Processo n.º 1317/22.9T8PTM-A.E1
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Sumário:
1 – É admissível, à luz do
disposto nos artigos 556.º, n.º 1, al. b), 2.ª parte, do CPC, e 569.º do CC, o
pedido de condenação no pagamento de uma indemnização pela privação do uso de
um imóvel, em consequência da ocupação deste pelo réu, em montante a liquidar
em execução de sentença.
2 – A omissão de indicação,
num despacho, da norma jurídica concretamente aplicada, não determina a
nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
3 – A não admissão do pedido
reconvencional principal não impede a admissão do pedido reconvencional
subsidiário.
4 – É admissível, nos termos
da al. d) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC, o pedido reconvencional de
reconhecimento de que o réu adquiriu, por usucapião, o direito de propriedade
sobre o terreno que o autor reivindica. A isso não obsta o facto de esse
terreno ser identificado, pelo autor, como constituindo dois lotes de terreno
para construção, e, pelo réu, como parte de um campo de golfe de que alega ser
proprietário.
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Autora/reconvinda/recorrente:
Sociedade 1, S.A..
Ré/reconvinte/recorrida:
Sociedade 2, S.A..
Interveniente acessório/recorrido:
Sociedade 3, S.A..
Pedidos da autora:
a) Ser reconhecido o respectivo direito
de propriedade e declarada a autora como única e legítima proprietária do
prédio urbano denominado Lote 19, sito em (…), com a área total de 1.005 metros
quadrados, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o número 1050
da freguesia de (…), e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4431 da
união das freguesias de (…), com a inscrição a seu favor registada pela Ap. 10,
de 28 de janeiro de 1993;
b) Ser reconhecido o respectivo direito
de propriedade e declarada a autora como única e legítima proprietária do
prédio urbano denominado Lote 20, sito em (…), com a área total de 1.005 metros
quadrados, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o número 1051
da freguesia de (…), e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4433 da
união das freguesias de (…), com a inscrição a seu favor registada pela Ap. 10,
de 28 de janeiro de 1993;
c) Ser a ré condenada a reconhecer a
propriedade da autora sobre os prédios acima identificados e a abster-se de
qualquer acto que prejudique e/ou viole os direitos de propriedade e a posse da
autora sobre os referidos prédios;
d) Ser a ré condenada na imediata
desocupação e restituição dos prédios à autora, livres e devolutos de pessoas e
bens, e a repor a suas expensas o estado dos prédios para os fins a que se
destinam, de construção urbana;
e) Ser a ré condenada a pagar à autora
uma indemnização correspondente ao benefício por ela obtido no período em que ocupou
os prédios sem qualquer título e até à entrega efectiva dos mesmos, bem como
por todos os danos e prejuízos que a autora está a sofrer pela privação do uso,
em montante a liquidar em execução de sentença;
f) Ser a ré condenada a pagar à autora
uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 150 por cada dia de atraso na
restituição de ambos e/ou de cada um dos prédios, livres e devolutos de pessoas
e bens, a contabilizar após o dia seguinte ao do trânsito em julgado da decisão
final.
Pedidos reconvencionais:
I. Deve ser reconhecida e declarada a
caducidade do Alvará de Loteamento n.º 16/1988, emitido pela Câmara Municipal
de (…), relativamente aos lotes 19 e 20, por nunca terem sido implementados;
Sem prescindir e se assim não se
entender,
II. Não se pode deixar de atender ao
facto da R. estar a ocupar o campo de golfe, agindo como sua proprietária,
relativamente à sua totalidade e incluindo o buraco n.º 6, de forma pública,
notória e pacífica, desde pelo menos 29.12.2008, data em que o comprou à
Sociedade 4, S.A., pelo que, nos termos dos artigos 1294.º do CC., tendo título
de aquisição e registo deste e estando de boa-fé, a R. vem invocar a aquisição
do direito de propriedade por usucapião sobre a totalidade do campo de golfe
incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por ter decorrido mais
de 10 anos, desde a compra e registo até que foi interpelada pela A.;
Sem prescindir e se assim não se
entender,
III. E só por mero dever de patrocínio
se admite, sempre deve a R. ser reconhecida como proprietária da totalidade do
campo de golfe, incluindo a totalidade do seu buraco n.º 6, tendo adquirido
esse direito originariamente em relação ao buraco n.º 6, na parte coincidente
com os lotes 19 e 20 do loteamento por usucapião, sempre beneficiando do
decurso do mais exigente prazo de 20 anos, contado o período da sua posse
correspondente ao direito de propriedade, bem como do período do seu
anteproprietário, com idêntico corpus
e animus de posse pública e pacífica
correspondente ao direito de propriedade.
Deve ainda sempre ser reconhecida e
declarada a condenação da A. como litigante de má-fé, com a consequente
condenação em multa e condigna indemnização a favor da R. pelos transtornos
tidos, pelos prejuízos desnecessários e danos que se computam em quantia não
inferior a € 5.000,00.
Decisão recorrida:
Despacho saneador, no qual se decidiu,
nomeadamente, o seguinte:
«1.3.
Do pedido genérico
Alegando
a ocupação abusiva que a ré está a fazer dos prédios, a autora acrescentou
estar a sofrer prejuízos, pois está privada e impossibilitada de dar qualquer
outro uso aos terrenos, explorando-os ou alienando-os, tendo em vista o fim de
construção urbana a que estão afetos.
Concluiu
pedindo e) Ser a ré condenada a pagar à autora uma indemnização correspondente
ao benefício por ela obtido no período em que ocupou os prédios sem qualquer
título e até à entrega efetiva dos mesmos, bem como por todos os danos e
prejuízos que a autora está a sofrer pela privação do uso, em montante a
liquidar em execução de sentença.
Sucede
que tendo alegado a existência de prejuízos no passado, não os elencou, pelo
que, por inadmissível o pedido genérico, absolvo a ré da instância nesta parte
- art. 556.º, a contrario sensu, do Código de Processo Civil.
1.4.
Do pedido reconvencional
1.4.1.
Da caducidade do loteamento n.º 16/1988
Veio
a ré arguir em reconvenção a caducidade do Loteamento nº 16/1988, emitido pela
Câmara Municipal de (…), relativamente aos lotes 19 e 20, por nunca terem sido
implementados e por coincidirem os mesmos com o campo de golfe.
A
autora respondeu, alegando que o pedido não se integra em nenhuma das alíneas
do n.º 2 do art. 266.º do Código de Processo Civil. De harmonia com tal
disposição, a dedução de reconvenção é admissível nos seguintes casos:
a)
Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à ação
ou à defesa;
b)
Quando o réu se propõe tornar efetivo o direito a benfeitorias ou despesas
relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida;
c)
Quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a
compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado
excede o do autor; ou
d)
Quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito
jurídico que o autor se propõe obter.
A
ré formula o pedido sem mais, designadamente sem o apresentar como prejudicial
em relação a outro que pudesse preencher os pressupostos da alínea a). Neste
contexto, o pedido de reconhecimento da caducidade do Loteamento nº 16/1988 não
é admissível. Mesmo na afirmativa, este não seria o Tribunal competente para
apreciar a questão, mas antes a jurisdição administrativa.
