitário de € 27,01862,
disponibilizadas pela Liberty Seguros.
87. Em 23 de Maio de 2013, Carmen Gomes
tinha 325,497 unidades de participação, no valor unitário de € 22,95864,
relativos ao produto financeiro Europeia PPR, disponibilizado pela Liberty
Seguros.
88. Em 12.11.2013, Carmen Gomes dispunha
da quantia de € 67.084,22, a título de depósitos e investimentos no Banco
Barclays.
89. Em Maio de 2015, Carmen Gomes
dispunha da quantia de € 52.968,99, a título de depósitos e investimentos no
Banco Barclays.
90. Em 22.07.2013, Carmen Gomes, o 2.º
réu e António Rodrigues dispunham de um total em activos no valor de € 100.640,13
depositados/investidos no Banco Best.
91. Em 31.03.2014, Carmen Gomes dispunha
de um património total de € 13.851,93 investido na SGF – Sociedade de Gestora
de Fundos, SA.
92. Através de carta datada de 14.11.2013,
o Banco Barclays comunicou a Carmen Gomes o seguinte:
«Temos
o prazer de lhe apresentar o Barclays Premier Universe, uma nova filosofia de
fazer banca que tem um propósito muito claro: ajudá-la a realizar as suas
ambições, os seus desejos, os seus objectivos pessoais e profissionais. (…)
O
Barclays Premier Universe é um serviço acessível a Clientes que detenham no
Barclays (…) património financeiro igual ou superior a €100.000,00 em produtos
de depósito ou poupança à ordem ou a prazo e/ou produtos de investimento
contratados ou depositados no Banco, ou que reúnam, em base mensal, um montante
mínimo de 5.000,00€, a título de domiciliação de vencimento, pensão e /ou
entregas regulares, durante três meses, num período consecutivo de quatro
meses.»
93. No final de 2014 e nos primeiros
meses de 2015, até pelo menos ao mês de Maio, o referido casal deslocava-se a
esse escritório, para conversar com a Dra. Natália Silva, quase todas as
semanas, havendo ao longo desse período semanas em que ali se deslocavam mais
de uma vez.
94. Em todas essas ocasiões, o réu Carlos
Gomes apresentava-se visivelmente embriagado, e mesmo cambaleante.
95. E muitas vezes acabava por não
permanecer no escritório da Dra. Natália Silva por ir consumir bebidas
alcoólicas para um restaurante nas proximidades.
96. Tudo isto em pleno período diurno.
97. Nas conversas que a Dra. Natália
Silva tinha com o casal, o réu Carlos Gomes raramente falava, por não estar
capaz de manter uma conversa, e quando o fazia manifestava alheamento e
incompreensão sobre o que estava a ser falado.
98. Chegava a fazer perguntas que
manifestavam um total desconhecimento sobre o assunto da conversa, quando se
tratava de assuntos que lhe diziam respeito, e de factos sucedidos com o
próprio.
99. Carmen Gomes começou a
apresentar-se, também, visivelmente embriagada.
100. Por esse motivo, entre outros, a
Dra. Natália Silva chegou a dizer ao autor que, tendo em conta a incapacidade
do réu Carlos Gomes e da sua esposa, estava proibido de celebrar com este casal
quaisquer acordos.
101. O réu Carlos Gomes e a sua esposa Carmen
Gomes nunca pediram à Dra. Natália Silva a colaboração técnica ou qualquer
conselho relativamente à celebração do acordo mencionado em 8).
102. Em data não concretamente apurada,
mas durante o mês de Março de 2015, a Dra. Natália Silva e o réu Bruno Gomes
deslocaram-se a casa do autor e, nessa ocasião, o 2.º réu disse-lhe que não
deveria negociar com os seus pais, uma vez que estes não se encontravam em
condições psíquicas para tal.
103. Também nessa ocasião, o autor
lamentou ao réu Bruno Gomes o estado de saúde do réu Carlos Gomes, bem como os
problemas de alcoolismo do casal Oliveira.
104. Em data não concretamente
determinada, mas durante os meses de Outubro e Novembro de 2015, o Réu José
Alberto e a sua mulher Carmen Gomes deslocaram-se ao escritório da Dra. Natália
Silva para lhe entregar uma citação que haviam recebido meses antes,
encontrando-se já ultrapassado o prazo de contestação.
105. Nessa mesma ocasião, a Dra. Natália
Silva, já sabendo da existência do acordo assinado em Maio de 2015, mas sem
conhecer o seu teor, perguntou ao réu Carlos Gomes porque é que tinha assinado
uma alteração ao contrato de arrendamento sem lhe dizer nada, ao que este
respondeu que era uma coisa simples, e que não valia incomodar a sua advogada,
dizendo também que o contrato tinha ficado muito melhor.
106. Durante essa conversa, Carmen Gomes
questionou o réu Carlos Gomes sobre a existência daquele contrato.
107. Em data não concretamente apurada,
mas depois do ano de 2017, o réu Pedro Gomes comunicou ao autor que quaisquer
pagamentos de rendas deviam ser feitos a si ou ao réu Bruno Gomes.
108. Em datas não concretamente
apuradas, mas durante o período compreendido entre 3 de Setembro de 2020 e
Junho de 2022, o autor procedeu ao corte de eucaliptos existentes no imóvel
objecto do acordo mencionado em 5), em quantidade não concretamente apurada.
109. Através de carta datada de
15-12-2020, a «Navigator Forest Portugal, S.A.» comunicou à
«Reachvalue-Imobiliária Unipessoal, Lda o seguinte:
«Informamos,
ainda, que o preço actualmente em vigor engloba uma bonificação de 4,00 por
metro cúbico no caso da madeira certificada, dado que, por este arrendamento
ter sido gerido pela Navigator Forest Portugal, a madeira tem a sua gestão
florestal certificada. Esta bonificação foi tomada em consideração para o preço
que de seguida se indica.
Assim,
face às condições contratuais acordadas e atentos os preços em vigor para a
madeira de eucalipto a entregar em fábrica, vimos comunicar que será paga a V.
Exas., na data estabelecida para o efeito, uma renda variável de valor igual ao
valor de 77,5% do volume total líquido da madeira entrada na fábrica, sendo o
valor actual da madeira em pé a utilizar para aquele cálculo, de 27,6 euros por
metro cúbico de Madeira com Casca para Celulose, valor que inclui já o prémio
de certificação a que atrás se faz referência.»
Factos julgados não provados
pelo tribunal a quo:
a) Por conta das facturas mencionadas em
20) o 1.º Réu e Carmen Gomes liquidaram € 841,50 (relativamente à factura n.º
77) e € 957,60 (respeitante à factura n.º 83).
b) Perante os consecutivos e reiterados
pedidos do autor, o 1.º réu e Carmen Gomes invocaram dificuldades financeiras
para não procederem ao pagamento atempado dos montantes em débito no valor de €
29.985,00, relativos às facturas em causa.
c) O 1.º réu e Carmen Gomes acordaram com
o autor que a dívida de € 29.985,00 seria liquidada através de amortizações
parciais anuais sucessivas no valor de € 5.000,00 até integral e efectivo
pagamento, sendo a primeira amortização a realizar em 01.07.2017.
d) O autor entregou ao 1.º réu e a Carmen
Gomes as quantias mencionadas nos pontos 81) a 84) a título de uma concessão de
empréstimo acordada com estes.
e) O aumento dos custos associados às
actividades mencionadas em 17) e 18) motivaram a subscrição do documento
mencionado em 8).
f) Os 2.º e 3.º réus tiveram
conhecimento do acordo mencionado no ponto 8) em Maio de 2015.
g) A parcela de terreno identificada em
22) constitui uma área particularmente valiosa para a agricultura pelo facto de
o solo ser de maior qualidade e fertilidade e ter muita água.
h) No dia 04.11.2016, o 1.º réu foi
internado no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, por suspeita de AVC, tendo
tido alta no dia 08.11.2016, por recusa do 1.º réu em manter soro.
i) No dia 04-06-2017 e por problemas
circulatórios e dificuldades respiratórias, o 1.º réu foi à Urgência do
Hospital de Santa Maria, em Lisboa, onde ficou internado até 23.06.2017.
j) A factualidade atinente ao
desinteresse com que o 1.º réu e Carmen Gomes emprestavam dinheiro a pessoas
recém conhecidas, ou facilidade com que entregavam o seu cartão de multibanco
(com código) a diversas pessoas ou com que entregavam somas de dinheiro
desproporcionadas para compras de valores muito reduzidas, sem aparentemente
terem noção dos preços e sem depois se interessarem por pedir o correspondente
troco, era comentada pela população de Tolosa.
k) O autor ficava horas com o 1.º réu e
sua esposa Carmen Gomes durante as visitas que realizava à casa destes em
Tolosa.
l) O autor colaborava também com o
consumo excessivo de bebidas alcoólicas pelo 1.º réu.
m) A partir de 2015, deixaram de existir
eucaliptos na propriedade.
n) Também a partir do ano de 2015, o
autor apenas utilizou a propriedade nos termos referidos em 16).
*
1 – Nulidade da sentença
recorrida:
O recorrente sustenta que,
tendo a notificação judicial avulsa descrita no n.º 10 da matéria de facto
provada visado a resolução do contrato de arrendamento florestal por falta de
pagamento de rendas, a sentença recorrida, ao declarar esse contrato extinto
com fundamento no decurso do prazo de vigência estipulado, padece das nulidades
previstas no artigo 615.º, n.º 1, als. c), d) e e), do CPC, porquanto é
ininteligível, pronunciou-se sobre uma questão cujo conhecimento lhe estava
vedado e condenou em objecto diverso do pedido.
A sentença recorrida não é
ininteligível. A compreensão daquilo que o tribunal a quo decidiu e das razões por que o fez não suscita qualquer
dificuldade. Tanto assim é que, da leitura das alegações de recurso, resulta
que o recorrente percebeu perfeitamente a decisão tomada pelo tribunal a quo e os seus fundamentos. O
recorrente discorda dessa decisão, mas isso constitui questão diversa da
inteligibilidade desta. Portanto, a nulidade prevista na al. c) não se
verifica.
Os pedidos reconvencionais
que relevam para a apreciação da arguição da nulidade prevista na al. e) são os
seguintes: 1) Declaração, como válida e eficaz, da resolução do contrato de
arrendamento florestal; 2) Declaração da existência do dever de restituição do
imóvel arrendado desde 03.09.2020; 3) Condenação do recorrente a restituir o
imóvel.
A sentença recorrida não
excedeu, quantitativa ou qualitativamente, qualquer destes pedidos, porquanto:
1) Não se pronunciou sobre a validade e a eficácia da resolução do contrato,
por ter considerado que a causa de extinção deste foi o decurso do prazo
estipulado; 2) Declarou a existência do dever de restituição do imóvel
arrendado desde 03.09.2020; 3) Condenou o recorrente a restituir o imóvel.
É ao nível da causa de pedir
que se suscitam problemas. Está em causa a nulidade prevista na al. d).
Tendo em conta a forma como
o recorrente fundamenta a sua arguição de nulidade da sentença, esclareça-se
que, para a sua apreciação, releva a relação, não entre o conteúdo da
notificação judicial avulsa e o da sentença, mas sim entre o conteúdo da
contestação/reconvenção e o da sentença, como decorre do artigo 608.º, n.º 2,
2.ª parte, do CPC.
A causa de pedir dos pedidos
reconvencionais acima referidos é complexa, sendo constituída: 1) Pelos factos
que, na tese dos reconvintes, determinam a invalidade das alterações ao
contrato celebradas em 20.05.2015 e 01.03.2016; 2) Pela falta de pagamento das
rendas, no montante resultante da primeira (e, sendo assim, única) versão do
contrato, relativas aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020; 3) Pela existência de
uma resolução válida e eficaz do contrato, efectuada em 03.09.2020.
