Reclamação contra despacho que não admite recurso.
Apelação autónoma.
Recurso absolutamente
inútil.
Despacho
que declara a desnecessidade de realização da audiência final.
*
AAA opôs-se à execução contra si
instaurada por BBB, através de embargos de executado.
Realizou-se audiência prévia, na
qual foi proferido despacho saneador, com a
identificação do objecto do litígio e o enunciado dos temas de prova. Foi,
então, agendada data para a realização da audiência final.
Posteriormente, foi proferido despacho no qual, por se entender «que os autos contêm elementos suficientes
para, sem necessidade de mais provas, conhecer do mérito da petição de embargos
de executado», se determinou a não realização da audiência final. No mesmo
despacho, foi ordenada a notificação das partes para, em 10 dias, querendo, se
pronunciarem.
O embargante pronunciou-se no sentido de que «o processo não contém os elementos
probatórios que permitam a apreciação do mérito da causa», razão pela qual
deve realizar-se a audiência final.
Em seguida, foi proferido despacho mantendo o anterior.
O embargante interpôs recurso de apelação deste último despacho,
invocando, como fundamento da sua admissibilidade, o disposto no artigo 644.º,
n.º 2, al. h), do CPC.
O tribunal a quo não
admitiu o recurso, com fundamento no entendimento de que o caso sub judice não é enquadrável na previsão
desta norma, já que «a impugnação da
decisão em questão com a decisão final não implica a absoluta inutilidade do
recurso, (…) por não se traduzir em qualquer resultado irreversível, pois em
caso de procedência determinará tão-somente a eventual anulação dos actos
processuais, incluindo a sentença».
O embargante reclama agora do despacho de não admissão do
recurso, ao abrigo do disposto
no artigo 643.º do CPC, continuando a sustentar que é admissível apelação
autónoma porquanto a impugnação da decisão recorrida apenas com o recurso que
viesse a ser interposto da decisão final seria absolutamente inútil. Sustenta
ainda que, cabendo apelação do despacho de rejeição de um articulado ou meio de
prova, nos termos do artigo 644.º, n.º 2, al. d), do CPC, por maioria de razão
terá de se entender que do despacho que declara a desnecessidade de realização
da audiência final, na qual, por excelência, a prova há-de ser produzida, cabe
apelação autónoma.
Analisemos esta argumentação.
O artigo
644.º, n.º 2, al. h), do CPC, estabelece que cabe recurso de apelação autónomo
das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente
inútil. O reclamante considera que o recurso por si interposto se enquadra
nesta previsão legal porquanto o diferimento, para o momento do recurso da
decisão final, da impugnação da decisão recorrida suscitará, em caso de
vencimento, «um incomportável dispêndio
de tempo e de meios, que não se vislumbra defensável». Acresce, segundo o
reclamante, que o recurso desta decisão intercalar terá efeito suspensivo, ao
passo que o recurso da decisão final terá efeito meramente devolutivo.
O reclamante não tem razão.
Desde logo, inexiste fundamento legal, que aliás o reclamante
não indica, para atribuir efeito suspensivo ao recurso por ele interposto caso
o mesmo fosse admissível. Aquilo que resulta do artigo 647.º do CPC é que tal
recurso teria efeito meramente devolutivo.
Por outro lado e ao contrário daquilo que o reclamante pretende,
para que se preencha a previsão do artigo 644.º, n.º 2, al. h), do CPC, «não basta que a transferência da impugnação
para um momento posterior comporte o risco de inutilização de uma parte do
processado, ainda que nesta se inclua a sentença final. Mais do que isso, é
necessário que imediatamente se possa antecipar que o eventual provimento do
recurso da decisão interlocutória não passará de uma “vitória de Pirro”, sem
qualquer reflexo no resultado da acção ou na esfera jurídica do interessado»
(ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, Recursos no
Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, p. 203).
No caso sub judice, a
eventual procedência da impugnação da decisão em causa que seja feita no
recurso que venha a ser interposto da sentença apenas determinará, além da
revogação daquela decisão, a anulação do processado posterior, incluindo da sentença.
Como vimos, tal inutilização de uma parte do processado constitui uma
possibilidade perfeitamente comportável pelo sistema, que deu prevalência ao
valor da celeridade processual. Na hipótese acima configurada, a procedência do
recurso terá, para o reclamante, exactamente a mesma utilidade que teria a daquele
que ele agora interpôs autonomamente. Portanto, o caso sub judice não se enquadra na previsão do artigo 644.º, n.º 2, al.
h), do CPC.
Também não colhe o argumento de que, cabendo apelação do despacho de
rejeição de um articulado ou meio de prova, nos termos do artigo 644.º, n.º 2,
al. d), do CPC, por maioria de razão terá de se entender que cabe apelação
autónoma do despacho que declara a desnecessidade de realização da audiência
final. Por um lado, trata-se de situações diversas, inexistindo, por isso,
qualquer incompatibilidade lógica entre soluções também diversas. Por outro
lado, foi intenção evidente do legislador limitar as hipóteses de apelação
autónoma, em prol do valor da celeridade processual, pelo que é fora de dúvida
que o n.º 2 daquele artigo estabelece uma enumeração taxativa, incompatível com
a interpretação proposta pelo reclamante.
Concluindo, o recurso não é
admissível.
Pelo exposto, mantenho o despacho
reclamado.
Custas a cargo do reclamante.
Notifique.
*
Évora, 11 de Junho de 2019
Vítor Sequinho dos Santos