Por
isso, não admito o pedido reconvencional.
1.4.2.
Da usucapião
A
ré formulou um segundo pedido, o de ter adquirido o campo de golf, incluindo o
buraco n.º 6 e de assim ter agido, como respetiva proprietária.
A
autora defendeu a inadmissibilidade do pedido por não ter sido pedido o
reconhecimento de direito sobre os lotes n.º 19 e 20 (fórmula usada pela
autora), mas o campo de golf que corresponde a prédio distinto.
Tal
como o pedido, também a reconvenção é apreciada em função da alegação daquele
que a formula. Considerando que a ré/reconvinte alegou a sobreposição de tal buraco
à área dos prédios da autora, é de admitir este pedido reconvencional, o que
decido.»
Conclusões do recurso:
A. O presente recurso de apelação tem
por objecto (1.º) o despacho saneador proferido em 11 de Fevereiro de 2024, sob
a referência electrónica n.º 130682365, no segmento correspondente ao respectivo
ponto 1.3., decisão pela qual o tribunal a
quo, qualificando o pedido formulado pela recorrida na alínea e) da sua
petição inicial – lato sensu, o
pedido de condenação da recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização
pelo dano de privação de uso dos prédios objecto da acção de reivindicação
atenta a ocupação ilegal e ilegítima dos mesmos pela recorrida – como pedido
genérico, o julgou inadmissível e absolveu a recorrida da instância quanto ao
mesmo; e (2.º) o despacho saneador proferido em 11 de Fevereiro de 2024, sob a
referência eletrónica n.º 130682365, na parte correspondente ao respectivo ponto
1.4.2., decisão pela qual o tribunal a
quo decidiu admitir o pedido reconvencional subsidiário relativo à alegada
aquisição do campo de golf, incluindo o buraco n.º 6 pela recorrida, com invocação
de usucapião, não obstante não ter admitido o pedido reconvencional principal, respeitante
ao pedido de reconhecimento e declaração da caducidade do alvará de loteamento n.º
16/1988.
B. O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao julgar inadmissível o
pedido formulado pela autora-reconvinda/recorrente sob a alínea e) da sua
petição inicial, e absolver a ré-reconvinte/recorrida do pedido, impondo-se a
revogação desta decisão, contida no ponto 1.3 do despacho saneador recorrido.
C. Com base no artigo 1305.º, n.º 1 do
CC, tem sido entendido de forma unânime que o direito de propriedade se define
conceptualmente pelos poderes que confere ao seu titular, abrangendo, como
componentes: (i) a liberdade de adquirir bens, (ii) a liberdade de usar e fruir
dos bens de que se é proprietário; (iii) a liberdade de os transmitir; (iv) o
direito de não ser privado deles e, ainda, (v) o direito de reaver os bens sobre
os quais o mesmo direito se mantém.
D. A privação ilícita do uso de qualquer
bem constitui um dano do qual o lesado deve ser compensado, por afectação
ilegítima do conteúdo daquele direito de propriedade, e tal sucede quando
alegados e demonstrados os factos que corporizam a privação do uso do bem, sem necessidade
de alegar danos concretos que promanam da privação do uso, porquanto tal privação
constitui em si mesma um dano, que tem de ser compensado monetariamente pelo período
correspondente ao impedimento do proprietário de aceder e gozar os poderes de fruição
ou de disposição do bem.
E. O pedido de indemnização pela
privação do uso de um bem é particularmente premente – e frequente – no âmbito
de acções de reivindicação, uma vez que tais acções têm por escopo, precisamente,
o de restituir o bem ao seu legítimo proprietário, sendo esse o espaço natural
e próprio para reclamar ressarcimento pela privação do uso do mesmo bem.
F. Neste sentido, tem decidido a melhor
doutrina que se debruça sobre o tema do dano da privação de uso, em concreto, o
Senhor Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes, em Temas da Responsabilidade Civil,
I Volume, Indemnização do dano da privação do uso, 3.ª Edição Revista e
Actualizada, Almedina, 2007, pp. 92-93.
G. Este mesmo é o entendimento do
Supremo Tribunal de Justiça – veja-se, a este propósito, o acórdão deste
Colendo Tribunal, de 28.05.2009, processo n.º º 160/09.5YFLSB, disponível em www.dgsi.pt.,
em que estava em causa uma acção de reivindicação, em que, cumulados com os pedidos
típicos da reivindicação, a autora-reconvinda peticionara uma indemnização a
liquidar em execução de sentença, pelos prejuízos sofridos e pelos benefícios
que a autora-reconvinda deixara de obter em face da recusa da ré-reconvinte em
entregar um bem imóvel, tendo o Tribunal decidido que «“VIII – Ainda que nada se prove a respeito da utilização ou do destino
que seria dado ao bem, o lesado deve ser compensado monetariamente pelo período
correspondente ao impedimento dos poderes de fruição ou de disposição.».
H. No caso deste acórdão, o autor
peticionara a condenação em indemnização pelo dano da privação do uso a
liquidar em execução de sentença, tendo as instâncias e o Supremo Tribunal de
Justiça aceitado o pedido em questão, tal como formulado.
I. No mesmo sentido decidiu o Supremo
Tribunal de Justiça, em acórdão de 29.06.2004, processo n.º 04A2105, disponível
em www.dgsi.pt., em que a demanda consistia numa acção de reivindicação, em
que, cumulado com os pedidos típicos desta acção, os autores peticionaram a condenação
dos réus no pagamento de uma indemnização pela violação ilícita e culposa do
seu direito de propriedade sobre um bem imóvel pelos réus, tendo o Tribunal
decidido que «3ª – A mera privação do uso
constitui dano autónomo de natureza patrimonial, indemnizável nos termos dos
artigos 483º e 566º do Código Civil.».
J. A recorrente propôs a acção de
reivindicação a que este recurso respeita, alegando e demonstrando ser a dona e
legítima proprietária dos dois prédios melhor identificados na petição inicial,
que os prédios se encontram ocupados ilegal e ilegitimamente pela recorrida sem
título; ocupação para a qual a ré-reconvinte não teve qualquer autorização da
recorrente; alegou igualmente que devido à ocupação abusiva e ilícita dos prédios,
estava e está a sofrer prejuízos, pois está privada e impossibilitada de dar
qualquer outro uso aos mesmos, explorando-os ou alienando-os; o que sempre
decorreria lógica e necessariamente do facto, não contestado, de estar a
recorrida a ocupar os referidos prédios.
K. Requereu a recorrente a tutela
jurídica ao tribunal a quo,
concretizada, entre os demais pedidos, na concessão à autora-reconvinda de uma
indemnização pelo dano de privação do uso – vide, designadamente, os artigos
33.º, 45.º a 53.º da petição inicial, e, em concreto, o pedido formulado sob a
alínea e) do petitório.
L. A privação de uso de um bem
constitui, por si e em si mesma, dano patrimonial, visto que se traduz na lesão
do direito de propriedade, assente na exclusão de uma das faculdades que assistem
ao proprietário, de acordo com o artigo 1305.º do CC, isto é, o uso e a fruição
da coisa.