O tribunal a quo julgou procedentes os pedidos de
declaração da existência, desde 03.09.2020, do dever de restituição do imóvel
arrendado, e de condenação do recorrente a proceder a esta restituição, com
fundamento na invalidade das alterações ao contrato celebradas em 20.05.2015 e
01.03.2016 e no decurso do prazo de duração do contrato que foi estipulado na primeira
e única versão deste. Ou seja, julgou o contrato extinto por efeito, não da
resolução invocada pelos recorridos, mas sim do decurso do prazo estipulado
nesse contrato, que estes não invocaram como causa de pedir.
A apontada discrepância
entre o fundamento da reconvenção e o da sentença traduz-se numa violação do
disposto no artigo 608.º, n.º 2, 2.ª parte, do CPC. A questão do decurso do
prazo de vigência do contrato de arrendamento florestal não foi invocada, pelos
recorridos, como fundamento dos pedidos que formularam, e também não é de
conhecimento oficioso, pelo que estava vedado, ao tribunal a quo, pronunciar-se sobre ela. Tendo-o feito, incorreu em excesso
de pronúncia, padecendo a sentença da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1,
al. d), 2.ª parte, do CPC.
Os recorridos sustentam que
não se verifica esta nulidade porquanto um dos fundamentos da acção é o de que
o contrato de arrendamento, transcrito na petição inicial, se prolongou por
efeito da «adenda» datada de
20.05.2015. Ou seja, o recorrente pretendia que esta «adenda» fosse declarada
válida e aplicável em todos os seus aspectos, incluindo o do aumento do prazo
de duração do arrendamento, e não apenas no que se referia à redução do valor
da renda anual. Foi precisamente esta pretensão do recorrente que foi julgada
improcedente pelo tribunal a quo por
efeito da anulação da «adenda», peticionada
pelos recorridos, pelo que não há excesso de pronúncia: o tribunal a quo pronunciou-se sobre uma pretensão
que expressamente lhe foi colocada pelo Autor e julgou-a improcedente. Só isso.
Porém, não foi «só isso» que o tribunal a quo fez. Fez muito mais que isso. Declarou
o contrato extinto, o que foi pedido, não pelo recorrente, que pretendia a sua
manutenção, mas pelos recorridos. E fê-lo com fundamento não coincidente com
aquele que estes invocaram: o decurso do prazo estipulado para a duração do
contrato e não a resolução deste. Daí ter existido excesso de pronúncia.
Os recorridos sustentam também
que o tribunal a quo não transpôs o
limite decorrente dos factos essenciais alegados pelas partes, pelo que a sua
opção por julgar o contrato extinto devido ao decurso do prazo estipulado para
a sua duração se traduziu, meramente, numa aplicação do princípio jura novit curia.
Não é assim. O decurso do
prazo de vigência do contrato não foi invocado por qualquer das partes. Não o
foi pelo recorrente, o que seria contraditório com a sua pretensão de
manutenção do contrato. E também não o foi pelos recorridos, que fundamentaram
a sua pretensão de extinção do contrato num acto de resolução por eles
praticado e não no decurso do tempo. Sintomaticamente, os recorridos pediram
que o contrato fosse julgado extinto com efeitos a partir de 03.09.2020, data
da resolução, e não de 01.12.2017, data em que o prazo de vigência do contrato
expirou.
Noutra linha de
argumentação, os recorridos sustentam que a pretensão de que o contrato fosse
julgado extinto com fundamento no decurso do seu prazo de vigência está «implícita», supomos que na de extinção
por resolução.
Também esta argumentação não
procede, pois reporta-se a questão diversa daquela que nos ocupa. Esta última respeita
à causa de pedir e não ao pedido.
A origem do problema com que
nos defrontamos não é a mera falta de formulação de um pedido de declaração da
extinção do contrato devido ao decurso do seu prazo de vigência como
pressuposto do pedido de restituição do imóvel. Então sim, se os factos
consubstanciadores da causa de pedir tivessem sido alegados pela parte onerada
com o correspondente ónus, o pedido meramente declarativo cuja procedência
constitui pressuposto da do pedido de determinação da concreta providência
pretendida (restituição do imóvel) poderia considerar-se implícito neste
último.
Todavia, não é disso que
tratamos.
Os recorridos pediram a
restituição do imóvel e formularam expressamente, como pressuposto deste, o
pedido de declaração da resolução do contrato como válida e eficaz. É neste
ponto que a questão agora suscitada pelos recorridos se situa. Se não tivessem
formulado expressamente este último pedido, poderia considerar-se o mesmo
implícito no primeiro, uma vez que alegaram a respectiva causa de pedir. Mas
isso não é necessário, pelo que a questão da admissibilidade dos pedidos
implícitos não é pertinente.
O nosso problema é outro. Os
recorridos, nem formularam um pedido de declaração de extinção do contrato
devido ao decurso do seu prazo de vigência (pedido esse que, como vimos
anteriormente, teria de se reportar à data de 01.12.2017), nem alegaram esse
decurso do prazo de vigência do contrato como causa de pedir do pedido de
restituição do imóvel. A causa de pedir deste pedido consubstanciou-se, além do
mais, no acto de resolução do contrato, único fundamento de extinção deste que
os recorridos invocaram. E, pelo que anteriormente afirmámos, a falta de
invocação, pelos recorridos, do decurso do prazo de vigência do contrato como
fundamento da extinção deste é inultrapassável, vedando o conhecimento desta
questão pelo tribunal a quo.
Argumentam os recorridos,
por último, que, sendo o decurso do prazo (não renovável) estipulado para a
vigência de um contrato uma causa de cessação deste que opera ipso iure, tal cessação produz-se sem
necessidade de qualquer declaração, das partes ou do tribunal, nesse sentido. Pelo
que, ao julgar verificada a referida causa de extinção do contrato, o tribunal a quo limitou-se a constatar uma
ocorrência que se deu sem a sua intervenção, e cujo automatismo suscita, pela
sua própria natureza, o seu conhecimento oficioso.
Discordamos.
A abordagem proposta pelos
recorridos não distingue o plano processual do plano substantivo. Tendo a questão
da delimitação da causa de pedir natureza processual, é exclusivamente neste
plano que terá de ser resolvida, sem se deixar contaminar por considerandos de
natureza substantiva.
Concretizando:
Para poderem ser
considerados no processo, os factos ocorridos na ordem substantiva têm de ser
validamente trazidos àquele. Tais factos não se repercutem automaticamente no
processo, antes tendo de ser a ele levados nos termos previstos na lei
processual. Em regra, isso faz-se através dos ónus de alegação e de prova que a
lei coloca a cargo das partes. Não é por produzir efeitos automáticos no plano
substantivo que um facto produz efeitos automáticos no plano processual, ou
seja, é automaticamente adquirido no processo. Sendo assim, é insustentável a
pretensão de que o decurso do prazo de vigência de um contrato se repercuta
automaticamente no processo pelo simples facto de se verificar. Para que tal
facto possa ser considerado no processo, terá de ser invocado como fundamento
de um pedido de extinção do contrato pela parte que nisso tenha interesse. Não
o sendo, o mesmo facto não pode ser conhecido pelo tribunal. Se este o fizer,
incorrerá em excesso de pronúncia.
Poder-se-ia
contra-argumentar nos seguintes termos: Se o tribunal a quo não pudesse conhecer da questão do decurso do prazo de
validade do contrato apesar de este facto não integrar a causa de pedir dos
pedidos reconvencionais a que nos vimos reportando, ficaria na situação de não
poder julgar o contrato extinto, tendo de julgar aqueles pedidos improcedentes.
Não poderia julgar o contrato extinto com fundamento no decurso do seu prazo de
vigência porque incorreria em excesso de pronúncia. E não poderia julgar o
contrato extinto por resolução porque a eficácia desta pressupõe a subsistência
desse contrato à data em que ocorre, não sendo possível resolver um contrato
que já não existe.
Tal argumentação traduzir-se-ia
em nova confusão entre os planos adjectivo e substantivo. Se o decurso do prazo
de vigência do contrato não puder ser atendido pelo tribunal, por razões de
natureza processual, para fundamentar uma decisão de procedência, também o não
poderá ser para fundamentar uma decisão de improcedência. O tribunal proferirá
decisão com base nos factos de que puder conhecer.
Sendo assim, o tribunal a quo devia ter-se abstido de declarar o
contrato extinto com fundamento no decurso do seu prazo de vigência e, em vez
disso, devia ter apreciado se o fundamento de extinção invocado pelos
recorridos (resolução) procedia.
A nulidade da sentença
recorrida, nos termos expostos, não determina a descida dos autos ao tribunal a quo para que profira nova sentença. Em
vez disso, nos termos do artigo 665.º, n.º 1, do CPC, o tribunal ad quem conhecerá da questão da validade
e eficácia da resolução do contrato, questão essa amplamente discutida no
tribunal a quo.
2 – Impugnação da decisão
sobre a matéria de facto:
2.1. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte:
- «Desde,
pelo menos, Julho de 2015 todos os R.R.R. têm inteiro e perfeito conhecimento
de todo o teor da Adenda dada por provada em 7. e 8. Dos factos provados datada
de 20/Maio/2015.»
- «Nenhum
dos R.R.R., nem ninguém impugnou judicialmente tal Acordo Escrito, nunca tendo
proposto qualquer Acção contra o Autor, já lá vão mais de 5 anos. Tudo isto,
apesar de terem inteiro e perfeito conhecimento do seu teor e da sua
realização.»
Como fundamento para esta
pretensão, invoca o teor do artigo 38.º da petição inicial, do artigo 24.º da
réplica e do n.º 75 do enunciado dos factos provados.
Esta fundamentação é
ininteligível.
Os artigos 38.º da petição
inicial e 24.º da réplica contêm a alegação da matéria acima transcrita.
Carecem, obviamente, de valor probatório.
O n.º 75.º do enunciado dos
factos provados tem a seguinte redacção: «Depois
de ter tomado conhecimento da subscrição do acordo denominado “Adenda ao
Contrato de Arrendamento Florestal”, em Julho de 2015, o 2.º réu telefonou ao
autor, que não atendeu.» Pretenderá o recorrente que, deste facto, se
infiram aqueles que ele quer ver introduzidos no enunciado da matéria provada?
Na hipótese afirmativa, com que fundamento? O recorrente não indica. Certo é
que o facto de se encontrar provado que o recorrente Bruno Gomes tomou
conhecimento da subscrição da «Adenda ao
Contrato de Arrendamento Florestal» não equivale a ele conhecer o conteúdo
desta. Tanto mais que se provou que, após a sua subscrição, o recorrente ficou
com todos os exemplares da referida adenda em seu poder (n.º 77).
2.2. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte:
- O primeiro réu e o seu cônjuge «já estavam em condições para realizarem vendas
de imóveis e/ou partes dos mesmos, que lhe pertenciam e receberem os
respectivos preços, tendo outorgado escrituras em cartórios notariais em
27/Janeiro/2017 e 18/Novembro/2016.»
- «Que
se saiba nenhum dos aqui R.R.R. pôs em crise tais negócios.»
O recorrente sustenta que
esta matéria decorre de documentos autênticos juntos com a réplica (docs. aí 1
e 2), cujo teor aí foi dado por integralmente reproduzido e não foi impugnado
pelos réus. Mais, segundo o recorrente, tal matéria foi confessada pelo recorrido
Bruno Gomes em sede de depoimento de parte, «gravado no sistema Citius, entre
as 14:15 e as 17:58 horas».
Relativamente à alegada
confissão, verificamos que a mesma não consta da acta da sessão da audiência
final em que o depoimento de parte foi prestado. Pelo contrário, aí se fez
constar que, daquele depoimento, «não
resultou matéria confessória». Por outro lado, o recorrente não indica, com
exactidão, as passagens da gravação daquele depoimento em que se funda a sua
pretensão, incumprindo, assim, o ónus estabelecido no artigo 640.º, n.º 2, do
CPC.
