sábado, 22 de junho de 2024

Despacho de 19.06.2024


Admissibilidade do recurso.

Valor da causa.

Valor da sucumbência.

Legitimidade para recorrer.

Efeito do recurso.

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O autor suscita a questão da admissibilidade do recurso interposto pelos réus.

Sustenta, em síntese, o seguinte:

- No despacho saneador, foi atribuído, à causa, o valor de € 16.700, tendo-se as partes conformado com tal decisão;

- O valor de € 16.700 corresponde ao da indemnização pedida pelo autor;

- Os réus foram absolvidos da totalidade do pedido de condenação no pagamento da referida indemnização, pelo que o valor da sua sucumbência é zero;

- Logo, os réus não decaíram na acção;

- A sentença recorrida não foi desfavorável aos réus em valor superior a metade da alçada do tribunal;

- Consequentemente, o recurso interposto pelos réus não é admissível.

Esta argumentação é manifestamente falaciosa. A mera ponderação do resultado a que conduz impõe o seu afastamento. Segundo o autor, os réus, não obstante terem sido condenados a restituírem-lhe a fracção reivindicada, não são parte vencida. Isto é, obviamente, absurdo.

Note-se, em primeiro lugar, que o autor não levou o seu raciocínio até ao fim. Se se concluísse que os réus não decaíram na acção, a causa da inadmissibilidade do recurso por eles interposto seria a sua ilegitimidade, nos termos do n.º 1 do artigo 631.º do CPC, e não, meramente, o insuficiente valor da sua sucumbência, nos termos do n.º 1 do artigo 629.º do CPC. Contudo, é evidente que, tendo sido condenados a restituírem o imóvel ao autor, os réus são parte vencida, pelo que têm legitimidade para a interposição do recurso. Tal como o autor teria, na hipótese de os réus terem sido absolvidos do pedido de restituição do imóvel.

O que, na realidade, ocorre nos presentes autos, é que o valor da causa foi mal fixado. Na sequência da sua errada indicação pelo autor, com a qual os réus se conformaram, o tribunal a quo fixou o valor da causa em € 16.700, coincidente com o do pedido indemnizatório. O valor da fracção reivindicada não foi tido em conta na fixação do valor da causa. Foi, assim, violado o disposto nos artigos 296.º, n.º 1, 297.º, n.º 2, 1.ª parte, e 302.º, n.º 1, do CPC.

A decisão que fixou o valor da causa transitou em julgado, pelo que é, neste momento, inatacável. A circunstância de o valor da fracção reivindicada não ter sido levada em conta na fixação do valor da causa não tem a absurda consequência que o autor dela pretende retirar, mas sim a de, sendo embora certo que os réus ficaram vencidos relativamente ao pedido de restituição da fracção, ser incerto o valor da sua sucumbência.

Sendo assim, é aplicável o disposto na parte final do n.º 1 do artigo 629.º do CPC: atenta a fundada dúvida sobre o valor da sucumbência dos réus, a decisão sobre a admissibilidade do recurso por estes interposto deverá atender, exclusivamente, ao valor da causa. Sendo este de € 16.700, superior à alçada do tribunal a quo, aquele recurso é admissível.

Ainda que assim se não entendesse, o recurso sempre seria admissível ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 3 do artigo 629.º do CPC, pois, nesta acção, aprecia-se a subsistência de um contrato de arrendamento não excluído por aquela norma, invocado pelos réus com vista a obstar à procedência do pedido de entrega da fracção.

Julgo, assim, admissível o recurso interposto pelos réus.

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O autor sustenta que, a ser admitido o recurso interposto pelos réus, deverá ser-lhe atribuído efeito meramente devolutivo.

Sem razão. Tal como o tribunal a quo decidiu, aquele recurso tem efeito suspensivo, atento o disposto no artigo 647.º, n.º 3, al. b), com referência ao artigo 629.º, n.º 3, al. a), ambos do CPC.

Mantenho, pois, o efeito suspensivo ao recurso interposto pelos réus.

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Recebo o recurso interposto pelo autor, com efeito meramente devolutivo.

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Inscreva-se em tabela, para a sessão de 11.07.2024.

Aos vistos.

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19.06.2024

Vítor Sequinho dos Santos


Acórdão da Relação de Évora de 12.09.2024

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