M. A recorrente alegou e concretizou na
petição inicial que está impedida de fruir plenamente a sua propriedade, atenta
a ocupação ilícita, e, logo, alegou e concretizou o dano de privação do uso dos
imóveis.
N. O tribunal a quo decidiu que a recorrente não teria «elencado» a «existência de
prejuízos no passado» que alegou, e, nesta formulação, considerou o pedido
da recorrente, que qualificou como pedido genérico, inadmissível, tendo
absolvido a recorrida da instância nesta parte, invocando para o efeito a norma
contida no artigo 556.º do CPC, a
contrario.
O. O tribunal a quo errou ao considerar que a recorrente não elencara danos –
porquanto o dano da privação do uso de um bem pelo seu proprietário é um dano ipso facto –, sendo que, a recorrente,
na petição inicial, alegou e demonstrou que estava privada do uso dos prédios,
face à actuação da recorrida, e, por conseguinte, privada de os poder fruir,
comercializar, explorar, ou seja, alegou a existência de danos, do dano da
privação do uso.
P. É apodítica a relação entre a acção
da recorrida – ilícita e geradora de responsabilidade civil – e a privação do
uso pela recorrente, logo, o respectivo nexo de causalidade, não tendo a recorrida
contestado a ocupação.
Q. O tribunal a quo errou ao não ter efectuado a necessária destrinça entre a
questão da alegação dos danos e a sua quantificação, ou formulação como pedido
genérico; tendo o tribunal recorrido tratado da questão numa amálgama, sem
percorrer o necessário iter para concluir
(i) pela alegação de danos; (ii) pela possibilidade de reclamar tais danos sob
a forma de um pedido genérico.
R. Nos termos do disposto no artigo
556.º, n.º 1, alínea b) do CPC, é permitido formular pedidos genéricos quando
não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do
facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º
do CC; e estatui o artigo 569.º do CC que, quem exigir a indemnização não
necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos.
S. Não constitui matéria controvertida a
alegação pela recorrente da existência dos danos associados à privação do uso
dos prédios, sendo este um caso em que era admissível a formulação de pedido
genérico, em concreto, por não estar apurado quantitativo dos danos, designadamente
porque que o ressarcimento pela privação de uso deve contemplar todo o período
até à restituição do bem, pelo que errou o tribunal a quo ao não admitir o pedido genérico.
T. No sentido desta admissibilidade,
veja-se, entre outros, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de
19.01.2004, processo n.º 0355738, e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça,
de 20.09.2005, processo n.º 05A1980, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
U. O princípio da indemnização dos danos
é um pilar estruturante e essencial do nosso sistema jurídico, conforme se
encontra consagrado nos artigos 562.º e seguintes do CC, em concreto, no referido
artigo 562.º, e foi violado pela decisão proferida pelo tribunal a quo, que, ilegalmente e sem
observância das normas legais aplicáveis, negou o direito de indemnização da
autora-reconvinda pelo dano de privação do uso.
V. Caso se entendesse, o que se concebe
por estrita cautela de patrocínio, e sempre sem conceder, que existia alguma
insuficiência na alegação da recorrente e/ ou nos termos da formulação do
pedido, o tribunal a quo estava
vinculado a formular convite de aperfeiçoamento à recorrente, antes de proferir
a decisão de absolvição da instância, e apenas se a recorrente não respondesse
ao convite, ou o fizesse fora dos parâmetros exigíveis, poderia concluir pela absolvição
da recorrida da instância, o que decorre da aplicação conjugada do disposto nos
artigos 6.º, n.º 2, 590.º, n.º 2, al. a), e 278.º, n.º 2 do CPC.
W. Com a decisão constante do ponto 1.3
do despacho saneador, aqui recorrida, o tribunal a quo violou as normas contidas nos artigos 62.º, n.º 1 da
Constituição da República Portuguesa, nos artigos 1305.º, 483.º, n.º 1, 562.º,
564.º, n.º 1 e 569.º do CC, nos artigos 556.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, 6.º,
n.º 2, 278.º, n.º 2, e 590.º, n.º 2 alínea a), do CPC, e, bem assim, o
princípio geral de indemnização dos danos perpetrados ao lesado.
X. A norma contida no artigo 556.º do
CPC, invocada na decisão recorrida, devia ter sido interpretada e aplicada no
sentido de ser admitido o pedido genérico formulado, atento o contexto e termos
da respectiva dedução.
Y. A decisão em causa deve ser revogada
e substituída por outra que considere admissível o pedido formulado pela
recorrente, sob a alínea e) da sua petição inicial, ordenando-se a revogação do
despacho saneador proferido em onze (11) de fevereiro de 2024, com a referência
CITIUS n.º 130682365, quanto ao respectivo 1.3, e a sua substituição por
decisão que julgue o referido pedido admissível, com todas as legais
consequências.
Z. O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao decidir considerar
admissível o pedido reconvencional subsidiário de «aquisição do direito de propriedade por usucapião sobre a totalidade
do campo de golfe incluindo o buraco n.º 6» formulado pela recorrida,
impondo-se a revogação desta decisão, contida no ponto 1.4.2 do despacho
saneador recorrido.
AA. Quanto a esta decisão, o tribunal a quo não consignou ao abrigo de que
alínea constante do n.º 2 do artigo 266.º do CPC considerava admissível o
pedido reconvencional em questão.
BB. A identificação da norma ao abrigo
da qual foi admitido o referido pedido reconvencional era necessária, pois (i)
por um lado, a dedução de pedidos reconvencionais apenas é admissível nas
estritas hipóteses legais configuradas no artigo 266.º, n.º 2 do CPC; e (ii) a
indicação dessa norma era necessária para viabilizar à recorrente o direito de
impugnar cabalmente a decisão judicial, para o que se mostra(va) essencial
conhecer os seus fundamentos.
CC. Essa omissão configura a nulidade
prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, aplicável ex vi do artigo 613.º, n.º 3 do mesmo
diploma legal, por não especificar o despacho recorrido os fundamentos de
direito que justificam a decisão, que aqui se argui.
DD. A decisão de admitir o pedido
reconvencional subsidiário, é ilegal e padece de erro de julgamento, em
concreto, (i) por violar os termos legais de admissibilidade dos pedidos subsidiários,
atento o disposto no artigo 554.º, n.º 1 do CPC, e (ii) por desrespeitar os
termos legais de admissibilidade de pedidos reconvencionais nos termos do
artigo 266.º, n.º 2 do CPC, impondo-se a sua revogação.
EE. O tribunal recorrido decidiu não
admitir o pedido reconvencional principal formulado pela recorrida, de
reconhecimento e declaração da caducidade do alvará de loteamento n.º 16/1988,
por entender que não estavam reunidos os pressupostos de admissibilidade da reconvenção,
e por entender, em todo o caso, que não tem competência para apreciar tal pedido/questão.