Os documentos referidos pelo
recorrente são duas escrituras públicas mediante as quais foram celebrados contratos
de compra e venda em que intervieram, entre várias outras pessoas,
aparentemente seus familiares, o recorrido Carlos Gomes e o seu cônjuge. Desses
documentos apenas resulta a celebração daqueles contratos e os respectivos
conteúdos, contratos esses que nada têm a ver com a situação dos autos. No que
concerne às «condições» em que o
recorrido Carlos Gomes e o seu cônjuge estariam quando tais contratos foram
celebrados, os documentos em causa nada dizem.
Poderá argumentar-se que o
facto de o recorrido Carlos Gomes e o seu cônjuge terem outorgado nas referidas
escrituras demonstra que qualquer deles se encontrava na plena posse das suas
faculdades mentais. Sem razão, porém. Os documentos em questão não demonstram
que o recorrido Carlos Gomes e o seu cônjuge se encontrassem na plena posse das
suas faculdades mentais, mas apenas que a notária perante o qual as declarações
negociais foram emitidas não se apercebeu de que eles o não estivessem. A
ausência de tal percepção por parte da notária não tem qualquer relevo
probatório, para mais em escrituras com tantos outorgantes como as referidas.
A frase «Que se saiba nenhum dos aqui R.R.R. pôs em
crise tais negócios» constitui um mero comentário feito pelo recorrente na
réplica, não um facto que mereça ser incluído no enunciado da matéria de facto
provada, até porque, naquela formulação, é irrelevante para a decisão da causa.
2.3. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte: «A mãe do 2º R. (Vera Lúcia) em 2017 estava
em condições cognitivas para assegurar a direcção técnica de uma clínica em que
o seu filho, aqui 2º R., era gerente da sociedade que explorava a clínica e
recebia o competente ordenado, sempre “às cavalitas” da mãe claro.»
Para fundamentar esta
pretensão, o recorrente invoca o teor dos artigos 67.º a 75.º da contestação
apresentada pelo recorrido Carlos Gomes e seu cônjuge noutro processo e,
genericamente, os «documentos (emitidos
pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa) constantes da Certidão junta
pelos Réus, datada de 22/12/2021 (emitida pelo Juízo Local Cível Lisboa, Juiz
2) e junta a estes autos com a Contestação/Reconvenção dos R.R.R./Reconvintes.»
O conteúdo de um articulado
apresentado num processo judicial não tem qualquer valor probatório, antes
carecendo de prova. Logo, a invocação do teor dos artigos 67.º a 75.º daquela
contestação como meio de prova não faz sentido.
Relativamente aos documentos
que refere (em bloco), o recorrente não justifica, pura e simplesmente, por que
razão considera que dos mesmos resultam os factos que pretende ver levados à
matéria provada. Não divisamos a relevância que tais documentos possam ter para
a prova destes factos.
Diga-se, por último, que
seria desejável um mínimo de rigor na formulação da matéria de facto que se
pretende ver inserida no respectivo enunciado pelo tribunal ad quem. Pretender que seja julgado
provado que o «aqui 2º R., era gerente da
sociedade que explorava a clínica e recebia o competente ordenado, sempre “às
cavalitas” da mãe claro» não constitui uma forma admissível de litigar em
tribunal.
2.4. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte:
- «O
A. é arrendatário não só da totalidade da parte do Prédio Rústico designado por
“Tapada” que coube ao aqui 1º R. (e sua mulher, Vera Lúcia), decorrente de
processo de Inventário / Partilhas; mas também arrendatário da totalidade da
parte do susodito Prédio Rústico que coube aos sobrinhos do 1º R., e que estes
são proprietários, decorrente do sobredito processo de Inventário / Partilhas.
Não há marcos no Prédio Rústico em questão a delimitar os pontos de estrema de
cada uma das susoditas partes.»
- «Em
suma: não há nem um centímetro de área que pertença ao aqui 1º R. (e mulher, Carmen
Gomes), relativo ao Prédio Rústico designado por “Boavista”, que não seja
objecto do contrato de arrendamento Docs. 1 e 2 juntos com a P.I.. Aliás,»
- «Ao
longo destes anos todos, desde 2010 a esta parte, nunca ninguém pôs em causa
que o A. é arrendatário da totalidade da parte que coube ao 1º R. (e mulher Carmen
Gomes) decorrente do processo de Inventário/Partilhas supra referido. Donde, …»
A questão que se suscita
relativamente a esta pretensão do recorrente é a da utilidade da matéria que
ele pretende ver aditada ao enunciado dos factos provados para a decisão do
recurso. O recorrente nada diz a este respeito. Pela nossa parte, não vemos
qual possa ser.
Tratando-se de matéria
irrelevante para a decisão do recurso, a apreciação crítica da prova sobre ela
produzida traduz-se na prática de um acto inútil, proibido pelo artigo 130.º do
CPC, que consagra o princípio da limitação dos actos.
Ainda assim, diga-se que o
único meio de prova invocado pelo recorrente, que é um curto excerto do
depoimento da testemunha Graça Maria, nunca permitiria concluir, com o grau de
segurança necessária para a formulação de um juízo de prova, que a matéria em
questão corresponda à realidade.
2.5. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte: «A Adenda ao Contrato de Arrendamento Florestal
realizada em 20/Maio/2015 entre o aqui A. Mário Branco e o R. Carlos Gomes e
sua mulher, Carmen Gomes, corresponde e sempre correspondeu à vontade real e
efectiva dos Outorgantes de tal documento.»
Afirma o recorrente que tal
facto «decorre do depoimento/confissão do
próprio Réu Bruno Gomes, Depoimento de Bruno Gomes, as suas declarações
encontram-se gravados no sistema Citius, entre as 16:42 e as 17:30 horas de
05/07/2022.»
Como referimos em 2.2,
aquela alegada confissão não consta da acta da sessão da audiência final em que
o depoimento de parte do recorrido Bruno Gomes foi prestado. Pelo contrário,
consignou-se nessa acta que, daquele depoimento, «não resultou matéria confessória». Por outro lado, o recorrente
não indica, com exactidão, as passagens da gravação daquele depoimento em que
se funda a sua pretensão. Em vez disso, indica, em bloco, 48 minutos da
gravação. Incumpriu, assim, o ónus estabelecido no artigo 640.º, n.º 2, do
CPC.
2.6. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte:
- «A
parte dos Réus é constituída maioritariamente por solos inférteis e com pedras
gigantes, sendo um solo maioritariamente pedroso e de difícil acesso para
maquinaria e para se trabalhar. Acresce ainda que,»
- «No
tipo de Contratos e exploração em questão (Contratos de arrendamento florestal)
a substância dos mesmos e decorrentes rendimentos (de exploração), advém, no
essencial, e em substância, da quantidade e qualidade da área ocupada pela
exploração (e corte) de eucaliptos e decorrentes rendimentos obtidos aquando da
sua “colheita” / corte, para venda às Fábricas processadoras de madeiras. Ora,»
- «“In
casu” a propriedade do(s) Réu(s) produz (em cerca de dez anos) a quantidade de
cerca de 3.000 metros cúbicos de madeira de Eucalipto. Porém,»
- «Já
a propriedade(s) dos demais comproprietários (referidos em art.º 14º da
peça/Articulado superveniente dos Réus) produz (em cerca de dez anos) a
quantidade de cerca de 13.000 metros cúbicos de madeira de Eucalipto. Aliás,»
- «A
área ocupada pela exploração de Eucaliptos na parte da propriedade do(s)
comproprietários (referidos no art.º 14º da peça/ Articulado superveniente dos
Réus) é de cerca de 140ha. Porém, já no que diz respeito à parte dos Réus a
área ocupada pela exploração de Eucaliptos é de cerca de 30ha. Donde,»
- «Óbvio
é que se o A. paga de renda anual Euros: 5.000,00, na propriedade do(s) Réu(s)
e Euros: 20.000,00, anuais, na propriedade dos demais comproprietários
(referidos no art.º 14º da peça/ Articulado superveniente dos Réus), e, uma vez
que o rendimento obtido nesta (decorrente da exploração florestal de Eucaliptos)
é cerca de 4,5 vezes maior do que naquela (na propriedade do(s) Réu(s)), óbvio
é que, a renda anual da propriedade do(s) Réu(s) (Euros: 5.000,00) é mais cara
(proporcionalmente) do que da propriedade dos demais comproprietários (Euros:
20.000,00 anuais), uma vez que esta apesar de ter renda de Euros: 20.000,00
anuais produz cerca de 4,5 vezes mais de madeira de Eucalipto (em cerca de 10
anos) do que a propriedade do(s) Réu(s) (em cerca de 10 anos).»
Suscita-se a questão da
utilidade desta matéria para a decisão do recurso. Noutros termos: se esta
matéria fosse introduzida no enunciado dos factos provados, em que medida
constituiria fundamento para alterar a sentença recorrida? Em vão procuraremos
resposta para esta questão nas alegações de recurso. Neste, como noutros
pontos, o recorrente parece querer que o tribunal ad quem introduza longos excertos dos seus articulados, tal qual os
redigiu, no enunciado da matéria de facto provada, só porque sim. Não pode ser.
O recurso da decisão sobre a matéria de facto destina-se a corrigir concretos
erros de julgamento desta que tenham influído na decisão da causa em prejuízo
do recorrente. Ou seja, destina-se a corrigir na medida em que tal produza
determinado efeito útil. Só em tal hipótese deverá o tribunal ad quem desenvolver a actividade
necessária ao conhecimento desse alegado erro de julgamento. O processo serve
para atingir determinadas finalidades práticas e não para servir de arena para
disputas inconsequentes. De novo lembramos o princípio da limitação dos actos,
consagrado no artigo 130.º do CPC.
Se, com a introdução da
matéria em causa no enunciado dos factos provados, o recorrente pretende
demonstrar a razoabilidade da renda anual de € 5.000, estipulada na «Adenda a Contrato de Arrendamento
Florestal» de 20.05.2015, e que essa alteração contratual teve uma
justificação racional, diremos que tal pretensão é irrealista. A comparação que
sempre foi feita ao longo do processo é entre a renda estipulada no contrato
celebrado em 01.12.2010 (€ 17.143/ano) e aquela que o foi na adenda de
20.05.2015 (€ 5.000/ano). E é essa comparação que faz sentido fazer-se, pois
trata-se de valores estipulados entre as mesmas partes e respeitantes ao mesmo
prédio. A comparação com a renda paga pelo recorrente pela exploração de um
prédio distinto, pertencente a outras pessoas, nada demonstra com interesse
para o juízo a fazer sobre a racionalidade de uma redução da renda de €
17.143/ano para € 5.000,00/ano.
Por tudo isto, a matéria em
causa não deverá ser acrescentada ao enunciado dos factos provados.
2.7. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte: «O A. sabe que os Pais dos Réus Bruno e Pedro,
o aqui 1.º R. Carlos e sua mulher, Carmen, na Acção que aqueles moveram contra
estes (Proc. n.º 35814/15.8T8LSB); estes disseram na sua Contestação (em
18/05/2016):
-
“Art.º 71º: Estranha-se que os Requerentes venham invocar a incapacidade da
Requerida quando esta só renunciou à gerência muito recentemente.”
-
“Art.º 72º: Contudo, a Requerida continua como Directora Técnica da Clínica.”
-
“Art.º 73º: Estranha-se também que o Requerente Bruno tenha como Directora
Técnica da Clínica que gere, alguém que diz ser incapaz de gerir a sua pessoa e
os seus bens.”
-
“Art.º 74º: Estranha-se ainda que os filhos só venham pedir agora a
inabilitação dos pais, quando, segundo eles, já estavam incapazes em 2013.”
-
“Art.º 75º: Os Requeridos não necessitam de mais uma empregada, nem necessitam
dos filhos para gerir as suas vidas ou os seus bens.”
-
“Art.º 76º: A presente acção resulta do facto dos Requerentes pretenderem
apoderar-se do património dos pais.”
-
“Art.º 77º: Os Requerentes com a presente acção não visam qualquer preocupação
com o modo de vida dos pais, ora Requeridos.”
-
“Art.º 78º: Os Requerentes visam tão só apoderar-se do dinheiro e dos bens dos
pais e colocaram-nos numa Casa de Repouso de qualidade duvidosa.”
-
“Art.º 79º: Os Requeridos estão em condições de negociar, concluir ou executar
quaisquer Contratos.”
-
“Art.º 80º: Os Requeridos sempre geriram com critério e ponderação as suas
contas bancárias.”
-
“Art.º 81º: Caso não gerissem criteriosamente as contas, já não tinham dinheiro
na sua conta.”
-
“Art.º 82º: Os Requerentes invocam alguns factos abstratos e sem especificar
casos concretos porque não existem situações que justifiquem o pedido da
presente acção.”
-
“Art.º 83º: Os Requerentes alegam situações abstratas com o único intuito,
repete-se, de se apoderarem do dinheiro e dos bens dos Requeridos.”
-
“Art.º 50º: A Requerida continua a conduzir, mas jamais o faz embriagada.”
-
“Art.º 48º: A Requerida apenas facultou o cartão multibanco à sua empregada,
pessoa de total confiança, por uma vez, para lhe comprar bens alimentares.”
-
“Art.º 51º: Se a Requerida conduzisse embriagada, já tinha sido apanhada pela
Polícia ou já tinha provocado acidentes, ou seja, mais uma mentira dos
Requerentes.”
-
“Art.º 66º: Os Requeridos estão a ponderar vender o terreno florestal que
arrendaram ao arrendatário.”
-
“Art.º 67º: Nunca ninguém se aproveitou dos Requeridos nem estes deixavam.”
-
“Art.º 68º: A requerida foi sempre gerente da Clínica Médica.” (Vidé Certidão
de fls. dos autos emitida em 22/12/2021, Proc. n.º 35814/15.8T8LSB, juízo Local
Cível de Lisboa, Juiz 2).»
Para sustentar esta
pretensão, o recorrente limita-se a afirmar o seguinte: «A matéria carreada no artº 21º da supra identificada RESPOSTA (acima
transcrita) (Refª Citius: 41351110) de 16/02/2022, deveria ter sido dada por
provada “In Totum” (e não foi), uma vez que corresponde, “Ipsis Verbi”, ao
conteúdo da Contestação apresentada pelo R. Carlos e mulher, Carmen no âmbito
do Proc. n.º 35814/15.8T8LSB, cuja Certidão emitida em 22/12/2021 está junta
aos autos.»
Mais uma vez, nem uma
palavra acerca da utilidade da inserção da referida matéria no enunciado dos
factos provados. Em que medida o facto de o recorrido Carlos Gomes e o seu
cônjuge terem alegado a matéria acima descrita na contestação que apresentaram
noutro processo poderia influir na decisão do recurso? As alegações de recurso
não respondem a esta questão. Pela nossa parte, não divisamos qualquer
utilidade na referida inserção. Mais, esta seria, a todos os títulos,
descabida.
2.8. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte: «Os R.R. Bruno e Pedro pelos vistos
preocupavam-se muito com as rendas que os seus pais recebiam e com os Contratos
que faziam. Porém, nunca se preocuparam com o facto de os seus pais nunca terem
declarado à Autoridade Tributária/ Fisco os montantes que recebiam de rendas
(neste sentido vidé informação de fls. dada pela Autoridade Tributária/ Serviço
de Finanças de Nisa, que informa que, o Réu Carlos não apresentou declaração de
rendimentos que recebia de rendas relativo aos anos de 2010; 2011; 2012; 2013;
2014; 2015 e 2016).»
O recorrente afirma que esta
matéria devia ter sido julgada provada porque «corresponde à informação dada nos autos pela Autoridade Tributária/
Serviço de Finanças de Nisa, decorrente de notificação de que foi objecto por
parte do Tribunal para o sobredito efeito.»
Esta pretensão do recorrente
merece apenas duas observações.
Por um lado, não estamos
perante uma alegação de factos propriamente dita, mas sim perante um comentário,
em tom jocoso, feito pelo recorrente num articulado, que não tem lugar numa
decisão sobre matéria de facto, seja como facto provado, seja como facto não
provado.
Por outro lado, a matéria de
facto mencionada nesse comentário (falta de apresentação de declaração dos
rendimentos provenientes das rendas à Autoridade Tributária) é irrelevante para
a decisão do recurso, pelo que não tem lugar no enunciado dos factos provados.
2.9. O recorrente pretende
que seja aditado, ao enunciado dos factos provados, o seguinte:
-
«Resulta também do Depoimento da Testemunha Natália Silva que a mesma
representou o casal Gomes – Carlos aqui R. e mulher, Carmen – em processos
Judiciais até ao ano 2019, tendo os mesmos passado para o efeito Procuração a
seu favor sem nunca ninguém ter posto em causa a sua falta de legitimidade por
os mandantes não terem lucidez e/ou estarem bêbados quando emitiram Procuração
a favor da Advogada Dra. Natália Silva para intervir nos processos Judiciais,
acrescentando a referida Testemunha que tinha autoridade sob os seus clientes (Carlos
e Carmen) senão não os patrocinava. Mais afirmou a referida Testemunha que não
deixava entrar os seus clientes (Carlos e Carmen) nas Audiências (marcadas nos
Processos) e que confrontou o aqui R. Carlos Gomes com a alteração ao Contrato (Adenda
Doc. 2 junto com a P.I.) e este lhe disse: “estar muito melhor”. “É tudo muito
melhor”. Mais afirmou a referida Testemunha que procedeu à realização do
Contrato de 2010 (Doc. 1 junto com a P.I.) mas: … “a parte do Senhor Carlos
Gomes, com supervisão do filho Bruno embora os Pais não se apercebessem muito
disso”. E que: …“não fosse o Bruno nunca me pagaram porque não lhes passava pela
cabeça pagarem.me, não era por mal, não pagavam às Finanças, não pagavam à
Empregada, oh Senhor Doutor se não fosse o Bruno, se não fosse o Bruno era um
descalabro autêntico… Quem me pagou foi sempre o Bruno”. Disse ainda a referida
Testemunha Natália Silva (interrogada pelo M. Juiz) que: “M.J.: Estes dois
últimos Senhores (R.R. Bruno e Pedro) foram seus clientes? Natália Silva: “Não
Senhor Doutor, só o Carlos e a falecida esposa é que foram”. Depoimento de Natália
Silva gravado em 13/05/2022 no sistema Citius entre as 14:36 horas e as 16:03
horas.»
-
«Dos presentes autos resulta a fls. que a Notificação Judicial Avulsa (Doc. 4
junto com a P.I.) foi subscrita pela Sra. Advogada Natália Silva no dia
10/07/2020; Notificação Judicial Avulsa esta que despoletou os presentes autos
e em que a Sra. Advogada supra identificada foi mandatada pelo aqui R. Bruno
para o sobredito efeito.»
- «Da
sobredita Notificação Judicial Avulsa (Doc. 4 junto com a P.I.) não consta em
parte alguma, nem se faz menção por qualquer forma e/ou meio da Adenda (Doc. 2
junto com a P.I.) realizada em 20/Maio/2015 entre Carlos Gomes, Carmen Gomes e Mário
Branco (aqui A.), e que estava e está em vigor e é válida. Tudo isto apesar de,»
- «Desde,
pelo menos, Julho/2015, os R.R. Bruno e Pedro saberem da sua existência (e
teor) e até de terem “discutido/ debatido” com a Testemunha Natália Silva da
existência da mesma, segundo o depoimento da própria Natália Silva. Porém,»
- «Nem
o R. Bruno, nem a subscritora da susodita Notificação Judicial Avulsa, (que deu
entrada em juízo em 10/07/2020) Dra. Natália Silva fizeram menção por qualquer
forma e/ou meio a tal Adenda (Doc. 2 junto com a P.I.), na Notificação Judicial
Avulsa que efectuaram (Doc. 4 junto com a P.I.). Bem sabendo que tal Adenda
estava e está em vigor e era e é válida e que nunca a “atacaram” por qualquer forma
e/ou meio, nomeadamente judicial, até à data de 28/05/2021 (quando apresentaram
a sua Contestação/ Reconvenção).»
- «Tal
comportamento processual por parte dos Réus consubstância manifesta má-fé.
Ademais,»
- «Estribando-se
na susodita Notificação Judicial Avulsa (Doc. 4 junto com a P.I.) os Réus
moveram contra o aqui A. as acções seguintes: A) Execução proc. n.º
1323/21.0T8PTG; B) Embargo Extrajudicial de Obra Nova/ Procedimento Cautelar
Apenso A do Proc. 82/20.9T8NIS.»
- «O
processo referido em A) supra apesar de já ter sido decretada a sua Extinção
está a ser objecto de Recurso e o A. continua a ter montantes penhorados nas
suas contas Bancárias; a sua casa está penhorada.»
- «As
acções referidas/ identificadas no art.º 12.º supra, causaram, na vida do A.,
transtornos enormes e avultados prejuízos, impossível, de momento, de
contabilizar, até porque como se disse atrás o A. Ainda tem as suas contas
Bancárias penhoradas (sabe-se lá por mais quanto tempo? Quid júris?) e a sua
casa penhorada, sendo certo que, os transtornos e prejuízos continuam a existir
e a causar prejuízos na vida do A. decorrentes das referidas acções judiciais.
Portanto, de momento, impossíveis de contabilizar, até porque os prejuízos
continuam.»
- «O
“Modus Operandi” dos Réus, acima descrito, além de consubstanciar manifesta
má-fé.»
- «Do
depoimento da Testemunha Natália Silva tendo esta dito que Representou/ foi
Mandatária Forense do Sr. Carlos Gomes e da mulher, Carmen até ao ano de 2019,
pelos vistos não houve qualquer problema sobre a validade da Procuração que
aqueles emitiram a seu favor. Aí já ninguém pôs em causa o estado de saúde e
lucidez do R. Carlos e sua mulher, Carmen. Ou seja, no entender da Testemunha e
uma vez que os representou até 2019 não houve qualquer obstáculo de falta de
lucidez ou bebedeira quando os referidos Carlos e Carmen emitiram Procurações a
seu favor e para os representar. Ademais,»
- «O
A. sabe que os Pais dos Réus Bruno e Pedro, o aqui 1.º R. Carlos e sua mulher, Carmen,
na Acção que aqueles moveram contra estes (Proc. n.º 35814/15.8T8LSB); estes
disseram na sua Contestação (em 18/05/2016):
-
“Art.º 71º: Estranha-se que os Requerentes venham invocar a incapacidade da
Requerida quando esta só renunciou à gerência muito recentemente.”
-
“Art.º 72º: Contudo, a Requerida continua como Directora Técnica da Clínica.”
-
“Art.º 73º: Estranha-se também que o Requerente Bruno tenha como Directora
Técnica da Clínica que gere, alguém que diz ser incapaz de gerir a sua pessoa e
os seus bens.”
-
“Art.º 74º: Estranha-se ainda que os filhos só venham pedir agora a
inabilitação dos pais, quando, segundo eles, já estavam incapazes em 2013.”
-
“Art.º 75º: Os Requeridos não necessitam de mais uma empregada, nem necessitam
dos filhos para gerir as suas vidas ou os seus bens.”
-
“Art.º 76º: A presente acção resulta do facto dos Requerentes pretenderem
apoderar-se do património dos pais.”