FF. A recorrida formulou o pedido
reconvencional relativo à alegada aquisição por usucapião como um pedido
reconvencional subsidiário, que, nos termos do artigo 554.º, n.º 1 do CPC, é um
pedido apresentado ao tribunal para ser tomado em consideração somente no caso
de não proceder um pedido anterior.
GG. À luz do disposto no artigo 554.º,
n.º 1 do CPC, o pedido reconvencional subsidiário apenas poderia ser tomado em
consideração, ou seja, admitido para ulterior conhecimento, no caso de não
proceder o pedido reconvencional principal.
HH. O pedido reconvencional principal
não foi julgado procedente nem improcedente, não foi proferida uma decisão de
mérito sobre o mesmo – pois o tribunal a
quo decidiu não o admitir, não chegando a ser apreciado, pelo que falha o
pressuposto processual de admissibilidade do pedido reconvencional subsidiário.
II. No acórdão proferido em 19.06.2014,
proferido no processo n.º 4162/09.3TBSTB.E1, disponível em www.dgsi.pt., este
Tribunal da Relação de Évora, decidiu não ser de conhecer de pedido subsidiário
por falta do pressuposto atinente à não procedência do pedido principal, porquanto
existira transacção quanto ao pedido principal, e decisão de extinção da
instância quanto ao mesmo, não tendo tal pedido principal sido julgado
improcedente.
JJ. Não tendo admitido o pedido
reconvencional principal, nem, por conseguinte, julgado o mesmo não procedente,
o tribunal recorrido não podia admitir o pedido reconvencional subsidiário, uma
vez que, nos termos legais aplicáveis, este último apenas pode ser tomado em consideração
somente no caso de não proceder um pedido anterior; ao admitir o pedido reconvencional
subsidiário, o tribunal a quo
incorreu em erro de julgamento, e violou a norma do artigo 554.º, n.º 1 do CPC.
KK. No nosso Direito Processual Civil,
apenas é admitida a dedução de pedidos reconvencionais nos casos taxativamente
previstos nas alíneas a) a d) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC.
LL. Tendo em conta os contornos do caso
em concreto, e a delimitação efectuada pela própria recorrida, o pedido
reconvencional em causa apenas pode assentar no disposto no artigo 266.º, n.º
2, alínea d) do CPC.
MM. A recorrente propôs a acção de
reivindicação visando o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre os
prédios urbanos denominados Lote 19 e Lote 20, melhor identificados na petição
inicial, bem como a condenação da recorrida no reconhecimento do seu direito de
propriedade e na abstenção de qualquer acto que prejudique e/ ou viole os
direitos de propriedade e a posse sobre os referidos prédios, e a consequente
condenação da recorrida na imediata desocupação e restituição dos prédios
livres e devolutos de pessoas e bens, e demais pedidos constantes do petitório.
NN. Em reconvenção, a recorrida veio
peticionar, a título subsidiário, o seguinte:
A
aquisição do direito de propriedade por usucapião sobre a totalidade do campo
de golfe incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por ter
decorrido mais de 10 anos, desde a compra e registo até que foi interpelada
pela A;
E,
ainda a título subsidiário, requerer:
Deve
a R. ser reconhecida como proprietária da totalidade do campo de golfe,
incluindo a totalidade do seu buraco n.º 6, tendo adquirido esse direito
originariamente em relação ao buraco n.º 6, na parte coincidente com os lotes
19 e 20 do loteamento por usucapião, sempre beneficiando do decurso do mais
exigente prazo de 20 anos, contado o período da sua posse correspondente ao
direito de propriedade, bem como do período do seu anteproprietário, com
idêntico corpus e animus de posse pública e pacífica correspondente ao direito
de propriedade.
OO. Os pedidos reconvencionais, em
concreto e para o que aqui releva, o pedido de aquisição por usucapião, carecem
dos requisitos legais de admissibilidade da reconvenção, pelo que foi ilegalmente
admitido pelo tribunal recorrido.
PP. O referido pedido formulado pela
recorrida apenas se poderia integrar no âmbito da al. d) do artigo 266.º, n.º 2
do CPC – «(…) o pedido do réu tende a
conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe
obter.».
QQ. Com a acção de reivindicação, a
recorrente pretende o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre os
prédios urbanos denominados Lote 19 e Lote 20, melhor identificados na petição
inicial, bem como a condenação da recorrida no reconhecimento do direito de propriedade
da recorrente e na abstenção de qualquer acto que prejudique e/ ou viole os
direitos de propriedade e a posse da recorrente sobre os referidos prédios, e a
consequente condenação da recorrida na imediata desocupação e restituição dos
prédios, livres e devolutos de pessoas e bens, e demais pedidos.
RR. Na reconvenção, a recorrida não requereu
o reconhecimento de um alegado direito de propriedade, adquirido por suposta
usucapião, sobre os referidos prédios, o que teria de fazer, por imposição do
princípio do dispositivo, se quisesse que o seu pedido reconvencional fosse admissível;
na verdade, a recorrida veio peticionar coisa diferente – a «aquisição do direito de propriedade por
usucapião sobre a totalidade do campo de golfe incluindo o buraco n.º 6 com a sua
actual configuração».
SS. É diferente peticionar o
reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios urbanos
correspondentes aos referidos lotes n.ºs 19 e 20 conforme identificados na
petição inicial, juridicamente identificados e identificáveis, e peticionar o
reconhecimento do alegado direito de propriedade sobre «a totalidade do campo de golfe», que corresponde a um prédio urbano
distinto, «incluindo o buraco n.º 6».
TT. Trata-se de realidades juridicamente
distintas e autónomas, e a menção ao «buraco
n.º 6» parte de uma alegação exclusiva da recorrida quanto a uma alegada
sobreposição de tal buraco à área dos prédios da recorrente, alegação que não
se encontra fundamentada, demonstrada ou comprovada, que não se verifica e não
se aceita.
UU. Pelo modo como está configurado, o
referido pedido reconvencional relativo à aquisição por usucapião é
inadmissível, particularmente por não se enquadrar nas possibilidades previstas
no artigo 266.º, n.º 2, do CPC, não se podendo considerar ser o efeito
pretendido pela recorrida o mesmo que é visado pela recorrente, impondo-se, em
consequência, a absolvição da recorrente do mesmo.
VV. Assim não entendeu o tribunal a quo, que considerou que «Tal como o pedido, também a reconvenção é
apreciada em função da alegação daquele que a formula. Considerando que a ré/reconvinte
alegou a sobreposição de tal buraco à área dos prédios da autora, é de admitir este
pedido reconvencional».
WW. A afirmação do tribunal a quo em que este vem a fundar a
admissibilidade do sobredito pedido reconvencional é incorreta e ilegal, não
tendo respaldo nas normas legais e princípios jurídicos aplicáveis – se no
âmbito dos pedidos formulados em sede de acção, na petição inicial, o autor é
livre de definir e alegar as suas causas de pedir e o seu pedido, o mesmo não
se passa com a dedução de pedidos reconvencionais, pois como decorre do
estatuído no artigo 266.º, n.º 2 do CPC, a admissibilidade do pedido
reconvencional é excepcional e restrita, e apenas admitida nos casos aí
expressa e taxativamente consignados.