-
“Art.º 77º: Os Requerentes com a presente acção não visam qualquer preocupação
com o modo de vida dos pais, ora Requeridos.”
-
“Art.º 78º: Os Requerentes visam tão só apoderar-se do dinheiro e dos bens dos
pais e colocaram-nos numa Casa de Repouso de qualidade duvidosa.”
-
“Art.º 79º: Os Requeridos estão em condições de negociar, concluir ou executar
quaisquer Contratos.”
-
“Art.º 80º: Os Requeridos sempre geriram com critério e ponderação as suas
contas bancárias.”
-
“Art.º 81º: Caso não gerissem criteriosamente as contas, já não tinham dinheiro
na sua conta.”
-
“Art.º 82º: Os Requerentes invocam alguns factos abstratos e sem especificar
casos concretos porque não existem situações que justifiquem o pedido da
presente acção.”
-
“Art.º 83º: Os Requerentes alegam situações abstratas com o único intuito,
repete-se, de se apoderarem do dinheiro e dos bens dos Requeridos.”
-
“Art.º 50º: A Requerida continua a conduzir, mas jamais o faz embriagada.”
-
“Art.º 48º: A Requerida apenas facultou o cartão multibanco à sua empregada,
pessoa de total confiança, por uma vez, para lhe comprar bens alimentares.”
-
“Art.º 51º: Se a Requerida conduzisse embriagada, já tinha sido apanhada pela
Polícia ou já tinha provocado acidentes, ou seja, mais uma mentira dos
Requerentes.”
-
“Art.º 66º: Os Requeridos estão a ponderar vender o terreno florestal que
arrendaram ao arrendatário.”
-
“Art.º 67º: Nunca ninguém se aproveitou dos Requeridos nem estes deixavam.”
-
“Art.º 68º: A requerida foi sempre gerente da Clínica Médica.” (Vidé Certidão
de fls. dos autos emitida em 22/12/2021, Proc. n.º 35814/15.8T8LSB, juízo Local
Cível de Lisboa, Juiz 2).”»
De novo, o recorrente
pretende que o tribunal ad quem
introduza longos excertos dos seus articulados, tal qual os redigiu, no
enunciado da matéria de facto provada, independentemente da sua utilidade para
a decisão do recurso e de tais excertos conterem matéria de facto, matéria
conclusiva, matéria de direito, mera reprodução de depoimentos prestados ou
comentários da sua autoria.
Esta actuação do recorrente
não obedece ao disposto no artigo 640.º, n.º 1, al. c), do CPC. Para cumprir o
ónus estabelecido nesta norma, o recorrente teria de selecionar, de entre o
conteúdo da sua alegação, factos propriamente ditos, propondo a sua inserção na
matéria provada. Não basta transcrever parcialmente os seus articulados, nos
termos expostos, e manifestar a pretensão de tudo isso ser inserido no
enunciado dos factos provados, além do mais de forma tecnicamente inadmissível.
Note-se, por outro lado, que
a escassa matéria de facto constante dos excertos acima reproduzidos é
irrelevante para a decisão do recurso. Aliás, também aqui, o recorrente não se
deu ao trabalho de justificar em que medida tal matéria influiria nessa
decisão.
2.10. O recorrente pretende
que o conteúdo das alíneas a), b), c) e g) do enunciado dos factos não provados
seja julgado provado.
Está em causa a seguinte
matéria de facto:
a)
Por conta das facturas mencionadas em 20) o 1.º Réu e Carmen Gomes liquidaram €
841,50 (relativamente à factura n.º 77) e € 957,60 (respeitante à factura n.º
83).
b)
Perante os consecutivos e reiterados pedidos do autor, o 1.º réu e Carmen Gomes
invocaram dificuldades financeiras para não procederem ao pagamento atempado
dos montantes em débito no valor de € 29.985,00, relativos às facturas em
causa.
c)
O 1.º réu e Carmen Gomes acordaram com o autor que a dívida de € 29.985,00
seria liquidada através de amortizações parciais anuais sucessivas no valor de
€ 5.000,00 até integral e efectivo pagamento, sendo a primeira amortização a
realizar em 01.07.2017.
g)
A parcela de terreno identificada em 22) constitui uma área particularmente
valiosa para a agricultura pelo facto de o solo ser de maior qualidade e
fertilidade e ter muita água.
Para sustentar a sua
pretensão, o recorrente invoca:
- Relativamente à matéria constante das
als a), b) e c), os depoimentos das testemunhas Graça Maria e António Joaquim,
dos quais transcreveu os excertos que considerou relevantes; afirma ainda que
as facturas em causa contêm as assinaturas do recorrido Carlos Gomes e do
cônjuge deste e não foram impugnadas pelos recorridos;
- Relativamente à matéria constante da
al. g), o «Relatório de Avaliação do Potencial Produtivo da Herdade da Tapada»,
apresentado em 07/10/2022 (Refª Citius: 43483410).
O recorrente alegou a
matéria constante das als. a), b) e c) nos artigos 12.º a 22.º da petição
inicial. Os recorridos, por seu turno, impugnaram tal alegação nos artigos
133.º e 139.º a 145.º da contestação. Relativamente às facturas em questão,
afirmaram, no artigo 143.º, o seguinte: «Nem
se diga que as facturas que o Autor acabou por juntar após apresentação da Petição
Inicial como Documentos 5 e 6 demonstrariam fosse o que fosse: trata-se de documentos
elaborados e emitidos pelo próprio Autor, e cada um declara o que entende.»
Portanto, não corresponde à verdade que os recorridos não tenham impugnado a
alegação do recorrente sobre as facturas em causa.
Do facto de o recorrido Carlos
Gomes e o cônjuge deste terem, em data que se desconhece, aposto as suas
assinaturas nas facturas, sem qualquer outra declaração, não é legítimo inferir
que eles se assumiram como devedores das quantias nelas mencionadas. Para mais
tendo em conta os graves problemas mentais e de consumo excessivo de bebidas
alcoólicas que ambos apresentavam, com inevitável e notório reflexo no seu
comportamento. Problemas esses que o recorrente conhecia, até porque foi para
eles alertado, conforme se provou.
Do excerto do depoimento da
testemunha Graça Maria transcrito nas alegações de recurso não resulta que esta
tenha presenciado qualquer dos factos constantes das als. a), b) e c). Resulta,
sim, que apenas sabe aquilo que o recorrente lhe disse.
Relativamente ao depoimento
da testemunha António Joaquim, acompanhamos as reservas feitas pelo tribunal a quo à sua credibilidade. Ouvida a
gravação, ficámos com a convicção de que tal depoimento é falso, do princípio
ao fim, pelas seguintes razões:
- O recorrente reside em Tolosa, próximo
de Portalegre, e António Joaquim em Benfica do Ribatejo, pelo que o primeiro,
para ter a sua companhia até Lisboa, teria sido obrigado a fazer um
significativo desvio para passar por esta última localidade, quer à ida, quer à
vinda.
- O pretexto invocado para o facto de
ter acompanhado o recorrente à residência do recorrente Carlos Gomes e do
cônjuge deste em Lisboa, não é credível. Segundo António Joaquim, o recorrente
precisou da sua companhia para conduzir a viatura até Lisboa por não se sentir
à vontade a conduzir nesta cidade. Não especificou que tipo de dificuldade
teria o recorrente em conduzir dentro de Lisboa, ou seja, se se manifestava ao
nível da condução ou da orientação. Porém, qualquer delas é inverosímil.
Conforme António Joaquim referiu, o recorrente é um condutor habitual de
veículos pesados, pelo que dificilmente se imagina que tenha dificuldade em
conduzir um veículo ligeiro, ainda que dentro de Lisboa. Se o problema do
recorrente era orientar-se, tinha GPS, como António Joaquim referiu por duas
vezes.
- A alegada dificuldade do recorrente em
conduzir em Lisboa parece não ser permanente, porquanto, segundo António
Joaquim afirmou, tratou-se da única vez em que o acompanhou a Lisboa. A menos
que o recorrente quase nunca se desloque de automóvel a Lisboa ou vá pedindo a
companhia de uma multiplicidade de pessoas para esse efeito.
- António Joaquim referiu que o
recorrente nem sequer sabia se o recorrido Carlos Gomes e a sua esposa se
encontravam em casa. Daí, segundo ele, ter ficado à espera, dentro da viatura,
enquanto o recorrente ia ver se estava alguém em casa. Ora, não é crível que o
recorrente se deslocasse, de propósito, a Lisboa, com passagem por Benfica do
Ribatejo para levar quem pudesse conduzir o veículo dentro desta cidade, com a
finalidade de falar com pessoas que nem sequer sabia se iria encontrar.
- Não é normal, à luz das regras da
experiência comum e da própria cortesia, aparecer, sem pré-aviso, em casa de
pessoas com quem não se tem uma relação próxima, às 10.30 horas da manhã. Para
mais, acompanhado por um estranho, que nem sequer depois da suposta ida a casa
do recorrido Carlos Gomes e esposa ficou a saber os nomes destes. Pior ainda,
para interpelar os donos da casa no sentido de lhe pagarem uma suposta dívida.
E, depois, ficar a almoçar com estes.
- Segundo António Joaquim, a casa do
recorrido Carlos Gomes e sua esposa não apresentava qualquer problema ao nível
da higiene, estando apenas, eventualmente, um pouco desarrumada. Ora, a
restante prova contraria frontalmente esta descrição. A falta de higiene
daquela casa era dramática. Atentemos no relatório da Santa Casa da
Misericórdia de Lisboa transcrito no n.º 58 da matéria de facto provada,
elaborado na sequência de uma visita àquela casa na época da suposta visita do
recorrente e de António Joaquim: «falta
de condições de higiene e segurança (odor nauseabundo; baratas espalhadas pela
casa; sofá com nódoas de fezes; quarto com mesa de cabeceira de madeira repleta
de beatas), entre outros aspectos que condicionam a qualidade de vida e a saúde
destes idosos.» António Joaquim não se apercebeu disto, não obstante,
segundo afirmou, ter sido recebido na sala? Ou nunca esteve nesta casa?
Contrapõe o recorrente, nas suas alegações, que a ausência de deficiências
aparentes ao nível da higiene da casa é explicável pela presença da empregada
doméstica, que teria, obviamente, estado a fazer limpezas e não «a jogar dominó» ou «a jogar damas com os patrões». Acreditamos que a empregada do
recorrido Carlos Gomes e da esposa deste tenha estado a fazer limpezas, mas não
que, às 10.30 horas de uma manhã aparentemente igual a tantas outras
(recordemos que a visita do recorrente e de António Joaquim não foi anunciada),
já tivesse conseguido pôr uma casa com um odor nauseabundo, com baratas e com
um sofá com nódoas de fezes, no estado em que António Joaquim a descreveu.
Mais, segundo António Joaquim, o recorrente esteve sentado no sofá da sala ao
longo da conversa que descreveu, tendo-se ele instalado numa cadeira próxima.
Ninguém sentiu um cheiro, no mínimo, anormal? Não é possível. Só pode
concluir-se que António Joaquim nunca esteve na casa do recorrido Carlos Gomes
e da esposa.
- Estranha-se a tão prodigiosa quanto
selectiva memória de António Joaquim. Disse, em 13.05.2022, recordar-se
perfeitamente de que a suposta ida à residência do recorrido Carlos Gomes e da
esposa em Lisboa ocorrera em Janeiro ou Fevereiro de 2017. Descreveu
pormenorizadamente a suposta conversa entre os donos da casa e o recorrente
sobre o pagamento das despesas relativas à limpeza do prédio, nomeadamente o
que eles teriam acordado sobre a forma como tal pagamento seria feito:
compensação com o valor das rendas, cujo montante anual conseguiu especificar (€
5.000). Disse recordar-se da conversa sobre as facturas emitidas pelo
recorrente, nomeadamente que o recorrido Carlos Gomes concordava com os valores
nelas mencionados. A certa altura do seu depoimento, afirmou que lhe pareceu
que o recorrente e os donos da casa estavam a negociar a compra e venda do
prédio. Instado a fornecer pormenores sobre essa conversa, António Joaquim
escusou-se a responder, alegando que não estava com atenção, pois o negócio não
era seu. Nesta ordem de ideias, não se percebe o que levou António Joaquim a estar
tão atento à suposta conversa sobre o pagamento das despesas relativas à
limpeza do prédio, já que também não era assunto seu. Foi patente o contraste
entre a memória de António Joaquim sobre uma e outra conversas, apesar de as
mesmas terem tido lugar mais ou menos em simultâneo, como frisou quando lhe foi
perguntado quanto tempo aquela que versou sobre o pagamento das despesas
relativas à limpeza do prédio teria durado.
Por tudo isto, o tribunal a quo andou bem ao desconsiderar o
depoimento da testemunha António Joaquim. A qual, note-se, nada disse sobre os
factos referidos nas als. a) e b).
Finalmente, acompanhamos a
observação feita pelos recorridos no artigo 140.º da contestação: o recorrente
nada de concreto alega acerca da celebração do suposto acordo de divisão de
despesas com a limpeza do prédio, meramente prevista na cláusula 7.ª da «Adenda a Contrato de Arrendamento
Florestal» celebrada em 20.05.2015. Onde, quando e por que forma foi
celebrado? Qual foi a proporção acordada? Não se compreende esta lacuna da
alegação do recorrente, a qual torna ainda mais difícil acreditar que aquele
suposto acordo tenha existido.
A matéria constante da al.
g) não tem qualquer relevância para a decisão do recurso. Relevância essa que o
recorrente, mais uma vez, não diz qual seja. Mais, trata-se de um facto alegado
pelos recorridos (artigo 21.º da contestação) que, a ter alguma relevância,
seria em benefício destes. Daí que, também em relação a ele, não possa o
tribunal ad quem reapreciar a prova,
sob pena de violação do artigo 130.º do CPC.
2.11. Segundo o recorrente, «A matéria referida em 58. Dos factos
provados deve ser retirada dos factos provados uma vez que o Tribunal “a quo”
“subtraiu” a informação relativa à Sra. Carmen Gomes, mulher do Réu Carlos
Gomes, também ela subscritora do Contrato e Adenda “sub judice”.»
O n.º 58 do enunciado dos
factos provados tem a seguinte redacção:
«Na
sequência do determinado pelo Ministério Público em sede do processo n.º
257/17.8PVLSB, que correu termos na 7.ª secção do DIAP, a Santa Casa da
Misericórdia de Lisboa elaborou um relatório, datado de 23 de Junho de 2017,
referente à situação do 1.º réu e de Carmen Gomes, do qual consta o seguinte:
No
dia 26 de Maio, a EAI regressou ao local, com o apoio da Polícia de
Proximidade, da 21.ª Esquadra, pertencente a Campolide. Foi possível observar a
falta de higiene na casa, bem como o estado físico e psicológico actual da Sra.
Carmen Gomes e do marido, o Sr. Carlos Gomes. Esta visita foi efectuada no
período da manhã, em que já era visível o estado de embriaguez em que se
encontrava o Sr. Carlos, bem como os hábitos de consumo excessivos, sobretudo
tabágicos, por parte da Sra. Carmen. (…)
Foi
a Cuidadora Luísa que descreveu as rotinas deste casal e que têm contribuído
para o agravamento do seu estado de saúde física e mental, colocando não em
risco o seu bem-estar, mas também o bem-estar dos outros.
Das
situações descritas pela Sra. Luísa, salientamos as seguintes: o consumo
excessivo de álcool, por parte dos dois idosos, tendo a EAI observado a
quantidade de álcool existente na casa, em detrimento de outros produtos
essenciais, como os alimentares; os hábitos tabágicos, sobretudo por parte da
Sra. Carmen, que colocam em risco a sua saúde, uma vez que a mesma já apresenta
graves problemas de saúde; a administração de bebidas alcoólicas com
medicamentos; a administração de medicamentos, sem controlo externo, sendo a
Sra. Carmen que prescreve as receitas médicas a si própria e ao marido,
derivado do facto de a mesma ter sido Médica e de manter ainda a respectiva
cédula profissional; a falta de condições de higiene e segurança (odor
nauseabundo; baratas espalhadas pela casa; sofá com nódoas de fezes; quarto com
mesa de cabeceira de madeira repleta de beatas), entre outros aspectos que
condicionam a qualidade de vida e a saúde destes idosos.»
Aparentemente, o recorrente
insurge-se contra a não transcrição de uma parte do relatório respeitante à
falecida esposa do recorrido Carlos Gomes.
O recorrente não esclarece
em que medida a parte do relatório não transcrita pelo tribunal a quo seria útil para a decisão da
causa, pelo que não é possível concluir que a sua inclusão no n.º 58 seja
necessária.
Acresce que não é a
ampliação da matéria constante do n.º 58 que o recorrente pretende, mas
precisamente o oposto: a eliminação deste número. Isto não faz sentido. Se a
matéria constante do n.º 58 fosse insuficiente, deveria ser ampliada, por forma
a ficar completa. Não eliminada, aumentando assim a hipotética insuficiência da
matéria de facto sobre as condições em que o recorrido Carlos Gomes e a esposa
viviam.
Daí que, por um lado, aquela
ampliação não deva ter lugar e, por outro, esta eliminação careça de
fundamento.
2.12. Concluindo, a decisão
tomada pelo tribunal a quo sobre a
matéria de facto deverá manter-se na íntegra.
3 – Tempestividade e
fundamento da arguição da invalidade da adenda ao contrato de arrendamento
celebrada em 20.05.2015:
Os recorridos pediram a
anulação da “Adenda a Contrato de
Arrendamento Florestal”, celebrada em 20.05.2015, com a seguinte fundamentação:
- Por sentença proferida em 20.11.2019,
transitada em julgado, o recorrido Carlos Gomes foi declarado maior
acompanhado, em regime de representação geral pelo seu acompanhante, com início
da respectiva incapacidade em data não apurada de 2012/2013, momento do
agravamento do seu estado de saúde;
- Foi nomeado acompanhante o recorrido Bruno
Gomes, seu filho; como acompanhante substituto, foi nomeado o recorrido Pedro
Gomes, também filho do recorrido Carlos Gomes;
- Foi declarado, nessa sentença, que o
recorrido Carlos Gomes carece de capacidade e idoneidade para reger a sua
pessoa e os seus bens, bem como para exercer os seus direitos e cumprir os seus
deveres de forma plena, pessoal e consciente; essa incapacidade verifica-se, pelo
menos, desde o ano de 2013;
- O recorrido Carlos Gomes carecia de
capacidade para compreender o sentido da declaração negocial, por si emitida,
que esteve na origem da adenda, bem como das consequências desta, ruinosas para
si;
- O recorrente conhecia a incapacidade
do recorrido Carlos Gomes, incapacidade essa notória;
- Pelo que a adenda é anulável, nos
termos do artigo 257º, aplicável ex vi
artigo 154.º, n.º 3, do CC;
- O recorrido Bruno Gomes tomou
conhecimento, primeiro da celebração da adenda e só posteriormente do seu teor;
- A invocação da anulabilidade da adenda
é tempestiva, nos termos do artigo 287.º do CC, porque, por um lado, o vício
que lhe serve de fundamento (incapacidade do recorrido Carlos Gomes) mantém-se,
e, por outro, o negócio não se encontra ainda cumprido.
Na réplica, o recorrente,
além de impugnar a alegação de que o recorrido Carlos Gomes se encontrava
incapacitado aquando da celebração da adenda, defendeu-se nos seguintes termos:
«23.º
Disso
têm inteiro e perfeito conhecimento os aqui 2º e 3º R.R. que, desde 20/Maio/2015
sabem que o que está em vigor é o Contrato Doc. 1 junto com a P.I. com a Adenda
Doc. 2 junto com a P.I., realizada em 20/Maio/2015 e não qualquer outro tipo de
contrato e/ou documento. Com efeito,
24.º
Apesar
se saberem tal nunca interpuseram qualquer acção contra o Autor, a pôr em crise
a supra identificada Adenda de 20/maio/2015, nem qualquer outra coisa. Donde,
jamais o poderão fazer agora, por caducidade/prescrição do Direito, o que se
argui/invoca para todos os efeitos legais dai decorrentes.»
Na sentença recorrida, esta pretensa
excepção, que o recorrente denominou como «caducidade/prescrição»,
foi julgada improcedente, com fundamentação que assim se sintetiza:
- Foi decidido, na audiência prévia, sem
que o recorrente tenha reclamado, que a matéria em questão não integra o
objecto do litígio; na base dessa decisão está o entendimento de que, de acordo
com os artigos 572.º e 573.º do CPC, compete ao réu deduzir toda a defesa na
contestação, expondo os factos essenciais em que se baseiam as excepções
deduzidas; se é incontroverso que o tribunal não se encontra adstrito às
alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das
regras de direito, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º do CPC, também o é que às
partes cabe alegar os factos essenciais em que se baseiam as excepções (n.º 1
do mesmo artigo), sob pena de violação do princípio do dispositivo;
- O recorrente nem sequer individualizou
o instituto jurídico de cujo regime pretende beneficiar, limitando-se a
invocar, genericamente, a «caducidade/
prescrição», com o que impediu o exercício do contraditório pelos
recorridos;
- A prescrição e a caducidade, esta
última desde que estabelecida em tema excluído da disponibilidade das partes,
não são de conhecimento oficioso;
- Em todo o caso, o artigo 287.º, n.º 1,
do C.C., estabelece que só têm legitimidade para arguir a anulabilidade as
pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, e só dentro do ano subsequente à
cessação do vício que lhe serve de fundamento; contudo, se o negócio não
estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência do prazo,
tanto por via de acção como por via da excepção, nos termos do n.º 2 do mesmo
artigo;
- Ora, por um lado, a incapacidade do
recorrido Carlos Gomes persistia à data da propositura da acção; por outro,
sendo o arrendamento um contrato de execução continuada ou periódica, cujo
cumprimento se prolonga no tempo, é aplicável o n.º 2 do artigo 287.º.
Nas alegações de recurso, o
recorrente desenvolve a seguinte argumentação:
- Está provado que o recorrido Bruno
Gomes teve conhecimento da adenda em Julho de 2015 e nada fez até requerer a
notificação judicial avulsa, em 03.09.2020;
- Nos termos do n.º 1 do artigo 1085.º
do CC, a resolução do contrato de arrendamento deve ser efectivada dentro do
prazo 1 ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento, sob
pena de caducidade;
- No artigo 24.º da réplica, o
recorrente invocou a caducidade;
- Após mais de 5 anos de terem tido
conhecimento da adenda, os recorridos não a impugnaram judicialmente, pelo que caducou
o direito de o fazerem;
- A adenda não é um novo contrato, pelo
que o direito à sua resolução e anulação caducara há muito, nos termos do
artigo 1085.º, n.º 1, do CC;
- O tribunal a quo «olvidou-se» de dar por provado que o recorrido Carlos Gomes
e sua esposa outorgaram escrituras públicas de compra e venda, perante notário,
e que ninguém pôs esses negócios em crise;
- A gestão que a esposa do recorrido Carlos
Gomes fazia das suas contas bancárias e investimentos também nunca foi posta em
causa;
- Só a adenda, celebrada em 20.05.2015, foi
posta em causa e anulada, sem que conste da matéria de facto provada que,
aquando da sua celebração, o recorrido Carlos Gomes e a esposa não estivessem
na plenitude das suas capacidades cognitivas e de entendimento.
O recorrente não tem razão,
seja a que título for.