XX. O pedido reconvencional tem de ter
uma estrita e inexorável conexão com a acção já instaurada e os pedidos do
autor, concretizando-se numa das hipóteses legais consignadas nas alíneas a) a
d) do artigo 266.º, n.º 2 do CPC.
YY. Tendo em conta os parâmetros e
critérios de admissibilidade dos pedidos reconvencionais, querendo deduzir o
pretenso pedido de aquisição por usucapião, a recorrida teria de se conter
dentro dos parâmetros que norteiam a dedução da pretensão da recorrente, o que
implicaria ter a recorrida dirigido tal pedido aos prédios sub judice da autora-reconvinda, objecto da acção de reivindicação,
como impõem o artigo 5.º do CPC e o princípio do dispositivo.
ZZ. Com a decisão constante do ponto
1.4.2 do despacho saneador, aqui recorrida, o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, e violou as normas contidas
nos artigos 554.º, n.º 1, 266.º, n.ºs 1 e 2, 5.º e 576.º, n.º 2 do CPC e, bem
assim, o princípio do dispositivo.
AAA. A decisão em causa deve ser
revogada e substituída por outra que considere inadmissível o pedido
reconvencional de aquisição por usucapião formulado pela recorrida, com a
consequente absolvição da recorrente do mesmo, ordenando-se a revogação do despacho
saneador proferido em 11.02.2024, com a referência CITIUS n.º 130682365, quanto
ao respectivo 1.4.2., com as legais consequências.
Questões a decidir:
1 – Admissibilidade do pedido de
condenação da recorrida Sociedade 2, S.A. a indemnizar a recorrente do dano
decorrente da privação do uso do terreno correspondente aos lotes 19 e 20, em
montante a liquidar em execução de sentença;
2 – Admissibilidade do pedido
reconvencional subsidiário de aquisição, por usucapião, do direito de
propriedade sobre a totalidade do campo de golfe, incluindo o buraco n.º 6 com
a sua actual configuração.
*
1
A fundamentação do segmento
do despacho saneador dedicado ao pedido de condenação da recorrida Sociedade 2,
S.A. a indemnizar a recorrente do dano decorrente da privação do uso do terreno
correspondente aos lotes 19 e 20, em montante a liquidar em execução de
sentença, é parca e, aparentemente, contraditória. Reconhece-se que a
recorrente alega que a recorrida Sociedade 2, S.A. vem ocupando abusivamente o
terreno correspondente àqueles dois lotes e que essa ocupação lhe vem causando
prejuízos, pois priva-a da possibilidade de dar qualquer outro uso a esse
terreno, explorando-o ou alienando-o. Não obstante, conclui-se que a
recorrente, embora «tendo alegado a
existência de prejuízos no passado, não os elencou, pelo que, por inadmissível
o pedido genérico», foi a recorrida Sociedade 2, S.A. absolvida da
instância nessa parte, nos termos do artigo 556.º do CPC, a contrario sensu.
O tribunal a quo parece confundir a alegação dos
factos que constituem o dano invocado pela recorrente com a quantificação da
indemnização que esta pretende.
A recorrente alegou os
factos que constituem o dano por si invocado. São eles a ocupação do terreno em
disputa por parte da recorrida Sociedade 2, S.A. e a consequente privação da
possibilidade de a recorrente o usar ela própria, explorando-o ou alienando-o,
tanto mais que esta é uma sociedade comercial que tem por objecto o estudo,
projecto, desenvolvimento, execução e comercialização de empreendimentos
imobiliários, aquisição para revenda e administração de imóveis. Atente-se nos
artigos 1.º, 20.º a 23.º, 31.º, 33.º, 39.º, 45.º a 48.º, 50.º, 51.º e 53.º da
petição inicial.
É certo que a jurisprudência
diverge acerca dos pressupostos da ressarcibilidade do dano em causa.
Esquematicamente, são três as teses em confronto:
1.ª – A ressarcibilidade do dano da
privação do uso depende da alegação e prova da frustração de um concreto
propósito do proprietário de utilizar a coisa, directamente ou cedendo o seu
gozo mediante um contrato já projectado nos seus elementos essenciais;
2.ª – O dano da privação do uso
constitui um dano autónomo, não dependendo o seu ressarcimento da alegação e
prova do propósito referido em 1; basta, para tanto, que o proprietário se veja
privado do gozo da coisa em consequência de acto ilícito e culposo de terceiro;
3.ª – O dano da privação do uso depende
da alegação e prova de um genérico propósito de utilizar a coisa, directamente
ou mediante a cedência onerosa do seu gozo a terceiro; a prova desse propósito
pode decorrer «de presunções naturais ou
judiciais a retirar pelas instâncias da factualidade envolvente».
Apenas à luz da 1.ª tese,
mais exigente mas minoritária, poderia considerar-se que a alegação, pela
recorrente, dos factos constitutivos do dano cujo ressarcimento pretende, se
encontra incompleta, por não se especificar um concreto propósito de utilização
ou de alienação que se tenha frustrado em consequência da ocupação do terreno
pela recorrida Sociedade 2, S.A.. Todavia, o tribunal a quo não explicita se se baseou nesta tese para decidir como
decidiu, como, na hipótese afirmativa, se impunha, atento o disposto no artigo
154.º do CPC, que exige uma fundamentação digna desse nome, ou seja, que
permita, a quem leia a decisão, ficar a conhecer as razões que levaram o
tribunal a decidir como decidiu.
Independentemente da questão
da falta de fundamentação, também não podia o tribunal a quo, em face da apontada divergência jurisprudencial, proferir
uma decisão de absolvição da instância quanto ao pedido de indemnização logo no
despacho saneador com base numa das várias teses em confronto, para mais sendo minoritária,
antes se impondo deixar o processo seguir para a fase de julgamento também
nessa parte.
Finalmente, ainda que fosse aquele
o seu entendimento e que se considerasse admissível «arrumar» esta questão logo no despacho saneador, estava vedado, ao
tribunal a quo, absolver a recorrida Sociedade
2, S.A. da instância nesta parte sem, previamente, em cumprimento do disposto
nos artigos 6.º, n.º 2, 278.º, n.º 2 e 590, n.º 2, al. a), do CPC, a convidar a
completar a sua alegação.
Diremos, ainda, que a 1.ª
tese é de afastar, por não proporcionar uma justa composição dos interesses em
jogo, nomeadamente porque coloca, a cargo do lesado, uma verdadeira probatio diabolica. Com efeito, carece
de justificação razoável que, a pretexto da existência de situações,
seguramente excepcionais, em que o proprietário não pretende utilizar nem
rentabilizar a coisa durante o período em que se verifica a ocupação ilícita
por terceiro, se exija, em todos os casos, que o proprietário prove a
existência de um concreto propósito de utilização ou rentabilização da coisa,
deixando, assim, inúmeras situações lesivas destituídas de tutela por efeito de
um standard de prova demasiadamente
exigente.