Desde logo, o recorrente não
invocou devidamente a excepção de caducidade do direito de arguir a
anulabilidade da adenda. Não especificou, sequer, se pretendia arguir a
caducidade ou a prescrição, que são institutos jurídicos diversos. Daí que, em
rigor, nem sequer se possa conhecer da questão da caducidade daquele direito.
Tem, a este propósito, total pertinência a observação, feita pelo tribunal a quo, de que, a admitir-se uma arguição
da caducidade nos termos em que o recorrente o fez, ficaria prejudicado o
exercício do contraditório pelos recorridos.
Ainda que se considerasse
que a caducidade do direito de arguir a anulabilidade da adenda foi devidamente
invocada, o recorrente não teria razão.
Desde logo, o recorrente
deturpa os factos. Como vimos em 2.1, o facto de se encontrar provado que o
recorrente Bruno Gomes tomou conhecimento da subscrição da adenda não equivale
a ele conhecer o conteúdo desta.
O recorrente também não é
rigoroso na invocação das normas jurídicas aplicáveis, confundindo a caducidade
do direito de invocar a anulabilidade da adenda (artigo 287.º, n.º 1, do CC),
com a caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento (artigo
1085.º, n.º 1, do CC).
Ao contrário do que o
recorrente sustenta, a adenda constitui um novo contrato, que apenas tem a
particularidade de, em vez de estabelecer uma relação contratual nova, alterar
uma relação contratual pré-existente. Trata-se de um contrato modificativo de
um contrato anterior (cfr. artigo 406.º, n.º 1, do CC). Seja como for, não
vemos que interesse isto possa ter para a discussão da questão da caducidade do
direito de arguir a anulabilidade da adenda.
Independentemente da data em
que cada um dos recorridos teve conhecimento do conteúdo – e não, meramente, da
existência – da adenda, é certo que, por um lado, persiste o vício determinante
da anulabilidade (incapacidade do recorrido Carlos Gomes) e, por outro, o
contrato de arrendamento tem natureza duradoura, tendo sido executado até à
data da propositura da acção. Daí que, nos termos do artigo 287.º do CC, não
tenha ocorrido a caducidade do direito de arguir a anulabilidade da adenda.
A argumentação do recorrente
relativa ao fundamento da anulação da adenda também não procede.
Sobre a outorga, pelo
recorrido Carlos Gomes e sua esposa, de duas escrituras públicas de compra e
venda, e a irrelevância desse facto para a avaliação da capacidade daqueles,
pronunciámo-nos em 2.2. Nada temos a acrescentar.
Não ficou provada a prática,
pela falecida esposa do recorrido Carlos Gomes, de qualquer acto de gestão das
contas bancárias e os investimentos de que era titular, pelo que o argumento de
que essa hipotética gestão nunca foi posta em causa é destituído de valor.
Quanto a não ter ficado
provado que, aquando da celebração da adenda, em 20.05.2015, o recorrido Carlos
Gomes e a esposa não estivessem na plenitude das suas capacidades cognitivas e
de entendimento, a falta de razão do recorrente é manifesta. Aquilo que resulta
do enunciado da matéria de facto provada é precisamente o contrário. Desde
momento anterior ao da celebração da adenda, eram evidentes para todos,
nomeadamente para o próprio recorrente, os problemas mentais, agravados pelo
consumo excessivo de bebidas alcoólicas, quer do recorrido Carlos Gomes, quer
da esposa deste. Eles não tinham capacidade, sequer, para assegurarem os
cuidados básicos a si próprios, nomeadamente ao nível da sua higiene pessoal e
da sua habitação, ao ponto de ter sido necessária a intervenção da Santa Casa
da Misericórdia de Lisboa, cujos técnicos se depararam com uma situação
deplorável ao nível da salubridade da referida habitação.
Por outro lado, o recorrente
parece esquecer que, «por sentença de 20
de Novembro de 2019, proferida pelo Juízo Local Cível de Lisboa – Juiz 2, no
âmbito do processo n.º 35814/15.8T8LSB, transitada em julgado, o 1.º réu foi
declarado maior acompanhado, em regime de representação geral pelo seu
acompanhante, com início da respectiva incapacidade em data não apurada de
2012/2013, momento do agravamento do seu estado de saúde.» (n.º 23 do
enunciado dos factos provados). Daí que, com fundamento no disposto nos artigos
154.º e 257.º do CC, o tribunal a quo
tenha anulado a adenda. Quanto a isto, o recorrente nada diz, antes persistindo
na afirmação, absolutamente destituída de fundamento, de que não ficou provado
que o recorrido Carlos Gomes e a esposa não estivessem na plenitude das suas
capacidades cognitivas e de entendimento aquando da celebração da adenda.
Deverá, pois, manter-se o
decidido pelo tribunal a quo nesta
matéria.
4 – Valor jurídico da
alteração ao contrato de arrendamento datada de 01.03.2016:
O recorrente pretende que o «escrito» denominado «Alteração ao Contrato de Arrendamento
Florestal», datado de 01.03.2016, seja «declarado
nulo e inexistente judicialmente, uma vez que, nunca vigorou entre o A. e o R. Carlos
e mulher, Carmen, nunca correspondeu à vontade real e efectiva de ninguém;
nunca foi participado à A.T.. Só serviu para o R. Carlos e mulher se defenderem
no Proc. n.º 35814/15.8T8LSB que os seus filhos lhe tinham movido.»
É evidente a inutilidade da
discussão que o recorrente pretende introduzir. A referida «Alteração ao Contrato de Arrendamento Florestal» foi anulada pelo
tribunal a quo, anulação essa que
constituiu um dos fundamentos para o mesmo tribunal considerar em vigor e,
consequentemente, aplicar a versão originária do contrato de arrendamento. Daí
que uma hipotética alteração do valor negativo da alteração celebrada em
01.03.2016 fosse absolutamente inócua. Acresce que os pressupostos de facto da
alteração pretendida pelo recorrente não se provaram.
5 – Validade e eficácia
da resolução do contrato de arrendamento:
Atentas a invalidade e a
consequente anulação, quer da “Adenda a
Contrato de Arrendamento Florestal” subscrita em 20.05.2015, quer da “Alteração a Contrato de Arrendamento
Florestal” subscrita em 01.03.2016, anulação essa que tem eficácia
retroactiva (artigo 289.º, n.º 1, do CC), considera-se que o «Contrato de Arrendamento Florestal»
celebrado em 01.12.2010 vigorou até 03.09.2020, data em que, através de
notificação judicial avulsa, foi resolvido.
O fundamento da resolução
foi a falta de pagamento das rendas vencidas em 01.07.2017, 01.07.2018,
01.07.2019 e 01.07.2020. Cabia ao recorrente o ónus da prova desse pagamento,
nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do CC. Porém, os factos alegados pelo
recorrente com vista a demonstrá-lo foram julgados não provados.
A falta de pagamento da
renda constitui fundamento de resolução do contrato de arrendamento rural pelo
senhorio, nos termos do artigo 17.º, n.º 2, al. a), do Novo Regime do
Arrendamento Rural (Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13.10).
Consequentemente, a
resolução do contrato, efectuada em 03.09.2020, foi válida e eficaz, tendo
produzido o seu típico efeito extintivo da relação contratual. Extinguiu-se,
assim, o título jurídico que legitimava o recorrente a ocupar o prédio, pelo
que ele tem o dever de o restituir desde aquela data, tal como se decidiu na
sentença recorrida.
6 – Condenação do recorrente
no pagamento do valor dos eucaliptos cortados após 03.09.2020:
O recorrente insurge-se
contra a sua condenação a pagar, aos recorrentes, o valor correspondente aos
eucaliptos que cortou, no prédio arrendado, após 03.09.2020, com argumentação
que assim se sintetiza:
- Em 03.09.2020, estava em vigor a
adenda ao contrato de arrendamento celebrada em 20.05.2015, a qual nunca foi
posta em crise até 28.05.2021, não obstante o recorrido Bruno Gomes dela ter
tomado conhecimento em Julho de 2015;
- A decisão do tribunal a quo «consubstância em si mesmo, um manifesto abuso de direito (artº 334º do
Código Civil) atento as demais Decisões objecto do segmento decisório que
condenaram o A./Reconvindo a pagar a renda, a pagar o dobro da renda, a pagar
juros e com esta Decisão a pagar o “fruto” objecto do Contrato de Arrendamento
Florestal criado pelo arrendatário aqui A./Reconvindo.»
- A mesma decisão «consubstância também um manifesto enriquecimento sem causa (artº 473º
do Código Civil).»
O tribunal a quo fundamentou este segmento da sua
decisão nos seguintes termos:
«Por
via da ampliação do pedido requerida em 31-01-2022 e deferida pelo Tribunal em
01-04-2022, os reconvintes peticionaram ainda o valor, com crescimento
completo, de todos os eucaliptos por si cortados após a resolução do contrato
de arrendamento, a liquidar em momento posterior, nos termos do art. 556º, n.º
1, alínea b) do CPC, e do art. 559º do Código Civil.
No
que respeita a esta matéria deflui da factualidade dada como provada que em
datas não concretamente apuradas, mas entre Setembro de 2020 e Junho de 2021, o
autor procedeu ao corte de eucaliptos no imóvel objecto do acordo mencionado no
ponto 5) em quantidade não concretamente apurada cfr. ponto 108) dos factos
dados como provados pelo Tribunal.
Resulta
também da cláusula 5.º do contrato de arrendamento em apreço, que o autor
estava autorizado a efectuar o corte de eucaliptos durante a vigência daquele
contrato vide ponto 5).
Acresce
que, conforme o acima decidido, o contrato de arrendamento cessou por
caducidade no dia 1 de Dezembro de 2017, estando o autor obrigado a restituir o
prédio em causa a partir daquela data. Nos termos do disposto no art. art. 1271.º
do C.C. “[O] possuidor de má-fé deve restituir os frutos que a coisa produziu
até ao termo da posse e responde, além disso, pelo valor daqueles que um
proprietário diligente poderia ter obtido.”
Por
outro lado, «[A]quele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o
direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses
alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da
violação.» - cfr. art. 483.º do C.C. - «devendo reconstituir a situação que
existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação» cfr.
art. 566.º do C.C.- sendo a indemnização fixada em dinheiro, «sempre que a
reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou
seja excessivamente onerosa para o devedor.
Destarte,
cessado o contrato de arrendamento em análise, extinguiu-se também o direito
que assistia ao autor de cortar eucaliptos no prédio do 1.º réu.
Assim,
ao cortar as referidas árvores, o autor impediu o 1.º réu de obter proveito, no
futuro, da rentabilização daquelas, nomeadamente através da venda da respectiva
madeira.
Ademais,
apesar de notificado para o efeito em 3 de Setembro de 2020, o autor não
procedeu à restituição do imóvel em causa, pelo que se tornou possuidor de má
fé a partir daquela data.
Consequentemente,
ao abrigo do acima expendido, deverá o autor indemnizar os réus no valor
corresponde aos eucaliptos por si cortados, a partir de 3 de Setembro de 2020,
conforme o peticionado. (…)»
A improcedência do
argumento, avançado pelo recorrente, de que, em 03.09.2020, estava em vigor a
adenda ao contrato de arrendamento celebrada em 20.05.2015, que nunca foi posta
em crise até 28.05.2021, é evidente. Está em causa o corte de eucaliptos feito
pelo recorrente posteriormente a 03.09.2020, data em que foi notificado da
resolução do contrato de arrendamento. Ao ser notificado, o recorrente ficou
ciente da vontade dos proprietários do prédio de fazer cessar o contrato de
arrendamento. Vigorava então a adenda, mas o recorrente conhecia perfeitamente
as condições em que a mesma fora celebrada, com aproveitamento da situação de
incapacidade do recorrido Carlos Gomes e da falecida esposa deste. Seguramente
o recorrente percebeu que, a partir de 03.09.2020, passou a estar em conflito
aberto com os recorridos sobre a subsistência da relação jurídica de
arrendamento e a ocupação do prédio. Não obstante, procedeu ao corte de
eucaliptos. Daí a justeza da sua condenação a indemnizar os recorridos do valor
destes, cuja fundamentação jurídica o recorrente não refuta.
A afirmação, feita pelo
recorrente, de que a decisão do tribunal a
quo consubstancia um manifesto abuso do direito, não tem razão de ser.
Desde logo, os tribunais não
abusam do direito. Na pior das hipóteses, decidem tarde, decidem mal, ou ambas
as coisas ao mesmo tempo. Aquilo que não faz qualquer sentido é dizer-se que um
tribunal, ao tomar determinada decisão, cometeu um abuso do direito.
Por outro lado, este
segmento da sentença recorrida não gera qualquer enriquecimento sem causa dos
recorridos.
Não existe qualquer óbice à
cumulação das condenações do recorrente a pagar as rendas vencidas e não pagas
até 03.09.2020, juros de mora sobre essa quantia, uma indemnização
correspondente ao dobro da renda estipulada pelo tempo decorrido desde
03.09.2020 até à data da restituição do prédio e uma indemnização pelo corte
dos eucaliptos.
As rendas em atraso são
devidas como contrapartida pelo gozo do prédio durante o período a que
respeitam. Os juros de mora são devidos pelo atraso no pagamento dessas rendas.
A indemnização correspondente ao dobro das mesmas rendas visa ressarcir o dano
resultante do atraso na restituição do prédio, nos termos do artigo 1045.º do
CC.
Todas estas quantias seriam
devidas ainda que o recorrente não tivesse procedido ao corte de eucaliptos
posteriormente à data da resolução do contrato, 03.09.2020. Daí que o dano
causado pelo recorrente com esse corte tenha autonomia, gerando, na esfera
jurídica de cada um dos recorridos, um direito de indemnização que não se
confunde com qualquer dos direitos acima referidos.
Deverá, pois, manter-se a
condenação do recorrente no pagamento do valor dos eucaliptos cortados após
03.09.2020.
7 – Condenação do
recorrente por litigância de má-fé:
O tribunal a quo condenou o recorrente por
litigância de má-fé com fundamento na manifesta contradição da versão por si
apresentada com aquilo que resultou da prova produzida, nomeadamente quanto às
seguintes matérias:
- Incapacidade do recorrido Carlos Gomes
e da sua falecida esposa, que era notória e conhecida do recorrente, pelo
menos, desde Maio de 2015;
- Existência de um aditamento ao
contrato de arrendamento posterior à adenda celebrada em 20.05.2015, a qual foi
omitida pelo recorrente na sua alegação;
- Entrega, pelo recorrente, em 2015 e
2016, das quantias mencionadas nos n.ºs 81 a 84 do enunciado da matéria de
facto provada.
Considerou o tribunal a quo que o recorrente não podia deixar
de ter conhecimento desses factos, uma vez que foram por si praticados e
presenciados, pelo que a sua conduta processual preenche as previsões das als.
a) e b) do n.º 2 do artigo 542.º do CPC.
O recorrente insurge-se contra
a referida condenação, argumentando que «não
logrou provar que as quantias em questão foram entregues a título de
empréstimo, pela simples razão que o A. em depoimento que prestou em Tribunal
perante o M. Juiz “a quo” disse-lhe que tal quantia foi entregue a título de
empréstimo. Porém, o Sr. Juiz não acreditou, não tendo dado tal por provado.
Porém, em parte alguma da matéria dada por provada está dado por provado qual o
fim a que se destinavam os montantes referidos em 81. a 84. Dos factos
provados. V.g. não constam dos autos quaisquer recibos de renda emitidos pelo
R. Carlos e/ou Carmen, nem estes declararam o que quer que fosse relativamente
a tal junto da A.T./Serviço de Finanças conforme informação de Fls. dos autos
dada por essa Entidade. Donde, jamais o A./Reconvindo deveria ter sido
condenado como litigante de má-fé.»
O recorrente não tem razão.
De acordo com o n.º 2 do
artigo 542.º do CPC, diz-se litigante de má-fé quem,
com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de
fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido
factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de
cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um
uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal,
impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem
fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
O recorrente não discute os
dois primeiros fundamentos da sua condenação por litigância de má-fé que acima
enunciámos. Sendo assim, essa condenação sempre teria de se manter, ainda que
com fundamentação mais restrita. A conduta processual do recorrente cuja
qualificação como litigância de má-fé ele não põe em causa é suficiente para o
preenchimento das previsões das als. a) e b) do n.º 2 do artigo 542.º do CPC.
No que concerne ao terceiro
fundamento da sua condenação por litigância de má-fé, a argumentação do
recorrente é muito redutora. Tal condenação não decorreu, meramente, do facto
de o tribunal não ter acreditado em si quando declarou que as quantias
mencionadas nos n.ºs 81 a 84 do enunciado da matéria de facto provada foram
entregues a título de empréstimo. O seu fundamento foi muito mais amplo,
decorrendo do seguinte trecho da sentença recorrida:
«Noutro
plano, a globalidade da versão do autor perde credibilidade com a factualidade
dada como provada pelo Tribunal em 81) a 84), concernente à entrega da quantia
de 17.000,00€ ao casal Gomes, nos anos de 2015 e 2016 – o que corresponde,
grosso modo, ao valor da renda inicialmente acordada [cfr. cláusula 4.º do
acordo referido no ponto 5)] e precisamente à renda acordada em sede do
subsequente aditamento de Março de 2016 [cfr. cláusula 2.ª do acordo referido no
ponto 80)]
Pronunciando-se
sobre esta factualidade em sede de depoimento de parte, o autor referiu que as
quantias em causa foram entregues a título de empréstimo, por si concedido ao
casal Gomes.
Ora,
em primeiro lugar cabe notar que o autor, nos presentes autos, apenas abordou
esta matéria em sede depoimento de parte, no seguimento do alegado pelos réus
na contestação – vide artigos 112.º 113.º.
Seria
expectável, tendo em conta os termos do litígio, que o autor aflorasse este
tema na sua petição inicial, sobretudo tendo em conta o si alegado quanto à
amortização da renda como forma de compensação da dívida do casal para consigo,
motivada por falta de condições financeiras.
Sob
outro ângulo, também seria crível que existisse alguma forma de formalização do
empréstimo, tendo em conta o facto de o autor ser empresário em nome individual
(conforme resultou do depoimento da testemunha Graça Maria) e o modus operandi
dos negócios levados a cabo entre o autor e casal Gomes, assente na redução a
escrito dos acordos firmados entre si.
Ademais,
também se afiguraria expectável que o autor tivesse envidado esforços para
reaver a quantia em causa, seja pela via judicial ou extrajudicial, sobretudo
após a comunicação da resolução contratual referida no ponto 10).
Por
outro lado, há que mencionar o acordo referido no ponto 80) dos factos dados
como provados (não mencionado pelo autor na sua petição inicial), através do
qual foi estipulada uma renda, precisamente no valor de 17.000,00€, o que abala
em larga medida a versão oferecida pelo autor.
Por
último, a explicação em causa não se coaduna com a situação patrimonial do
casal Gomes, já acima abordada.»
Portanto, além do mais, o
recorrente nem sequer mencionou a entrega das quantias em causa na petição
inicial, apesar de se tratar de um facto fundamental para a compreensão da
situação dos autos. Apenas o fez em sede de depoimento de parte, no seguimento
do alegado pelos recorridos na contestação (artigos 112.º e 113.º) e perante a
evidência da prova documental por estes apresentada, sustentando, então, a
versão, absolutamente inverosímil, de que se teria tratado de um empréstimo. O
recorrente omitiu, assim, factos relevantes para a decisão da causa e, quando
tais factos foram adquiridos no processo por outra via, procurou alterar a
verdade dos mesmos. Tem, pois, total justificação a sua condenação por
litigância de má-fé.
O recorrente considera que o
montante da multa em que foi condenado por litigância de má-fé (50 UC) é «excessivo, descabido, iníquo,
desproporcional e insensato, consubstanciando em si mesmo um manifesto abuso de
direito». Não justifica esta afirmação.
Carece de sentido a
invocação da cláusula geral do abuso do direito nesta sede. Trata-se aqui da
aplicação de uma sanção e não do exercício, pelo tribunal, de um direito, muito
menos de forma abusiva. Damos por reproduzido o que a esse propósito afirmámos
em 6.
O recorrente não diz porque
considera «excessivo, descabido, iníquo,
desproporcional e insensato» o montante de 50 UC. Sendo assim, não há
argumentos que possam ser apreciados pelo tribunal ad quem. Já a fundamentação expendida pelo tribunal a quo parece-nos razoável. Daí que não
encontremos razão para alterar aquele montante.
Mantendo-se, nos exactos
termos decididos pelo tribunal a quo,
a condenação do recorrente por litigância de má-fé, fica prejudicado o
conhecimento da ampliação do objecto do recurso requerida pelos recorrentes,
que se circunscreve à referida questão.
8 – Condenação dos
recorridos por litigância de má-fé:
O recorrente considera que
os recorridos deviam ter sido condenados por litigância de má-fé porquanto,
apesar de o recorrido Bruno Gomes ter tomado conhecimento da «Adenda ao Contrato de Arrendamento
Florestal» celebrada em 20.05.2015, não a mencionou na notificação judicial
avulsa.
O recorrente não tem razão.
Resulta do n.º 2 do artigo
542.º do CPC, transcrito em 7, que a condenação em multa e indemnização à parte
contrária por litigância de má-fé em determinado processo pressupõe que a
conduta processual merecedora daquela qualificação ocorra nesse processo. Não é
admissível a condenação por litigância de má-fé com fundamento numa actuação
levada a cabo noutro processo.
Acresce que a notificação
judicial avulsa nem sequer é um processo judicial. Não há partes, mas sim um
requerente e a pessoa cuja notificação este pretende. Não há litígio a dirimir
pelo tribunal, mas apenas uma notificação a realizar nos termos do artigo 256.º
do CPC. Tenha-se em mente o disposto no artigo 219.º, n.º 2, do CPC, nos termos
do qual a notificação serve para, nos casos em que a lei não exija a citação,
chamar alguém a juízo ou dar conhecimento de um facto. Daí que não faça sentido
falar-se em litigância de má-fé numa notificação judicial avulsa.
Pode, eventualmente, uma
notificação judicial avulsa ser utilizada como instrumento de uma litigância de
má-fé em determinado processo. Nessa hipótese, a conduta processual merecedora
daquela qualificação deverá desenrolar-se nesse processo. Não faz sentido
apreciar, no processo, a notificação judicial avulsa em si mesma, de forma
isolada, mas apenas enquanto instrumento de uma actuação nele desenvolvida.
Nesta ordem de ideias, a
omissão de referência, na notificação judicial avulsa mencionada no n.º 10 do
enunciado dos factos provados, à «Adenda
ao Contrato de Arrendamento Florestal» celebrada em 20.05.2015, de modo
algum constitui litigância de má-fé, ou um instrumento para uma litigância de
má-fé levada a cabo, neste processo, pelos recorridos. Aquela omissão é
coerente com a posição, aqui assumida pelos recorridos, de que aquela adenda é
nula ou, quando menos, anulável, pelo que o instrumento que regula a relação
contratual entre as partes é o contrato de arrendamento celebrado em
01.12.2010. Posição essa que, acrescente-se, obteve vencimento.
Sendo assim, inexiste
fundamento para condenar os recorridos por litigância de má-fé.
*
Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto,
julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, ainda que
com fundamentação não coincidente.
Custas a cargo do
recorrente.
Notifique.
*
Évora,
07.03.2024
Vítor Sequinho dos Santos (relator)
(1.º adjunto)
(2.º adjunto)