Sendo assim, das duas, uma:
se o tribunal a quo se tiver baseado
na 1.ª tese, errou logo aí; se se tiver baseado na 2.ª ou na 3.ª teses, avaliou
mal a alegação do dano feita pela recorrente, que é suficiente à luz de
qualquer dessas teses. Em qualquer caso, fundamentou a decisão de forma
extremamente deficiente, não podia ter decidido como decidiu logo no despacho
saneador e, ainda que pudesse fazê-lo, teria de, previamente, proferir despacho
de aperfeiçoamento.
Portanto, se o fundamento da
decisão foi a falta de alegação dos factos que constituem o dano invocado pela
recorrente, o tribunal a quo errou
pelas razões acabadas de referir.
Se o fundamento da decisão
foi a falta de quantificação da indemnização que a recorrente pretende, o
tribunal a quo errou ao ignorar o
disposto no artigo 556.º, n.º 1, al. b), 2.ª parte, do CPC, nos termos do qual
é permitido formular pedidos genéricos quando o lesado pretenda usar da
faculdade conferida pelo artigo 569.º do CC. Esta norma estabelece, na parte que
nos interessa, que quem exigir a indemnização não necessita de indicar a
importância exacta em que avalia os danos. Foi precisamente isto que a
recorrente fez: alegou os factos que constituem o dano que pretende ver
ressarcido e, em vez de quantificar, desde logo, esse dano, pediu a condenação
da recorrida Sociedade 2, S.A. a pagar-lhe uma indemnização a liquidar em
execução de sentença.
Concluindo, o pedido que
vimos analisando é admissível, pelo que o despacho saneador deverá ser revogado
nesta parte.
2
O recorrente ataca a decisão
de admitir o pedido reconvencional subsidiário de aquisição, por usucapião, do
direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe, incluindo o buraco
n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade 2, S.A.,
com três fundamentos:
1.º – Falta de especificação da alínea
do n.º 2 do artigo 266.º do CPC ao abrigo da qual tal pedido é admitido, o que
determina que o despacho recorrido padeça da nulidade prevista no artigo 615.º,
n.º 1, alínea b), do mesmo código;
2.º – Violação do n.º 1 do 554.º do CPC,
porquanto o pedido reconvencional principal foi julgado inadmissível;
3.º – Violação da al. d) do n.º 2 do
artigo 266.º do CPC, porquanto o pedido reconvencional em questão visa a
produção de um efeito jurídico diverso daquele que a recorrente se propõe
obter.
Analisemo-los.
2.1. É verdade que o
despacho recorrido não especifica a alínea do n.º 2 do artigo 266.º do CPC ao
abrigo da qual admite o pedido reconvencional subsidiário de aquisição, por
usucapião, do direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe, incluindo
o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade
2, S.A.. Todavia, daí não decorre a
nulidade arguida pela recorrente.
Na parte que nos interessa,
a al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC prevê a falta de especificação dos
fundamentos de direito que justificam a decisão. Especificar os fundamentos de
direito de uma decisão constitui uma realidade mais ampla que indicar as normas
legais concretamente aplicadas. Fundamentos de direito é sinónimo de razões de
direito, de argumentos jurídicos. Fundamentar juridicamente uma decisão é
desenvolver uma argumentação jurídica conducente a determinada conclusão. É,
por exemplo, aquilo que estamos a fazer neste momento. Ora, não é por deixar de
se indicar a(s) norma(s) jurídica(s) concretamente aplicadas que uma
argumentação jurídica deixa de o ser. Ainda que menos completa, menos sólida,
menos sustentada, continua a ser uma argumentação jurídica. Daí que, em tal
hipótese, não seja lícito concluir que a decisão não se encontra juridicamente
fundamentada e, por essa razão, padeça da nulidade prevista na al. b) do n.º 1
do artigo 615.º do CPC.
É certo que o n.º 3 do
artigo 607.º do CPC impõe, ao juiz, que indique, interprete e aplique as normas
jurídicas correspondentes. Todavia, pelas razões acima apontadas, a falta de
indicação, por si só, não determina a nulidade da decisão judicial. Tratar-se-á
de uma decisão menos bem fundamentada, mas não nula.
Em certas circunstâncias, a
falta de indicação da(s) norma(s) jurídica(s) concretamente aplicada(s) tem,
mesmo, um relevo diminuto ou nulo para a compreensão da decisão. Quando uma
questão de direito tenha sido debatida e a decisão sobre ela proferida não
extravase do quadro jurídico em que o debate ocorreu, a omissão da indicação daquela(s)
norma(s) pode não afectar, de todo, a compreensibilidade da fundamentação. É o
que acontece relativamente à decisão da questão que agora analisamos.
A recorrente suscitou a
questão da admissibilidade do pedido reconvencional subsidiário de aquisição,
por usucapião, do direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe,
incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade
2, S.A., na réplica. Neste articulado, a recorrente pugnou pela não admissão
deste pedido, nos seguintes termos:
«12.
Com efeito, trazendo novamente à colação os casos de admissibilidade da
formulação de reconvenção previstos no n.º 2 do artigo 266.º do CPC, apenas
poderia integrar-se o respetivo pedido no âmbito da respetiva alínea d) – “(…)
o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico
que o autor se propõe obter.”.
13.
Recordando os termos da propositura da presente ação judicial, o que se
verifica é que a autora pretende, grosso modo, o reconhecimento do seu direito
de propriedade sobre os prédios urbanos denominados “Lote 19” e “Lote 20”,
melhor identificados na petição inicial, bem como a condenação da ré no
reconhecimento do direito de propriedade da autora e na abstenção de qualquer
ato que prejudique e/ ou viole os direitos de propriedade e a posse da autora
sobre os referidos prédios, e a consequente condenação da ré na imediata
desocupação e restituição dos prédios, livres e devolutos de pessoas e bens.
14.
Ora, na reconvenção, a ré não vem requerer o reconhecimento de um alegado
direito de propriedade, adquirido por suposta - embora inexistente - usucapião,
sobre os referidos prédios.
15.
O que a ré-reconvinte vem peticionar ao tribunal é coisa diferente – a ré vem
invocar a “aquisição do direito de propriedade por usucapião sobre a totalidade
do campo de golfe incluindo o buraco nº 6 com a sua atual configuração”
(“sic”);
16.
E subsidiariamente, vem requerer que seja “reconhecida como proprietária da
totalidade do campo de golfe, incluindo a totalidade do seu buraco nº 6, tendo
adquirido esse direito originariamente em relação ao buraco nº 6, na parte
coincidente com os lotes 19 e 20 do loteamento por usucapião” (“sic”).
17.
Notoriamente, é diferente peticionar o reconhecimento do direito de propriedade
(e demais pedidos da autora) sobre os prédios urbanos correspondentes aos
referidos lotes n.ºs 19 e 20 conforme identificados na petição inicial,
juridicamente identificados e identificáveis, com a configuração, área e
finalidades a que se destinam
18.
e peticionar o reconhecimento do alegado direito de propriedade sobre “a
totalidade do campo de golfe”, que é um prédio urbano distinto, “incluindo o
buraco nº 6”.
19.
Não só porque se trata, como descrito e melhor se evidenciará, de realidades
juridicamente distintas e autónomas, mas também porque a menção ao referido
“buraco n.º 6” parte de uma alegação exclusiva da ré-reconvinte quanto a uma
alegada sobreposição de tal buraco à área dos prédios da autora, alegação que
não se encontra fundamentada, demonstrada ou comprovada, que não se verifica, e
que, por conseguinte a autora não aceita.»
(…)
21.
Em conformidade, é imperativo concluir que, pelo modo como está configurado, o
referido pedido reconvencional relativo à aquisição por usucapião é totalmente
inadmissível por não se enquadrar em qualquer das possibilidades previstas no
artigo 266.º, n.º 2, do CPC, em concreto, não se podendo considerar ser o
efeito pretendido pela ré-reconvinte o mesmo que é visado pela autora.»
Ao que a recorrida Sociedade 2, S.A. respondeu
nos seguintes termos:
«VI. Quanto à inadmissibilidade do pedido de
aquisição por usucapião:
30.º
Relativamente
ao enquadramento legal para a admissibilidade do pedido, torna-se evidente o
seu enquadramento na alínea d) do n.º 2 do artigo 266º do CPC.
31.º
Alega
a A. que os lotes e o campo de golfe são realidades jurídicas distintas, mas
seguramente não pode deixar de reconhecer que se trata da mesma realidade
fáctica material (sob pena do presente processo não ter sentido útil).
32.º
Ora
o direito de propriedade exerce-se sobre uma coisa, in casu, sobre uma parcela
do território, seja ela qualificada como lote ou campo de golfe, do que
tratamos é de um perímetro de território com uma localização exata e uma área
concreta coincidentes.
33.º
Portanto,
o efeito jurídico pretendido é exatamente o mesmo, ou seja, o reconhecimento do
direito de propriedade sobre uma parcela concreta de território, por força do
exercício de posse pública e pacífica sobre ela exercida e correspondente ao
animus próprio do proprietário.
34.º
Obviamente
que para a R. tal área é o “buraco n.º 6” do campo de golfe, a A. (que não pode
ignorar que o é, porque também foi proprietária do campo com esse buraco nesse
sítio) pretende que são os lotes 19 e 20, mas do que cuidamos é de obter o
reconhecimento do direito de propriedade sobre essa parcela do território, em
última instância seja ela juridicamente qualificada como o for, logo um efeito
jurídico em tudo semelhante sobre a mesma realidade.
35.º
Sendo
que, como é evidente, uma realidade não pode existir sem a outra, porque um
campo de golfe não pode existir enquanto tal, sem, pelo menos 9 buracos e,
porque existindo o campo de golfe tal como é, os lotes para edificação não
podem ter existência fática simultânea, a R. e a A. pugnam pelo mesmo efeito
sobre a mesma coisa física, logo a situação é enquadrável nos fins da lei
processual, que só pode ser o de apresentar a mesma ação para clarificar a
situação da propriedade daquela parcela de território e não ignorar que existe
um problema quanto a essa propriedade.
36.º
Note-se
que a R. pede o reconhecimento do direito de propriedade sobre aquela parcela
do território, independentemente da sua classificação jurídica, porque o fim e
destinação que lhe deu, não viola qualquer lei (porque nada impede na lei que
um lote destinado a edificação possa ser relvado e usado para fim que nem exige
licenciamento autónomo, conforme reconhecido pelo próprio município e resulta
de documento ora junto pela A.) e porque prova que a sua posse sobre o bem
cumpre os requisitos da constituição do direito invocado como direito
originário, razão pela qual, o Tribunal não deverá deixar de conhecer tal
pedido e a A. não pode ser absolvida da instância quanto a este pedido
reconvencional.»
Tendo o tribunal a quo decidido nos seguintes termos:
«A
ré formulou um segundo pedido, o de ter adquirido o campo de golf, incluindo o
buraco n.º 6 e de assim ter agido, como respetiva proprietária.
A
autora defendeu a inadmissibilidade do pedido por não ter sido pedido o
reconhecimento de direito sobre os lotes n.º 19 e 20 (fórmula usada pela
autora), mas o campo de golf que corresponde a prédio distinto.
Tal
como o pedido, também a reconvenção é apreciada em função da alegação daquele
que a formula. Considerando que a ré/reconvinte alegou a sobreposição de tal
buraco à área dos prédios da autora, é de admitir este pedido reconvencional, o
que decido.»
Atenta esta sequência,
alguém poderá ficar com dúvidas de que estava em discussão a admissibilidade do
pedido reconvencional em causa ao abrigo do disposto na al. d) do n.º 2 do
artigo 266.º do CPC e de que o tribunal a
quo aplicou esta norma legal? Supomos que não. A recorrente não ficou,
seguramente, dado ter, em momento ulterior das suas alegações, desenvolvido a
argumentação que analisaremos em 2.3..
2.2. A recorrente sustenta
que, tendo o pedido reconvencional principal sido julgado inadmissível, o mesmo
devia ter acontecido ao pedido reconvencional subsidiário, por força do
disposto no n.º 1 do artigo 554.º do CPC. Argumenta nos seguintes termos:
«(…)
à luz do disposto no artigo 554.º, n.º 1 do CPC, tal pedido apenas poderia ser
tomado em consideração, ou seja, admitido para ulterior conhecimento, no caso
de não proceder o pedido reconvencional principal.
Sucede
que o pedido reconvencional principal não foi julgado procedente nem
improcedente; não foi proferida uma decisão de mérito sobre o mesmo – pois o
Tribunal a quo decidiu não o admitir, não chegando a ser apreciado.
Logo,
falha o pressuposto processual de admissibilidade do pedido reconvencional
subsidiário, pois o Tribunal recorrido não apreciou o pedido principal, nem
decidiu o mérito do mesmo, ou seja, não decidiu que o mesmo não procedia; logo,
não podia admitir, nem, logicamente, vir a conhecer, o pedido reconvencional
subsidiário, condicional à não procedência do pedido principal.»
Nada disto faz sentido.
O n.º 1 do artigo 554.º do
CPC estabelece que «Podem formular-se
pedidos subsidiários. Diz-se subsidiário o pedido que é apresentado ao tribunal
para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido
anterior.»
Para definir pedido subsidiário,
esta norma reporta-se ao momento do julgamento dos pedidos e não, como a
recorrente supõe, ao da sua admissão. Daí falar-se em «ser tomado em consideração» (não em «ser admitido») e em «não
procedência». Só no caso de o pedido anterior (que pode ser o pedido
principal ou outro pedido subsidiário) não proceder, o pedido subsidiário será
apreciado e julgado, o que, logicamente, pressupõe a sua admissão em momento
processual anterior. Se o pedido reconvencional subsidiário apenas pudesse ser «admitido para ulterior conhecimento, no
caso de não proceder o pedido reconvencional principal», só poderia sê-lo
após a prolação da sentença, pois, até lá, nada se decidiu sobre a procedência
ou improcedência do pedido reconvencional principal. O absurdo desta
consequência evidencia o erro em que assenta a tese da recorrente.
Por outro lado, ao contrário
do que a recorrente sugere, «não
proceder» não é, para este efeito, sinónimo de «improceder». Não procede, quer o pedido que não chega a ser apreciado,
quer o pedido que é apreciado e julgado improcedente. Mas só este último
improcede. Ou seja, «não proceder» é
um conceito mais amplo que o de «improceder».
O pedido reconvencional
principal não foi admitido, pelo que, não só não procedeu, como é certo que, ao
menos nesta acção, nunca virá a proceder. Consequentemente, ainda que fosse
possível abstrair do desfasamento cronológico acima referido, nunca a não
admissão do pedido reconvencional principal, que torna certa a impossibilidade
de procedência nesta acção, poderia obstar à admissibilidade do pedido
reconvencional subsidiário.
2.3. A recorrente sustenta
que o pedido reconvencional subsidiário de aquisição, por usucapião, do direito
de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe, incluindo o buraco n.º 6
com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade 2, S.A., não é
enquadrável na previsão da al. d) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC, porquanto
visa a produção de um efeito jurídico diverso daquele que ela própria se propõe
obter. A sua argumentação é, resumidamente, a seguinte:
- A recorrente reivindica dois prédios
urbanos, denominados «lote 19» e «lote 20»;
- O pedido reconvencional subsidiário
visa o reconhecimento da aquisição, por usucapião, do direito de propriedade,
não sobre os referidos prédios urbanos, mas sim sobre a totalidade do campo de
golfe, incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da
recorrida Sociedade 2, S.A.;
- Daí que o efeito jurídico pretendido
pela recorrida Sociedade 2, S.A. através da dedução do pedido reconvencional
subsidiário não seja o mesmo que a recorrente se propõe obter;
- Uma vez que peticionar o
reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios urbanos
correspondentes aos lotes n.ºs 19 e 20 é diferente de peticionar o
reconhecimento do direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe,
que corresponde a um prédio urbano distinto;
- Trata-se de realidades juridicamente
distintas e autónomas, e a menção ao «buraco
n.º 6» parte de uma alegação exclusiva da recorrida quanto a uma alegada
sobreposição de tal buraco à área dos prédios da recorrente, alegação que não
se encontra fundamentada, demonstrada ou comprovada, que não se verifica e não
se aceita;
- A fundamentação do despacho recorrido
é incorrecta, pois o autor é livre de definir e alegar as suas causas de pedir
e o seu pedido, mas o réu não goza de idêntica liberdade em sede de pedido
reconvencional, pois decorre do n.º 2 do artigo 266.º do CPC que a
admissibilidade do pedido reconvencional é excepcional e apenas admitida nos
casos aí expressa e taxativamente consignados;
- Para poder deduzir pedido
reconvencional ao abrigo do disposto na al. d) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC,
a recorrida Sociedade 2, S.A. teria de o dirigir aos prédios tal como a
recorrente os identificou.
Esta argumentação não
procede.
O terreno em disputa é o
mesmo. A recorrente sustenta que esse terreno corresponde a dois prédios
urbanos, denominados «lote 19» e «lote 20». A recorrida Sociedade 2, S.A.
sustenta que o mesmo terreno é parte do campo de golfe de que se diz
proprietária. Daí que seja fora de dúvida que o efeito que a recorrente e a
recorrida Sociedade 2, S.A. pretendem é exactamente o mesmo: serem declaradas
proprietárias do terreno em causa; a recorrente pretende que o terreno lhe seja
entregue e a recorrida Sociedade 2, S.A. pretende que o terreno seja mantido em
seu poder.
Não faria sentido a
recorrida Sociedade 2, S.A. reportar o pedido reconvencional subsidiário aos
lotes 19 e 20, pois ela nega a sua existência. Esta recorrida identifica o
terreno em conformidade com a tese que defende no processo, à semelhança da
recorrente. Se a recorrida Sociedade 2, S.A. caísse no erro de denominar o
terreno como «lote 19» e «lote 20», como a recorrente pretende, abriria,
inclusivamente, a porta a que alguém viesse sustentar que ela confessara a
existência dos lotes. A lógica da posição assumida pela recorrida Sociedade 2,
S.A. pressupõe, precisamente, a negação da existência dos lotes e a identificação
do terreno em disputa como parte do campo de golfe de que é proprietária.
Ao criticar o despacho
recorrido com o argumento de que «o autor
é livre de definir e alegar as suas causas de pedir e o seu pedido, mas o réu
não goza de idêntica liberdade em sede de pedido reconvencional, pois decorre
do n.º 2 do artigo 266.º do CPC que a admissibilidade do pedido reconvencional
é excepcional e apenas admitida nos casos aí expressa e taxativamente
consignados», a recorrente, tal como fez para sustentar a tese que
refutámos em 2.2, confunde realidades distintas. É verdade que o n.º 2 do
artigo 266.º do CPC exige a verificação de um factor de conexão entre a acção e
a reconvenção. Porém, isso não prejudica que, como o tribunal a quo acertadamente observou, a
reconvenção, à semelhança da acção, seja «apreciada
em função da alegação daquele que a formula».
Nem poderia ser de outra
forma. Nomeadamente, seria absurdo exigir que o réu, como condição da
admissibilidade do pedido reconvencional à luz do n.º 2 do artigo 266.º do CPC,
demonstrasse a sua procedência. Não obstante, parece ser isso que a recorrente
pretende quando afirma que «(…) a menção
ao buraco n.º 6 parte de uma alegação exclusiva da recorrida quanto a uma
alegada sobreposição de tal buraco à área dos prédios da recorrente, alegação
que não se encontra fundamentada, demonstrada ou comprovada, que não se
verifica e não se aceita» (conclusão TT).
2.4. Concluindo, nada obsta
à admissibilidade do pedido reconvencional subsidiário de aquisição, por
usucapião, do direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe,
incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade
2, S.A., pelo que, nesta parte, o despacho recorrido deverá ser confirmado.
*
Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto,
julgar o recurso parcialmente procedente, nos seguintes termos:
a) Revoga-se o despacho recorrido na
parte em que absolveu a recorrida Sociedade 2, S.A. da instância relativamente
ao pedido de condenação desta a pagar, à recorrente, «uma indemnização correspondente ao benefício por ela obtido no período
em que ocupou os prédios sem qualquer título e até à entrega efectiva dos
mesmos, bem como por todos os danos e prejuízos que a autora está a sofrer pela
privação do uso, em montante a liquidar em execução de sentença»;
b) Admite-se o pedido referido em a);
c) Confirma-se o despacho recorrido na
parte em que admitiu o pedido reconvencional subsidiário de aquisição, por
usucapião, do direito de propriedade sobre a totalidade do campo de golfe,
incluindo o buraco n.º 6 com a sua actual configuração, por parte da recorrida Sociedade
2, S.A..
Custas a cargo da recorrente
e das recorridas, na proporção do seu decaimento, que se fixa em 50% para a
primeira e 50% para as segundas.
Notifique.
*
Évora, 12.09.2024
Vítor
Sequinho dos Santos (relator)
(1.º
adjunto)
(2.ª
adjunta)